Título: Governo age para tentar blindar imagem de Lula
Autor: Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 20/06/2005, Política, p. A8

Crise Palácio do Planalto traça roteiro que delimita o Congresso como o território das denúncias

Após demitir o ministro José Dirceu da Casa Civil e tirar as investigações de corrupção de dentro do Palácio do Planalto, pelo menos por enquanto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem um roteiro traçado para seguir, a partir da próxima semana, a fim de sair do imobilismo, blindar o governo e retomar a iniciativa política perdida desde que o PT perdeu a eleição para a presidência da Câmara. O roteiro alinhavado no Planalto para Lula "circunscrever a crise ao Congresso", após a demissão de Dirceu, prevê as seguintes ações complementares: 1-Finalizar a reforma, o que não deve acontecer de uma única vez. Provavelmente na terça-feira o presidente anuncia mais um grupo de mudanças, talvez já incorporando o PMDB ao governo. Duas indicações para o ministério serão feitas pelas bancadas do Senado e da Câmara, uma cada, e a terceira pelo ex-presidente José Sarney (AP). O PMDB ainda reivindica mais espaço. 2-O anúncio de duas ou três medidas emblemáticas. No forno, a redução dos cargos em comissão no governo, estimados hoje em cerca de 20 mil, e do número de ministérios, por meio da retirada do status de ministro das secretarias. 3-Restabelecer uma relação positiva com o Senado e a Câmara dos Deputados. 4-Estabelecer "algumas" pontes com a oposição. A nomeação de Francisco Dornelles (RJ) atenderia o PP e agradaria o governador Aécio Neves (MG), que é sobrinho-neto do deputado, e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, do qual Dornelles foi ministro. O nome de Dornelles é efetivamente cotado, mas não há nenhuma definição sobre sua nomeação. É apenas um exemplo sobre a margem de manobra de que Lula dispõe. O sucesso da empreitada depende apenas de Lula, segundo avaliação de interlocutores do presidente. Ele já teria errado no primeiro passo, ao demitir Dirceu e deixar vaga a Casa Civil. Isso permitiu um movimento de pressões e contrapressões no PT e no governo. Por outro lado, restabeleceu a autoridade - se tirou Dirceu, pode tirar qualquer um, dizem esses interlocutores. O mais provável é que Lula nomeie um gerente para a Casa Civil e indique um político para o Ministério da Coordenação Política. Mas o núcleo próximo a Lula tem aconselhado o presidente a extinguir a coordenação política, deixando a tarefa de articulação aos líderes do Congresso. Defendem essa posição os ministros Luiz Dulci (secretaria Geral), Jaques Wagner (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social) e, em menor escala, Luiz Gushiken (Comunicação de Governo) e Antonio Palocci (Fazenda). Na posição oposta estão o ministro da Coordenação Aldo Rebelo, os ministros políticos e os líderes do PT no Congresso. O risco de tirar a política do Planalto é a mensagem que Lula passaria ao Congresso: a corrupção estaria restrita ao parlamento. Assim, em vez de uma "relação positiva", Lula estaria abrindo uma nova frente de atrito. Principalmente porque uma das medidas em estudos, a de transferir as secretarias cujos ministros perderem o status para a Secretaria Geral da Presidência da República, permitiria a conclusão de que Lula pensa em se apoiar nos movimentos sociais para enfrentar os políticos. Além da demissão de Dirceu, os interlocutores do presidente avaliam que as duas últimas pesquisas de opinião, divulgadas semana passada, favoreceriam Lula a partir para a iniciativa. A pesquisa Datafolha mostra que a avaliação de Lula se manteve dentro da margem de erro - foi de 45% para 44% em quinze dias. Já a pesquisa CNI/Ibope revela uma queda de quatro pontos no índice de confiança depositada em Lula, mas, a exemplo do Datafolha, mostra também que o presidente continua forte candidato à reeleição em 2006. Se conseguir implementar o roteiro para sair da crise, os interlocutores do presidente acreditam que Lula pode retomar a inciativa política, tentar circunscrever a crise ao Congresso e levar o governo até a eleição de 2006 em condições de disputar e vencer. O risco passa a ser a investigação - sempre imprevisível -do Congresso bater novamente à porta de seu gabinete.