Título: Fatia de estrangeiros cai a 21,4%
Autor: Maria Christina Carvalho
Fonte: Valor Econômico, 14/06/2005, Finanças, p. C1

Setor Financeiro Nova regra européia pode estimular outros bancos a seguir La Caixa e sair do país

A participação dos bancos estrangeiros no mercado brasileiro vai diminuir mais neste ano com a decisão do banco espanhol Caja de Ahorros y Pensiones de Barcelona (La Caixa) vender sua participação de 3,12% no capital total do segundo maior banco privado brasileiro, o Itaú. Uma primeira tranche, equivalente a quase um terço do lote, já foi vendida na quinta-feira. Uma mudança nas regras contábeis utilizadas nos países da comunidade européia influenciou a decisão da La Caixa e pode levar outros bancos europeus que têm investimentos minoritários em bancos brasileiros a tomar a mesma decisão. Comenta-se no mercado que a portuguesa Caixa Geral de Depósitos (CGD) estuda reduzir a participação no Unibanco. O banco brasileiro não comenta o assunto. Desde 2001, a participação dos bancos estrangeiros no mercado brasileiro vem diminuindo. De acordo com dados mais recentes do Banco Central (BC), os bancos estrangeiros tinham uma fatia de 30% dos ativos totais do sistema bancário em 2001. Esse percentual desabou para 21,4% no final de 2004. A participação dos estrangeiros no crédito total também declinou de cerca de 30% para perto de 22% no mesmo período. Ganharam espaço os bancos privados, cuja participação nos ativos totais do sistema financeiro subiu de pouco menos de 40% para 43,6% entre 2001 e 2004. Já os bancos públicos mantiveram a fatia de mercado em torno de 35%. Segundo o Banco Central, a redução da participação do capital estrangeiro no mercado bancário brasileiro registrada nos últimos anos, "não significa a retirada desse capital do sistema mas reflete, principalmente , os processos de reorganização societária, em que o capital estrangeiro deixa de ser controlador de determinas instituições para se transformar em acionista minoritário dos grupos nacionais". A La Caixa não exemplifica esse movimento. Ela assumiu a participação no Itaú em 2001, depois que a CGD, que era acionista do banco há muitos anos, fez negócio com o Unibanco. A CGD assumiu uma participação de 12,5% no Unibanco após ter lhe vendido seu banco no Brasil, o Bandeirantes. Para evitar conflito de interesses, não pôde manter a fatia no Itaú. Foi também assim que o espanhol BBVA assumiu uma participação de 5% no capital total do Bradesco, depois de lhe vender o banco que havia comprado no país, originário do antigo Econômico. No entanto, as novas regras contábeis que entraram em vigor na Europa no início do ano podem tornar essas participações desinteressantes, conforme as características de cada associação, as peculiaridades do acordo de acionistas e a estratégia de cada instituição financeira (ver matéria ao lado). Essa foi, pelo menos a conclusão dos administradores da La Caixa. Conforme comunicado conjunto divulgado pelo Itaú e La Caixa, a venda da participação no banco brasileiro foi decidida por causa de "mudanças na política de investimentos no plano estratégico do banco espanhol em conseqüência da adoção de novas normas internacionais de reporte financeiro". Para La Caixa essa nova situação não se encaixava em sua estratégia. Na realidade, nos últimos meses, o banco de Barcelona vendeu participações em outras instituições como o alemão Deutsche, aparentemente privilegiando investimentos fora da área financeira como a Telefónica e Repsol. Por causa da nova regra contábil, a CGD, no balanço do primeiro trimestre, transferiu o investimento de 12,5% no Unibanco da consolidação por equivalência patrimonial, onde constam posições na Águas de Portugal, por exemplo, para investimento, alocando-o na carteira de títulos. No balanço, a CGD informa que "as participações no Unibanco e Unibanco Holdings, que antes eram contabilizadas pelo método de equivalência patrimonial, foram reclassificadas para aplicações em títulos, originando um impacto positivo nos capitais próprios de cerca de ? 256,8 milhões". La Caixa informou que vai se desfazer gradativamente das ações do Itaú. Um primeiro lote já foi vendido quinta-feira. Conforme informou a Bovespa, foram vendidas 1,254 milhão de ações preferenciais do Banco Itaú Holding, girando um volume financeiro de R$ 558,028 milhões. Especialistas calculam que esse primeiro lote equivale a um terço da oferta total, que envolve cerca de 3,6 milhões de ações. La Caixa avaliou o lote total em cerca de ? 530 milhões. O Itaú informou que quer recomprar essas ações para mantê-las em tesouraria e depois, provavelmente, cancelá-las. A administração do banco brasileiro entende que esta eventual recompra cria valor para os acionistas, na medida em que aumenta o lucro por ação, não afetando as operações do Itaú, bem como não alterando de maneira significativa seus índices e limites de adequação de capital. "O Itaú tem excesso de capital", disse o vice-presidente sênior Henri Penchas. "Esse dinheiro está aplicado em títulos. Agora vai comprar ações e vai fazer um bom negócio porque o lucro por ação vai subir", acrescentou. Na nota enviada ao mercado, o grupo brasileiro diz que o reflexo estimado para a Itaúsa, controladora do Itaú, decorrente de ajustes de equivalência patrimonial, considerando que o lote venha a ser integralmente adquirido pelo Itaú e a cotação média do dia 3, pode significar redução de aproximadamente R$ 520 milhões em seu resultado, sem contudo representar qualquer desembolso e contribuindo ainda para elevar a participação detida no capital total do Itaú de 46,8% para 48,3%. Penchas explicou que a diferença entre o valor patrimonial e o valor de mercado do Itaú representará uma despesa para a Itaúsa. Essa despesa, porém, tende a ser compensada no tempo com o aumento do ganho em dividendos resultante do aumento da participação. Em consequência da decisão, La Caixa não mais indicará, no futuro, um membro do conselho de administração, um membro do comitê consultivo internacional e um diretor gerente, como previa o acordo de acionistas antes vigente. Mas será mantida parceria no investimento detido no português Banco BPI, em que os dois bancos partilham do grupo de controle, com 16,2% cada um e nenhum outro acionista tem uma posição superior. Além de colaborarem em operações que envolvam fluxo de capitais entre o Brasil e a Península Ibérica.