Título: Serra parte para cima dos petistas
Autor: Foreque, Flávia; Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 11/04/2010, Política, p. 2

Sem citar Dilma e Lula, pré-candidato tucano critica a administração do PT: O governo deve servir ao povo, não a partidos

O pré-candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra, deflagrou a campanha com uma série de ataques diretos ao governo federal, ao PT e à pré-candidata Dilma Rousseff sem citá-los uma só vez. Sob o slogan O Brasil pode mais repetido por 10 vezes durante a fala de uma hora do candidato , Serra usou frases do tipo o país não tem dono, não aceito o raciocínio do nós contra eles, e frisou que o governo deve servir ao povo, não a partidos e a corporações que não representam o interesse público. Foi incisivo na tentativa de derrubar todas as tarjas que os petistas tratam de jogar sobre ele: De mim, ninguém deve esperar que estimule disputas de pobres contra ricos, ou de ricos contra pobres. Eu quero todos, lado a lado, na solidariedade necessária à construção de um país que seja realmente de todos. Serra tentou ainda apagar todas as pechas que os adversários tentam lhe impor, como, por exemplo, o de elitista e de ser contra o Nordeste. Ninguém deve esperar que joguemos estados do Norte contra estados do Sul, cidades grandes contra cidades pequenas, o urbano contra o rural, a indústria contra os serviços, o comércio contra a agricultura, azuis contra vermelhos, amarelos contra verdes. Como Lula, também usou comparações com o futebol: (A divisão) pode ser engraçado no futebol. Mas não é quando se fala de um país. E é deplorável que haja gente que, em nome da política, tente dividir o nosso Brasil. O discurso de Serra ficou pronto 11 horas antes de ser lido no teleprompter de cristal colocado à sua frente no púlpito, de onde o candidato foi apresentado pela modelo Ana Hickmann, a mestre de cerimônias. Antes de pronunciar o discurso, pediu um minuto de silêncio pelas vítimas dos temporais no Rio de Janeiro. O texto foi cuidadosamente elaborado para tocar em cada área da administração pública, apontando as falhas do governo. Falou da carência da infraestrutura brasileira só 10% das estradas são asfaltadas; e do comércio mais de 100 acordos de livre comércio foram assinados no mundo e o Brasil assinou um único acordo que ainda não entrou em vigência. Serra tomou o cuidado ainda de dar ênfase a determinados segmentos nos quais têm um eleitorado cativo, por exemplo, o agronegócio, citado como a galinha dos ovos de ouro. Na avaliação de Serra, muitas vezes salvou as contas externas e ajudou a segurar a inflação. Nesse tópico, fez uma menção especial à senadora Kátia Abreu (DEM-TO), presidenta da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), citada pelo DEM como um nome para vice na chapa. Também mencionou que os investimentos em agricultura não devem representar um risco à preservação ambiental uma forma de não deixar o discurso ambientalista apenas para a senadora Marina Silva (PV). O pré-candidato tucano levou os militantes ao delírio ao ameaçar os petistas: As provocações, vamos responder com serenidade. Quanto mais mentiras os adversários disserem sobre nós, mais verdades diremos sobre eles. O Brasil não tem dono, disse ele, no ponto mais aplaudido da festa. O candidato tucano conseguiu, pela primeira vez em sua carreira política, arrancar lágrimas do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso com um discurso. Foi quando fez uma homenagem especial às mulheres, citando duas, dona Zilda Arns, vítima do terremoto no Haiti, e a ex-primeira-dama Ruth Cardoso, que morreu em junho de 2008. Ela sempre lia todos os meus discursos. Se ela estivesse viva, eu repassaria o discurso a ela. Ela iria fazer sugestões e eu, como sempre, iria obedecer. Ela está aqui e aprovando o meu discurso. Foi quando Fernando Henrique levou a mão ao bolso e puxou o lenço para enxugar as lágrimas. Serra começou a falar logo depois do ex-governador de Minas, Aécio Neves, que chegou duas horas atrasado, quando o presidente Fernando Henrique Cardoso já estava no meio de sua fala. FHC precisou esperar que as palmas e os gritos de vice, vice, vice cessassem para que retomasse seu pronunciamento. Nós vamos querer um Brasil que no presente transforma tudo em marketing ou um Brasil que construa o futuro? O Serra é um construtor do futuro, afirmou Fernando Henrique. Serra falou ainda de assuntos em que o governo Lula vai mal, como segurança pública. Também frisou a necessidade de cumprimento das leis já que Lula reclama da legislação eleitoral e acabou multado por campanha antecipada. Todos têm a obrigação de cumprir a lei. No nosso país, nenhum brasileiro estará acima da lei, disse Serra.

Cuba Ao lembrar seu passado de exilado político, quando pessoas presas com ele no Chile acabaram mortas, José Serra disse que democracias não têm gente encarcerada ou condenada à forca por pensar diferente do regime e que, para ele, os direitos humanos não são negociáveis. O alvo da crítica era a política externa do governo brasileiro, com seu apoio ao Irã e a Cuba, onde, em fevereiro, o preso Orlando Zapata acabou morto depois de fazer greve de fome em protesto contra a ditadura instituída há 51 anos pelo líder cubano Fidel Castro.