Título: Governo prepara pacote com investimentos
Autor: Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 08/06/2005, Política, p. A7

Crise Superávit baixará à meta de 4,25% para permitir a reaglutinação da base política do presidente Lula

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu recorrer a um pacote de medidas para tentar se recompor no Congresso, sair da defensiva política e manter viva as chances de reeleição em 2002. Entre as medidas acertadas por Lula estão a retomada do investimento público, a auditoria de contratos dos Correios e do IRB - Resseguros Brasil S.A, estatais cuja intervenção foi determinada ontem, e a repactuação de espaços entre os partidos que integram a coalizão governista. O PT e os ministros do partido mais próximo ao presidente insistiram, nas conversas com Lula, numa reforma ministerial ampla, pretexto para tirar do governo os ministros Romero Jucá (Previdência Social) e Henrique Meirelles (Banco Central). A mudança serviria também para remover do cargo o ministro Aldo Rebelo (Coordenação Política), que deixou a sigla furiosa ao dizer que a denúncia do pagamento de "mesadas" a deputados era dos partidos e não do governo. Lula deu a entender ao partido e aos ministros que deve mexer no ministério, mas não se comprometeu com a proposta. O presidente deve manter PTB, PL e provavelmente incorporar o PP ao governo. Mas não há data definida para a reforma: a idéia no Palácio do Planalto é não gastar todos os cartuchos do governo de uma só vez - eles podem vir a ser necessários mais adiante, de acordo com os desdobramentos da crise e o andamento da CPI dos Correios no Congresso. Os últimos laços do pacote econômico devem ser dados hoje pelos ministros Antonio Palocci (Fazenda) e ministro Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento). Basicamente, devem ser implementadas as medidas anunciadas há duas semanas por Furlan, após reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, como o PC Conectado e a "MP do Bem", mas a Fazenda estuda também outras medidas, como novos estímulos a microempresas. O pacote deveria ter sido anunciado ontem, mas ainda havia divergências: a Receita, por exemplo, quer limitar a R$ 2 bilhões a renúncia fiscal, mas o Desenvolvimento estima que, para tocar os projetos previstos, será necessário mais que essa quantia. Os técnicos voltam a se reunir no dia de hoje - a divulgação do pacote deve ser amanhã. Na área de investimentos, na prática, o que o governo pretende fazer é levar a execução orçamentária para o patamar de superávit de 4,25% do PIB (Produto Interno Bruto) previsto para 2005. O arrocho nos quatro primeiros meses do ano permitiu ao Tesouro um superávit bem superior, de 7,26 do PIB. O projeto do governo é fazer "investimentos emblemáticos" e permitir a Lula rearticular pelo menos uma parte dos setores de esquerda que dele se afastaram. Um dado que incomoda o presidente é o desempenho da senadora Heloísa Helena (P-Sol-AL) nas pesquisas, entre 3% e 5%. Parece pouco, mas é um percentual que pode ser determinante entre haver ou não o segundo turno numa eleição presidencial que se prenuncia acirrada em 2006. Preocupado com as repercussões da crise política, Lula telefonou na noite de segunda-feira para o presidente do Senado, Renan Calheiros, e o convidou, juntamente com o senador José Sarney, para uma conversa ontem de manhã. O encontro foi realizado no Palácio do Planalto. O presidente disse aos dois que pretendia fazer mudanças no governo. De início, afastaria dos cargos os dirigentes dos Correios e do IRB. Pediu o aval do partido. Num momento de extrema fragilidade, o PMDB foi obrigado a dar sinal verde. "Disse ao presidente que ele deveria fazer o que fosse absolutamente necessário para preservar a sua biografia", conta Calheiros. Segundo o presidente do Senado, Lula manifestou que agiria para proteger as instituições. Questionado sobre a mudança no primeiro escalão, Renan Calheiros foi evasivo: "Qualquer coisa nessa direção pode ajudar, claro. Mas primeiro precisamos esclarecer todas as denúncias. A prioridade tem que ser a investigação", disse ele. De olho em eventuais espaços deixados pelo PTB, senadores do PMDB voltaram a cobrar de Lula a reforma ministerial. Mas a bancada não quer nem ouvir falar na demissão de Romero Jucá. O Executivo pode fazer tudo o que quiser, mas nada vai substituir a investigação das denúncias, porque a sociedade está cobrando", alertou novamente Renan Calheiros. O ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, alegou ontem que a decisão do presidente Lula de afastar os dirigentes do IRB e dos Correios foi tomada em função do resultado de investigações em curso pela Polícia Federal, Ministério Público e por sindicâncias internas. "O governo sempre procura agir com rigor, mas com prudência e senso de Justiça. Essa decisão do presidente foi tomada com base em investigações da Polícia Federal e de sindicâncias das empresas envolvidas", afirmou. Rebelo disse, em seguida, que não necessariamente o afastamento está ligado "à comprovação das denúncias". Ele acrescentou que não se trata de uma punição aos servidores, mas sim de uma medida administrativa, por decisão de Lula e dos ministros. Um auxiliar do presidente, no entanto, definiu sem meias palavras a decisão tomada ontem: "Quando a composição política entra em colapso, o governo tem que fazer mudanças. As demissões ocorrem por uma questão política, e não administrativa".(Colaborou Maria Lúcia Delgado)