Título: Governo usa PMDB para blindar CPI
Autor: Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 14/06/2005, Política, p. A6

A nova investida do Palácio do Planalto sobre o PMDB padece do mesmo vício de origem que o levou a cultivar relações perigosas com partidos como o PTB e o PL. O que está em jogo não é um governo de coalizão, mas pura e simplesmente a blindagem do governo na CPI dos Correios. A maioria palaciana na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito é nominal, ilusória. Na ponta do lápis, o PMDB é que ditará os rumos da investigação. Dos 32 integrantes da CPI, o governo supostamente conta com 19 aliados. Maioria folgada, se sete deles não fossem pemedebistas. O comportamento sinuoso adotado pelas bancadas do PMDB nas votações do Congresso recomenda um pouco mais de cautela ao governo na hora de considerar favas contadas os votos da sigla - são sujeitos ao humor de ocasião. Oficialmente, o PMDB apóia uma investigação ampla, não só nos Correios, como também no Instituto de Resseguros do Brasil e o pagamento de mensalão a congressistas, segundo nota assinada semana passada por representantes de suas principais correntes. "O PMDB não vai blindar o governo na CPI", jura o presidente da sigla, Michel Temer (SP). Para Temer, "o PMDB entrar no governo agora não tem cabimento". Houve outras oportunidades mais bem delineadas. A primeira delas, antes da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, talvez na primeira grande operação política com a marca atabalhoada do PT. Em dezembro de 2002, José Dirceu se reuniu com Temer, pediu nomes para os ministérios das Minas e Energia e da Integração Nacional, saiu com as indicações de três senadores e três deputados, e à noite avisou que Lula havia recuado da decisão. O Planalto preferiu apostar na divisão. O PMDB iria enfim ocupar ministérios no início de 2003, com as nomeações de Eunício Oliveira para as Comunicações e de Amir Lando para a Previdência. "Em dezembro de 2002 era coalizão, em fevereiro de 2003 o que houve foi adesão", diz Temer. Aumentaram as escaramuças internas do partido, a ala oposicionista se articulou e conseguiu impor uma derrota à ala governista em dezembro passado, quando convenção decidiu por recomendar a devolução dos cargos e a candidatura própria a presidente.

Partido é o fiel da balança da investigação

Os governistas, tendo à frente o presidente do Senado, Renan Calheiros, se sentiram abandonados pelo governo, que não lhes deu munição (cargos, emendas) para o embate interno. O governo passa a perder votações importantes no Senado, no melhor estilo peemedebista de impor pequenas derrotas e enviar o recado de sua insatisfação ao Planalto. Entre março e abril, Lula tenta refazer a relação, desta vez conversando com todas as alas pemedebistas. A discussão era a mesma de agora - entronizar o PMDB no governo. Deu em nada, como das vezes anteriores. Entre os problemas detectado por Temer, que à época conversou longamente com o presidente Lula, está a "falta de desdobramentos" - o presidente chama, conversa, diz que quer, mas depois não dá conseqüência às negociações, que se desmancham sozinhas no ar. O PMDB sempre reclamou de uma participação no governo proporcional a seu tamanho - 23 senadores e 84 deputados. É com isso que o Planalto acena no momento em que disputa palmo a palmo o controle da CPI dos Correios. "É ruim até para o governo. Parece um ajuste. É preciso passar essa fase para se fazer uma nova análise", argumenta Michel Temer. A tentativa de blindagem tem sido repudiada até mesmo pelos setores governistas do PMDB - passa a idéia de um grande "acordão" para varrer a sujeira para debaixo do tapete, num momento em que a classe política está com viés de baixa e que deputados e senadores temem pela manutenção dos próprios mandatos nas eleições do próximo ano. Na contramão do Planalto, que articula um comando "chapa branca" para a CPI, Renan Calheiros defende um acordo governo-oposição. O problema é que essa nova tentativa de atração do PMDB parece ter o padrão das cooptações que o governo fez antes para ter maioria no Congresso. O PTB do deputado Roberto Jefferson (RJ), por exemplo, elegeu 26 deputados e agora tem 47, uma bancada engordada por posições em um ministério e estatais como os Correios, o IRB e a Eletronorte. O PL também elegeu 26, hoje está com 54 deputados sob a suspeita de receberem mensalidade em troca de votos.