Título: Congresso adia questão sucessória
Autor: Leila Coimbra
Fonte: Valor Econômico, 10/06/2005, Especial, p. A14

O presidente do Senado boliviano, Hormando Vaca Díez, afirmou na noite de ontem que irá recusar a Presidência do país caso o Congresso aceite a renúncia de Carlos Mesa. "Se a renúncia foi aceita, negarei o cargo", disse ele, segundo a agência de notícias "Reuters". Por motivos de segurança, o Congresso teve de suspender ontem a sessão que trataria sobre a renúncia. Vaca Díez, é visto por muitos bolivianos como representante de uma classe política tradicional que fracassou na condução do país. Seu partido, o MIR (Movimento da Esquerda Revolucionária) tem, junto com o MNR (Movimento Nacionalista Revolucionário), o bloco de maioria no Congresso de 157 cadeiras. O líder do maior partido de oposição, Evo Morales, disse que lideraria uma campanha de desobediência civil caso Vaca Díez fosse confirmado na Presidência. Uma solução discutida entre os políticos seria a renúncia dos presidentes do Senado e da Câmara em assumir a Presidência da República, que seria ocupada pelo presidente da Suprema Corte. Ele então convocaria eleições. A declaração seguiu mais um dia de violência, obrigando o Congresso a suspender a sessão sobre o futuro político de Mesa. A suspensão se deu por causa dos enfentamentos entre manifestantes e policiais em Sucre, onde se reunia o Legislativo. Um mineiro morreu e três teriam ficado feridos. O mineiro morto seria a primeira vítima fatal da atual jornada de protestos que se iniciaram a quase quatro semanas. Em outubro de 2003, a repressão violenta a protestos semelhantes terminou com a morte de mais de 50 manifestantes e com a renúncia do presidente Gonzalo Sánchez de Lozada. O ministro de Assuntos Indígenas disse que a morte foi um caso fortuito e que "o governo não deu ordens para atirar contra os manifestantes". Os líderes dos movimentos indígenas, que pedem a reestatização da indústria do gás e petróleo, disseram que se Vaca Diéz, próximo na linha de sucessão, assumir a Presidência, eles começariam uma campanha de desobediência civil. Antes da reunião do Congresso, que transferiu suas sessões para Sucre (capital constitucional do país) por causa da insegurança em La Paz, estudantes e camponeses enfrentaram as forças policiais. Muito gás lacrimogêneo foi lançado por parte da polícia. Os comandantes militares disseram que dariam apoio a qualquer decisão do Congresso, caso ela estivesse de acordo com as leis: "Vamos respeitar a decisão do Congresso, mas só se não houver quebras constitucionais nem ameaças à democracia. As Forças Armadas continuarão como supervisoras desse processo", disse comandante-em-chefe das Forças Armadas, almirante Luis Aranda. "Estamos em alerta máximo." A Defensoria Pública, pressentindo que a declaração castrense poderia ser uma ameaça de intervenção, disse que não aceitaria violações aos direitos humanos, qualquer fosse a decisão do Congresso. Os protestos e bloqueios exigindo a reestatização, assim como a convocação de uma Assembléia Constituinte e de eleições presidenciais, já estão causando o desabastecimento de combustível e gêneros alimentícios em La Paz e outras cidades. Ao menos sete campos de produção de gás e petróleo estão ocupados por manifestantes. As ações da Repsol, uma das mais afetadas pela paralisações de produção, caíram 0,6% ontem.