Título: Barreiras contra a China causam polêmica entre Secex e Itamaraty
Autor: Sergio Leo
Fonte: Valor Econômico, 24/06/2005, Brasil, p. A2

Itamaraty e Ministério do Desenvolvimento têm posições distintas em relação ao tratamento a ser dado para pedidos de medidas antidumping contra produtos chineses, com o recente reconhecimento da China como " economia de mercado " , por parte do governo.

Os diplomatas querem que os processos com pedidos de barreiras antidumping aos produtos chinesas sejam analisados já se levando em conta o reconhecimento do status de economia de mercado para a China, o que acrescenta exigências maiores para o estabelecimento de barreiras. A Secretaria de Comércio Exterior (Secex), responsável pelas análises e conclusão desses processos, garante, porém, que não modificou, ainda os procedimentos em relação à China.

A Secex argumenta que será necessária uma resolução da própria secretaria para regulamentar o reconhecimento do novo status para a China, o que exigirá dos empresários concorrentes no Brasil a demonstração de que os preços dos importados estão abaixo dos preços " normais " do mercado chinês. Nada impede, porém, que a Secex emita essa resolução quando tiver notícia de novo pedido de medida antidumping contra o país, considerado sócio estratégico do Brasil pelo governo. O Itamaraty argumenta que a resolução é uma formalidade simples, que estava condicionada ao cumprimento dos compromissos assumidos no ano passado pela China.

" E a China está cumprindo todos os compromissos " , afirma o subsecretário-geral para Assuntos Econômicos e Tecnológicos do Ministério de Relações Exteriores, Clodoaldo Hugueney. Ele defende que o acordo assinado pelo governo brasileiro, com o reconhecimento do status de economia de mercado para a China, é suficiente para levar à modificação dos procedimentos aplicados nos processos antidumping contra os chineses. " Não vai dificultar nada para os empresários brasileiros " , garante, irritado, o diplomata.

Ele lembra que o Brasil já segue procedimentos da Organização Mundial do Comércio (OMC) para aplicação de barreiras antidumping (cotas ou aumento de tarifas) contra produtos concorrentes de empresas instaladas no Brasil. No caso da China, antes do reconhecimento como " economia de mercado " , a diferença era a possibilidade de se ignorar os preços no mercado chinês e usar preços de outros países como referência para verificação do " dumping " (venda abaixo dos preços normais). Mesmo após o reconhecimento, preços distorcidos por intervenção estatal, por exemplo, poderão ser ignorados, argumenta Hugueney.

Hugueney, recém-nomeado para representar o Brasil em Genebra, onde está a sede OMC, manifestou sua opinião a outros membros do governo, representantes da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e políticos enquanto esperava para participar de uma audiência, ontem, sobre a concessão de status de economia de mercado à China. A audiência foi cancelada devido à crise política e ausência de senadores na comissão onde ocorreria. Também participaria o titular da Secex, Ivan Ramalho.

Ramalho não chegou a comentar a questão do status de economia de mercado. Afirmou apenas que algumas associações empresariais vêm pedindo informações sobre as salvaguardas que o governo autorizará contra excesso de importações da China. Em muitos casos, os produtos chineses estão apenas substituindo outros fornecedores estrangeiros, ou detêm uma parcela muito pequena do mercado, o que não justifica a adoção de salvaguardas, afirmou ele.

Segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada distribuído no governo, é esse o caso, por exemplo, da maioria dos produtos têxteis e calçados que vêm se queixando da concorrência chinesa.