Título: Inflação em alta assusta governo
Autor: Otoni, Luciana
Fonte: Correio Braziliense, 09/04/2010, Economia, p. 16

Influenciado pela carestia de alimentos, IPCA registra o pior trimestre em sete anos

A disparada no preço dos alimentos no início deste ano elevou perigosamente a inflação e fez o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA, o indicador oficial no país) encerrar o primeiro trimestre em 2,06%, a maior taxa desde os 5,13% de 2003 (veja ilustração). Depois de registrar alta de 0,75% em janeiro e de 0,78% em fevereiro, o IPCA de março ficou em 0,52%, mais que o dobro do percentual de 0,20% registrado em março de 2009. A guinada na carestia assusta o governo, que quer eleger a pré-candidata petista à Presidência, Dilma Rousseff , pois o encarecimento de gêneros alimentícios afeta principalmente o eleitorado de baixa renda.

Além disso, o recrudescimento dos preços torna mais difícil para o governo cumprir o centro da meta de 4,5%, acende a luz amarela no Banco Central (BC) e consolida um cenário de elevação dos juros na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) no dia 28. Ao iniciar um ciclo de elevação na taxa Selic, hoje em 8,75% ao ano, o BC tentará conter a remarcação de preços por meio do encarecimento do custo do dinheiro, do enxugamento do crédito e da desaceleração do consumo.

Temendo os efeitos da perda de poder aquisitivo da população em um ano eleitoral, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que geralmente não comenta os resultados do IPCA, fez questão de afirmar ontem, em Brasília, que não há descontrole: Farei tudo o que estiver ao meu alcance para não deixar a inflação voltar. Em viagem a Porto Alegre, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, frisou que os preços altos se devem a um choque de oferta causado pelo excesso de chuvas e não a uma inflação de demanda, que seria provocada pelo aquecimento do consumo.

O encarecimento dos alimentos foi tão forte neste início do ano que a variação de 3,69% desses itens entre janeiro e março superou a alta de 3,18% registrada em todo o ano passado. Os vilões foram o tomate (44,59%), o açúcar refinado (25,27%), as hortaliças (24,84%), a batata (21,45%) e o leite (13,18%). A coordenadora de Índices de Preços do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Eulina dos Santos, destacou que as remarcações são pontuais, se devem às chuvas e não se manterão nos meses seguintes.

Para comprovar a tese, ela excluiu do IPCA dos dois últimos meses a variação da educação, cujo reajuste também foi elevado no início deste ano. Com isso, a inflação de 0,52% em março cai para 0,48% e a de 0,78% em fevereiro baixa para 0,46%, refletindo basicamente alimentos e combustíveis. No caso específico desse ano, está havendo uma alta generalizada, salientou Eulina.

Prejuízo à mesa Tradicionalmente, os alimentos ficam mais caros em janeiro, fevereiro e março devido a fatores sazonais, como o clima. A diferença é que neste ano, as chuvas em intensidade maior prejudicaram ainda mais as lavouras. O fornecimento ficou comprometido, a lei da oferta e da procura deu a sua contribuição e o prejuízo chegou à mesa da população. Segundo Eulina, os serviços prestados por empregados domésticos, médicos e dentistas também pressionaram o IPCA.

O mercado não se surpreendeu com a inflação de 0,52% em março e de 2,06% no acumulado, mas passa, agora, a considerar como mais difícil para o BC entregar um IPCA de 4,5% em 2010. Não se deve dizer que o BC abandonará os 4,5% neste ano, mas, com certeza, está mais difícil chegar a esse resultado. O mais provável é que, depois dos dados do primeiro trimestre, passe a mirar o centro da meta considerando 2011, comenta Flávio Serrano, economista sênior do BES Investimento.

Com a certeza da alta dos juros, os analistas calculam por quanto tempo e em que intensidade o BC fará o ajuste da política monetária. Para Serrano, o relatório de inflação sinalizou que o Copom iniciará a alta com 0,5 ponto percentual. Ele, lembra, contudo, que o arrocho pode chegar a 0,75 ponto, caso haja piora das expectativas de inflação.

Farei tudo o que estiver ao meu alcance para não deixar a inflação voltar Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República