Título: Os contratos bancários na Justiça do RS
Autor: Geraldo Nogueira
Fonte: Valor Econômico, 13/06/2005, Legislação & Tributos, p. E2

"Alguns juízes gaúchos ainda prosseguem limitando os juros bancários a 12% ao ano"

A Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, de forma reiterada, vem sendo apontada como aquela que maiores dificuldades antepõe aos negócios bancários, favorecendo o tomador do dinheiro, com amparo no Código de Defesa do Consumidor e em outras legislações infraconstitucionais. Eram comuns, até bem pouco tempo, decisões frontalmente contrárias às instituições financeiras, sob vários fundamentos e enfoques. O mais importante motivo para que as decisões avassaladoramente mandassem revisar os contratos de empréstimos bancários estava em que a Constituição Federal de 1988 teria limitado a incidência de quaisquer juros ao patamar de 12% ao ano. Esta tese, no entanto, foi derrotada no Supremo Tribunal Federal (STF), que em sede de ação direta de inconstitucionalidade (Adin) decidiu pela necessidade de regulamentação do artigo 192 da Carta Maior que, assim, não seria auto-aplicável como equivocadamente entendiam alguns (a maioria) magistrados gaúchos. Mais recentemente, com a edição da Emenda Constitucional nº 40, de 2003, não restou espaço algum para a discussão desta matéria, pois, ao mesmo tempo em que solucionou as dúvidas que pairavam em razão da interpretação do texto constitucional, também afastou completamente a incidência da denominada Lei da Usura (na realidade o Decreto nº 22.626/1933) aos contratos bancários. A invocação da Lei da Usura como fator limitador dos juros bancários ao patamar de 12% ao ano, aliás, também era equivocada por dois motivos importantes: (1) porque a Lei nº 4.595/64 já derrogara expressamente a parte da Lei da Usura quando cuidava de contratação de serviços bancários; e (2) porque o artigo 17 da mesma Lei da Usura excluía sua incidência em relação às casas de empréstimos sobre penhores e congêneres, remetendo sua regulamentação à uma legislação especial. Tanto a taxa de juros quanto as comissões, as taxas remuneratórias e os demais serviços bancários, desde então, precisavam observar tão somente os percentuais fixados pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), conforme a decisão plenária adotada pelo Supremo no julgamento do Recurso Extraordinário nº 78.953 em março de 1975.

Com a edição da Emenda Constitucional nº 40, de 2003, não restou espaço algum para a discussão dos juros bancários

Adveio a Súmula nº 296 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que sedimentou o entendimento e espargiu a orientação de que os juros remuneratórios são devidos à taxa média de mercado fixada pelo Banco Central do Brasil (Bacen). Algumas câmaras do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), embora também acatando tais decisões, mesmo assim decidiram fixar os limites dos juros à taxa Selic. Não é bem esta a posição do tribunal superior. Ademais, alguns magistrados ainda prosseguem limitando os juros bancários a 12% ao ano, amparando-se no artigo 51, inciso IV da Lei nº 8.078/90 - o Código de Defesa do Consumidor - pensando em evitar, desta forma, o que entendem se tratar de uma abusividade contra o consumidor dos serviços bancários. A Medida Provisória nº 2.170-36 traz em seu bojo, mais precisamente no artigo 5º, um dispositivo que libera a contratação de juros capitalizados com periodicidade inferior a um ano. Este artigo está em discussão na esfera judicial (no Supremo, onde se discute a validade da reiteração da medida provisória), ou seja, está sub judice. Mesmo assim, diante da necessidade de ser dada a prestação jurisdicional imediata, o entendimento manifestado em vários julgados de primeiro e também de segundo grau no Rio Grande do Sul é o de que a validade da capitalização mensal de juros está subordinada à sua clara contratação no instrumento de empréstimo bancário. Sem previsão no contrato, a capitalização é considerada abusiva e esta é uma posição interessante que as instituições financeiras podem contornar. Além destas questões mais fundamentais, o Tribunal do Rio Grande do Sul vem admitindo a revisão de contratos bancários extintos, mas aí em consonância com a Súmula nº 286 do STJ, que, na forma como foi redigida, debilitou o princípio do ato jurídico perfeito, carreando fragilidade a todo o sistema legal brasileiro e conseqüente insegurança a quem deseja investir no Brasil.