Título: Mercados festejam blindagem em Lula
Autor: Luiz Sérgio Guimarães
Fonte: Valor Econômico, 15/06/2005, Finanças, p. C2

Intensa volatilidade marcou o mercado financeiro no dia do primeiro depoimento do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) à Câmara. Após frenético sobe-e-desce, acabaram fechando otimistas com os rumos da crise política, já que Jefferson, sem prova documental alguma de suas acusações, fez questão de inocentar completamente o presidente Lula. E apenas mencionou, em tom de passagem desprovido de teatralidade, o nome do ministro da Fazenda Antonio Palocci. Os mercados abriram o dia confiantes de que não precisariam incorporar o risco político às operações. Até às 13 horas os negócios refletiram o clima ameno derivado dos fundamentos da economia brasileira e da certeza de que o Copom do Banco Central irá interromper hoje o aperto monetário. Mas, na hora do almoço, começaram a surgir boatos de novas denúncias. Rumores de que a revista "Isto É Dinheiro" - confirmados à noite - iria publicar reportagem na qual ex-secretária de Marcos Valério Fernandes de Souza, sócio da DNA Propaganda, confirmaria acusações feitas por Jefferson de que o publicitário era um dos "operadores" do mensalão na Câmara anularam a rota otimista. Os rumores foram os responsáveis pelos únicos momentos de estresse vividos pelos mercados. A Bovespa inverteu a trajetória matinal de alta e rapidamente exibia, mesmo antes do início do depoimento de Jefferson, queda de 2,3%. O dólar devolveu a baixa da manhã e subia 1,14% no começo da tarde. Os juros futuros mostraram comportamento idêntico. Mas a tensão foi se dissipando à medida em que Jefferson discursava no Conselho de Ética. Quase no final do seu depoimento, surgiu rumor de que o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, iria deixar o governo, reassumindo sua cadeira de deputado na Câmara. Foi o que convenceu de vez os mercados a desarmar suas defesas anticrise. O mercado quer o afastamento de Dirceu - tido como o objetivo central da ofensiva de Jefferson - como forma de acabar logo com a turbulência e fortalecer o ministro Palocci. Em nota, o Palácio do Planalto desmentiu a saída de Dirceu, mas era tarde, a festa corria solta nos mercados.

E quer volta de José Dirceu à Câmara

A Bovespa fechou em forte alta de 3,38%, com volume expressivo de R$ 2,16 bilhões, uma puxada artificial que reflete o embate entre "comprados" e "vendidos" no mercado futuro de índice, cujo vencimento acontece hoje. O dólar encerrou o dia em queda de 0,65%, a terceira em seqüência, a R$ 2,4340. O risco-país caiu 1,18%, para 417 pontos-base. Os contratos mais negociados no mercado futuro de juros da BM&F sustentaram a via de baixa. Apenas uma grave crise política poderia neutralizar a projeção de queda dos juros a partir de setembro. A projeção de CDI para a virada do ano fechou estável em 19,25%, mas chegou a subir até 19,31% no ápice da tensão. O contrato mais negociado (R$ 14,6 bilhões), para janeiro de 2007, recuou de 17,77% para 17,67%, bem distante do pior momento do pregão, quando bateu em 17,95%. O risco político é a única variável que impede o mercado de deslanchar operações otimistas. Externamente, o cenário autoriza a compra de ativos brasileiros. Ontem foi divulgado o Índice de Preços ao Produtor (PPI) dos EUA referente a maio. E ele confirmou as análises de que a inflação americana não deve ser fonte de preocupações ao Federal Reserve (Fed). O PPI caiu 0,6% no mês passado, quando os economistas esperavam uma deflação menos intensa, mais perto de 0,2%. O núcleo do indicador avançou 0,1% ante expectativa de alta de 0,2%. Se não fosse o surgimento da entrevista de Fernanda Karina Ramos Somaggio, ex-secretária de Marcos Valério, publicada ontem à noite no site da "Isto É Dinheiro", os mercados poderiam operar hoje com tendências positivas na expectativa de que o Copom irá manter a taxa Selic em 19,75%. O IBGE divulgou ontem dado que reforça essa previsão majoritária do mercado. Segundo a Pesquisa Mensal do Comércio o volume de vendas caiu 0,23% em abril comparativamente a março. Foi a terceira queda consecutiva da média móvel trimestral em termos dessazonalizados das vendas físicas. Não há inflação de demanda. Mas a entrevista amplia o risco político até que se afaste todos os acusados do governo.