Título: Companhias aproveitam baixa do mercado e recompram ações
Autor: Carolina Mandl e Vanessa Adachi
Fonte: Valor Econômico, 08/06/2005, Empresas &, p. B1

Capital aberto Instrumento gera valor para o acionista porque sinaliza confiança no negócio

A queda da bolsa de valores nos últimos três meses tem reduzido o interesse de investidores pelas ofertas públicas de ações. Na segunda-feira, a Randon foi levada a cancelar a sua operação por esse motivo. A baixa de 15% do Ibovespa desde março também tem levado dirigentes de outras companhias brasileiras a anunciar a recompra de suas ações. Integram essa segunda lista nomes como Gerdau, Marcopolo, São Paulo Alpargatas, Companhia Siderúrgica Nacional, Aracruz e VCP. A lógica mais imediata por trás desse movimento é aproveitar a sobra de caixa para adquirir seus próprios papéis em um momento em que estão mais baratos. Mas não é só. "A recompra de ações é um instrumento importante para que as empresas sinalizem ao mercado que acreditam que seu negócio vale mais do que aquilo", afirma Rodolfo Riechert, executivo responsável pela área de mercado de capitais do Banco Pactual. Afinal, ninguém melhor do que a própria empresa e seus executivos para conhecer o seu potencial. A fabricante de carrocerias Marcopolo está com um programa na praça para recomprar até 5% das suas ações em circulação. O lucro da empresa caiu de R$ 17,5 milhões para R$ 10,1 milhões no primeiro trimestre por causa da perda de margem nas exportações. "Neste momento, a empresa, que é exportadora, está sofrendo pela valorização do real. Mas acreditamos que essa não é uma condição de longo prazo", afirma Carlos Zignani, diretor de relações com investidores da Marcopolo. As companhias costumam dar dois destinos aos papéis recomprados: usá-los para o programa de bônus de seus executivos ou cancelá-los. A recompra dos papéis em si já costuma gerar valor para os acionistas porque ajuda a sustentar as cotações. Mas o posterior cancelamento dos papéis que foram para a tesouraria amplia esse efeito. Isso porque reduz a base acionária da empresa, tornando cada papel restante mais valioso. A distribuição de lucro por ação também cresce. Gustavo Harckbart, gestor de fundos da Fides Asset Management, avalia que as empresas devem olhar a recompra de ações como uma alternativa ao investimento na produção. "As companhias têm que gerar valor para o acionista, portanto, têm que considerar o que dará maior retorno em cada cenário." Nesse sentido, em recente teleconferência com analistas, a Coteminas informou que pensa em recomprar seus papéis. Josué Gomes da Silva, presidente da empresa, afirmou que a fabricante está com o caixa elevado, mas não pretende ampliar a produção porque o câmbio não favorece a exportação. Para os especialistas, as empresas brasileiras ainda subutilizam esse importante instrumento de relacionamento com seus acionistas. "Com o atual nível de preço dos papéis, deveríamos estar vendo mais operações por parte de companhias com margens elevadas e dinheiro em caixa", diz Riechert. Ele lembra que, em 2001, a atitude das companhias americanas de comprar seus papéis evitou um desastre de grandes proporções no mercado acionário após os ataques terroristas. Para Harckbart, um dos fatores que limita essa política no país é o baixo percentual do capital das empresas que está em circulação no mercado. O Banco Itaú transformou-se em um modelo do mercado brasileiro quando o tema é política de recompra de ações. Há 20 anos o segundo maior banco privado nacional mantém um programa aberto e ativo. "Nesse período, cancelamos o equivalente a 25% do capital do banco", diz Geraldo Soares, superintendente de relações com investidores do Itaú. Soares diz que os grandes investidores institucionais "adoram" a recompra seguida de cancelamento dos papéis. "Isso aumenta o valor do papel e também o lucro por ação", lembra. Por outro lado, o banco busca um equilíbrio em relação aos interesses dos pequenos investidores, que preferem a distribuição de dividendos. "Tentamos equalizar as duas coisas, porque uma companhia aberta tem que pensar nos dois públicos", diz Soares. Apesar da constante recompra, o percentual do capital do Itaú em circulação mantém-se em torno de 50% e a sua liquidez só faz aumentar. No ano passado o banco foi além e tornou-se a primeira companhia aberta do país a ter um manual, que é divulgado ao mercado, com as regras para que a sua tesouraria negocie os próprios papéis. Por exemplo, o banco jamais pode negociar nos primeiros 30 minutos e nos últimos dez de cada pregão. "É para deixar claro que não estamos manipulando os preços."