Título: Após 61 dias, Arruda deixa a prisão
Autor: Campos, Ana Maria
Fonte: Correio Braziliense, 13/04/2010, Cidades, p. 23

caixa de pandora

Por oito votos a cinco, a corte especial do Superior Tribunal de Justiça decidiu revogar a restrição de liberdade do ex-governador, que saiu da Polícia Federal no fim da tarde e foi para sua residência particular

Por maioria de votos, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu liberar da prisão o ex-governador José Roberto Arruda, sob o fundamento de que não existem mais motivos para mantê-lo encarcerado na Superintendência da Polícia Federal (PF). Na sessão de ontem, sete ministros seguiram o voto do relator, Fernando Gonçalves, que defendeu a revogação da prisão preventiva, decretada há 61 dias por obstrução da Justiça. Prevaleceu agora o entendimento de que, ao perder o cargo de chefe do Executivo, por infidelidade partidária, Arruda não tem mais condições de interferir na coleta de provas relacionadas ao Inquérito nº 650, que trata do suposto esquema de corrupção no GDF.

Fernando Gonçalves também avaliou que a liberdade de Arruda não representa mais risco às investigações porque a fase de depoimentos foi encerrada na semana passada. O relator da Operação Caixa de Pandora afirmou ainda que a Polícia Federal e o Ministério Público Federal passaram à etapa de análise de documentos apreendidos, de dados de quebra de sigilos bancários e fiscais, além de avaliação de perícias.

Não há como o preso influir na instrução criminal porque não mais sustenta a condição de governador de estado. As diligências restantes são todas de caráter objetivo, documental, afirmou Fernando Gonçalves, em um de seus últimos atos no inquérito. Ele disse que a prisão preventiva poderá ser restabelecida, se surgirem novos fundamentos que justifiquem tal medida. Após a decisão, Arruda deixou a PF às 17h20, acompanhado da mulher, Flávia Arruda, e dos advogados. Do Setor Policial Sul, seguiu diretamente para sua casa, no Park Way, onde recebeu alguns correligionários. O ex-governador não falou com a imprensa.

Ao revogar o decreto de prisão preventiva, o STJ permitiu também a liberação dos outros cinco denunciados pelo MPF por participação no suposto suborno ao jornalista Edson Sombra, testemunha nas investigações da Caixa de Pandora. Dessa forma, o ex-chefe de Comunicação Weligton Moraes, o ex-secretário particular de Arruda Rodrigo Arantes, o suplente de deputado distrital Geraldo Naves (sem partido), o ex-conselheiro do Metrô-DF Antônio Bento e o ex-presidente da Associação dos Servidores da Companhia Energética de Brasília (CEB) Haroaldo Brasil deixaram ontem à noite o Complexo da Papuda.

A posição majoritária no STJ mostra que a estratégia dos advogados de Arruda surtiu efeito. A equipe de Nélio Machado juntou no pedido de revogação da prisão a carta escrita à mão pelo ex-governador em que ele anunciou a disposição de não recorrer contra a decisão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-DF) que cassou seu mandato por infidelidade partidária. Em parecer encaminhado na manhã de ontem ao STJ, a subprocuradora-geral da República Raquel Dodge, responsável pelo caso, havia pedido a manutenção da prisão preventiva. Ela sustentou que as investigações ainda não foram concluídas e ainda haveria perigo de contaminação de provas. Foi um dos raros momentos de discordância de Fernando Gonçalves com o Ministério Público Federal.

Votos O ministro completa 70 anos em 28 de abril e deixará o STJ, para aposentadoria compulsória, na próxima semana. A sessão de ontem foi a última participação dele na Corte Especial, órgão do STJ formado pelos 15 ministros mais antigos, onde são julgadas autoridades com foro especial no Tribunal. O voto do magistrado foi seguido pelos ministros Nilson Naves, Hamilton Carvalhido, João Otávio Noronha, Laurita Vaz, Luiz Fux, Teori Zavascki e Arnaldo Esteves de Lima. O ministro Ari Pargendler abriu a divergência. Ele defendeu que, mesmo fora do governo, Arruda mantém o controle da máquina porque indicou muitos servidores para cargos comissionados. Parece-me que ele continua influente até que a denúncia seja ou não oferecida, disse Pargendler. Essa posição foi seguida pelos ministros Felix Fischer, Gilson Dipp, Nancy Andrighi e Francisco Falcão.

Durante a sessão, um pedido de vista de Carvalhido quase suspendeu o julgamento. O magistrado alegou que não conhecia profundamente a matéria porque não participou da sessão de 11 de fevereiro, quando a prisão preventiva de Arruda foi decretada para garantir a ordem pública e a instrução do Inquérito nº 650, em curso no STJ. João Otávio, no entanto, argumentou que a paralisação do debate naquele momento significaria manter Arruda e os demais envolvidos presos, sem uma decisão judicial, por pelo menos mais 17 dias, uma vez que a próxima sessão da Corte Especial ocorrerá apenas na última semana de abril.

João Otávio defendeu a antecipação dos votos e se colocou favorável à revogação da prisão. Não podemos manter um prisioneiro da mídia, afirmou. Tenho plena convicção de que não se encontram mais os objetos que levaram à decretação da prisão. Os fundamentos utilizados não mais subsistem. Todas as testemunhas já foram ouvidas e as atitudes, tomadas, afirmou Noronha. Com a contundência dos argumentos do magistrado em favor de Arruda, reforçados pela posição do ministro Nilson Naves, Carvalhido voltou atrás e proferiu seu voto pela revogação da prisão preventiva.

Não há como o preso influir na instrução criminal porque não mais sustenta a condição de governador de estado.

Fernando Gonçalves, ministro relator do pedido de revogação da prisão de José Roberto Arruda

Cronologia

Confira os principais fatos envolvendo Arruda desde o início da Operação Caixa de Pandora

27 de novembro A Polícia Federal deflagra a Operação Caixa de Pandora. São cumpridos 29 mandados de busca e apreensão em 16 endereços, incluindo a Câmara Legislativa, o Palácio do Buriti e a Residência Oficial do então governador José Roberto Arruda, em Águas Claras. A PF investiga o suposto esquema de propina do GDF para a base de deputados aliados, com dinheiro repassado por empresas privadas muitas delas mantinham contratos com o Executivo local. Durval Barbosa, até então secretário de Relações Institucionais do governo Arruda, é quem denuncia do esquema à PF.

10 de dezembro Arruda anuncia sua desfiliação do Democratas.

11 de fevereiro O Superior Tribunal de Justiça decreta a prisão preventiva de Arruda, além de seu afastamento do cargo de governador. Ele se licencia e se apresenta à Polícia Federal.

12 de fevereiro O ministro Marco Aurélio Mello, do STF, nega o pedido de habeas corpus para o governador Arruda. Com isso, ele continua preso em uma sala especial no Complexo da PF, no Setor Policial Sul.

4 de março Os ministros do STF negaram, por nove votosa um, o pedido de liberdade de Arruda.

16 de março Em placar de quatro votos a três, o TRE-DF cassa mandato de Arruda por infidelidade partidária.

12 de abril Em votação na corte especial, o STJ decide, por oito a cinco, pela libertação de Arruda, que ficou preso na PF durante 61 dias.

Como foi a votação

Veja como votaram os ministros da corte especial do STJ após

A FAVOR Fernando Gonçalves Nilson Naves Hamilton Carvalhido Laurita Vaz Luiz Fux João Otávio de Noronha Teori Albino Zavascki Arnaldo Esteves Lima

CONTRA Ari Pargendler Felix Fischer Gilson Dipp Francisco Falcão Nancy Andrighi