Título: Presidente monta tropa de choque para enfrentar a CPI dos Correios
Autor: Cristiano Romero e Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 14/06/2005, Política, p. A6

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva definiu ontem, durante reunião com ministros do núcleo decisório e os líderes governistas no Senado e na Câmara dos Deputados, a ofensiva do governo na CPI dos Correios, que começa a funcionar hoje. Lula designou três ministros para integrar a tropa de choque do governo para enfrentar a CPI - Aldo Rebelo (Coordenação Política), José Dirceu (Casa Civil) e Eduardo Campos (Ciência e Tecnologia). Eles vão acompanhar o dia-a-dia da CPI e atuarão como porta-vozes do governo. Além disso, o presidente acertou com o ministro José Dirceu a sua permanência no governo. Decidiu ainda retirar da pauta do Congresso as medidas provisórias que não são consideradas urgentes e, assim, desobstruir as votações, evitando que o foco dos parlamentares, a partir de hoje, seja apenas a CPI. O chefe da Casa Civil, que planejava se demitir e chegou a debater o assunto com o presidente na noite de domingo, decidiu ficar no cargo. Naquele dia, o ministro estava resoluto a sair do governo para voltar à Câmara dos Deputados e, assim, defender a si próprio e ao PT das denúncias feitas pelo presidente do PTB, deputado Roberto Jefferson (RJ). Ontem, Dirceu comunicou a Lula a decisão de ficar no ministério. Acabou prevalecendo a avaliação de que o afastamento do ministro daria argumentos à oposição e fortaleceria a acusação de Roberto Jefferson, segundo a qual, Dirceu avalizava o suposto pagamento de mesadas a deputados do PL e PP em troca de votos no Congresso. Por meio de sua assessoria de imprensa, Dirceu afirmou no início da noite de ontem que não faz nada sem o consentimento de Lula. Ele avisou que vai defender o governo e o PT. "Minha relação com o presidente é excelente. Não faço nada que não seja de comum acordo e determinado por ele. Meu trabalho é para que o governo governe. Estou absolutamente seguro e tranqüilo. A Polícia Federal e a Controladoria estão investigando, além da CPI no Congresso. É importante que se façam com transparência as investigações. Vamos defender o governo e o PT", declarou o ministro. Embora a saída de Dirceu não tenha sido debatida na reunião de coordenação realizada ontem, alguns ministros vinham defendendo seu afastamento em discussões internas. A situação criou um mal-estar no Palácio do Planalto, a ponto de o ministro da Comunicação do Governo, Luiz Gushiken, divulgar nota oficial, no início da noite, desmentindo que apoiasse essa idéia. "Esse assunto não foi discutido nas reuniões das quais participei ontem (domingo). Além disso, reafirmo o que já disse em outras ocasiões: nomear e demitir ministros é uma decisão exclusiva do presidente da República. Não cabe a nós, ministros, qualquer manifestação a esse respeito", declarou Gushiken, um desafeto de Dirceu desde o início do ano passado, quando, em meio ao Caso Waldomiro, defendeu aproximação de Lula com o PSDB. Em Buenos Aires, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, defendeu a permanência de Dirceu e disse duvidar que ele venha a abandonar o cargo em função das denúncias. "Seria uma perda para o nosso governo se ele tomasse essa decisão", afirmou Palocci, que esteve na capital da Argentina, participando de encontros com o presidente Néstor Kirchner e o ministro da Economia, Roberto Lavagna. Segundo dois assessores do presidente, José Dirceu permanecerá no governo, "pelo menos, momentaneamente". Embora tenha decidido ficar, ele continua se queixando do que chama de interdição do debate em relação à política econômica, da diminuição de sua importância, imposta por Lula, na área política e da lentidão do governo na liberação de recursos para investimentos em obras de infra-estrutura. A tropa de choque escolhida por Lula para atuar na linha de frente da CPI vai cobrir todos os partidos da base aliada. Principal coordenador do trio, Aldo Rebelo cuidará do PMDB e de seu partido, o PCdoB. José Dirceu vai lidar essencialmente com o PT, que, após as denúncias de Jefferson, acentuou suas cisões internas. Com trânsito em várias bancadas, Eduardo Campos cuidará de seu partido, o PSB, e das outras siglas da base de apoio, além de dialogar com os setores do PMDB que não apóiam oficialmente o governo. Na reunião de coordenação política, o presidente Lula decidiu que, além dos três ministros que vão compor a tropa de choque do governo na CPI, outros cinco ministros - Eunício Oliveira (Comunicações), Paulo Bernardo (Planejamento), Ciro Gomes (Integração Nacional), Walfrido Mares Guia (Turismo) e Alfredo Nascimento (Transportes) - também serão acionados, durante as investigações da CPI, a ajudar a compor maioria dos partidos aliados. Na estratégia traçada pelos coordenadores políticos do governo para lidar com a crise, o ponto central é não permitir, na CPI dos Correios, que Jefferson saia da condição de réu. Os ministros também discutiram a acusação, publicada pelo "Jornal do Brasil" de que a Transposição do Rio São Francisco estivesse sob suspeita de licitação fraudada. A acusação foi negada ontem em nota oficial do Ministério da Integração Nacional. Na nota, a assessoria de comunicação do ministério diz que o ministro Ciro Gomes nunca foi procurado pelo deputado Roberto Jefferson para que intercedesse em processos licitatórios da pasta. Segundo a nota, a entrega das propostas das empresas interessadas está marcada para 14 de julho e, até agora, 111 empresas teriam adquirido o Edital. Os ministros também se reuniram com o presidente Lula para definir a estratégia de atuação nesta terça-feira, dia do depoimento de Roberto Jefferson à CPI. O presidente encontrou-se também com os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE). Com o início da CPI, o presidente pretende esperar por seus desdobramentos antes de fazer mudanças no ministério. Ontem, na reunião de coordenação, Lula avisou que não vai discutir a reforma ministerial em reuniões ampliadas. "Ele disse que não estava aberto para tratar desta pauta na reunião e avisou que, quando quiser mudanças, conversará isoladamente", contou um participante da reunião no Palácio do Planalto. Lula disse aos ministros e aos líderes de governo que considera essencial a implantação da CPI para apurar as denúncias e reforçou a necessidade de aproximação com o PMDB, defendida com ênfase pelo ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo. "Essa aliança é fundamental e estratégica", reforçou um governista. Participaram da reunião de coordenação, no Palácio Planalto, além de Lula, o vice-presidente José Alencar, os ministros José Dirceu, Jaques Wagner (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social) e Luiz Dulci (Secretaria-Geral da Presidência), e os líderes do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), e no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP). Perguntado, ontem, por jornalistas, se estava tranqüilo com a situação política do país, o presidente respondeu: "Estou mais do que tranqüilo, ainda mais que o meu Corinthians ganhou do Flamengo de quatro a dois." (Colaboraram Taciana Collet, de Brasília, e Paulo Braga, de Buenos Aires)