Título: Privilégio às PPPs divide governistas
Autor: Mônica Izaguirre
Fonte: Valor Econômico, 20/10/2004, Política, p. A-7

A retomada das discussões do projeto das parcerias público-privadas no Senado Federal, ontem, mostrou que nem o próprio governo se entende sobre um dos mais polêmicos pontos que envolve o assunto. Poucos minutos após ser defendida pelo chefe da assessoria econômica do Ministério do Planejamento, Demian Fiocca, a precedência das PPPs sobre outras obras nos pagamentos feitos pelo setor público foi atacada pelo líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP). O debate ocorreu ontem durante audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Além de Fiocca, também foi convidado a depor o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Paulo Safady. Colocada pelo governo no projeto original e derrubada pela Câmara, a questão vem sendo motivo de angústia do setor da construção. Se as PPPs tiverem preferência e forem preservadas na hora de um corte de verbas orçamentárias, as demais obras públicas tendem a ficar mais caras, argumentou Safady. Isso porque, explicou, para qualquer projeto fora de PPP, os empreiteiros terão que embutir no preço um risco adicional de atraso nos pagamentos. "Eu também sou contra a precedência. O que vai garantir o pagamento, sob o ponto de vista do investidor privado, é um fundo garantidor", disse o senador Mercadante. Ele referia-se à idéia do relator, senador Valdir Raupp (PMDB-RO), de incluir no texto a criação de um fundo específico para as PPPs. Formado a partir de ativos como títulos públicos e ações de empresas estatais, esse mecanismo seria acionado sempre que um ministério deixasse de honrar pagamentos a um parceiro privado. Na avaliação do Ministério do Planejamento, as PPPs merecem um tratamento diferente porque a situação de um empreendedor nessa modalidade "é desigual". Os empreiteiros em geral recebem na medida em que concluem etapas de uma obra. Assim, na hipótese de um contigenciamento de verbas, eles podem interrompê-la. Já nos contratos de PPP, o empreendedor só começará a receber depois de alguns anos da obra pronta e num prazo longo, uma vez que os contratos poderão ter até 35 anos e envolverão necessariamente a prestação de serviço, destacou Fiocca. O governo acha que a precedência é importante para dar segurança a potenciais investidores privados e, assim, atraí-los para empreendimentos de interesse público. Fiocca entende que um fundo garantidor é bom, mas argumenta que isso não resolve o problema da insegurança. Na sua avaliação, se não houver precedência, sabendo que o fundo será obrigado a honrar, futuros governantes poderão se sentir tentados a suspender pagamentos de obrigações de PPP pelos ministérios, só para poder usar o dinheiro do orçamento em obras novas. A tendência do relator, porém, é de não incluir a precedência no seu novo substitutivo ao projeto que veio da Câmara. A participação do BNDES como financiador também foi alvo de muito debate. Senadores do PSDB alertaram para o risco de "dirigismo" estatal nas licitações de PPPs, já que o apoio financeiro do BNDES a um consórcio privado pode definir a escolha do vencedor. Fiocca acha que esse problema não existirá se o BNDES oferecer crédito ao empreendimento só depois de definida a licitação. Ele esclareceu ao Valor, porém, que essa é uma idéia sua e que não existe qualquer proposta ou posição do governo no sentido de restringir o BNDES. O PSDB vê risco de "dirigismo" também com a participação de fundos patrocinados por estatais.