Título: BC eleva projeção para administrados
Autor: Denise Neumann
Fonte: Valor Econômico, 29/06/2005, Brasil, p. A2

A expressiva deflação nos preços ao atacado não passou despercebida por essa entidade chamada "mercado", mas ainda não chegou às projeções do Banco Central. Pelo contrário: o Comitê de Política Monetária (Copom) - de acordo com a ata da última reunião - não só manteve as projeções para a evolução dos preços administrados em 2005 como refez a expectativa para o reajuste desses serviços em 2006, elevando-a de 5,1% para 5,7%. Primeiro, o IGP-M de maio surpreendeu e fechou o mês em menos 0,22%. Na sequência, o IGP-DI ampliou essa queda para 0,25%, com recuo de 0,38% nos preços industriais. Por fim, o primeiro indicador de atacado de junho (o IGP-10) mostrou que o movimento de recuo nos preços se manteve pelo segundo mês e ficou em menos 0,41% no conjunto, com menos 1,10% no atacado, embutida aí queda de 0,67% nos industriais. Essa queda de preços, além de ajudar a arrefecer a inflação deste ano (além da deflação de 0,15% na terceira quadrissemana do IPC da Fipe, o reajuste da telefonia ficou em 7,27%, abaixo dos 8,6% projetados pelo BC), também tira lenha da fogueira da inflação de 2006, porque os principais serviços públicos têm seus preços indexados à inflação passada medida pelos IGPs. O "mercado" já incorporou esse comportamento recente do atacado nas projeções para 2005 e para os próximos 12 meses. Entre o final de abril e o final de junho, as expectativas coletadas pelo Banco Central para o IGP-DI deste ano recuaram de 6,94% para 5,09%, uma queda de 1,85 ponto percentual. Entre as Top 5 (grupo das consultorias que mais acertam as previsões) o recuo foi mais expressivo: de 7,21% para 4,72%). Para o IGP-M, as projeções saíram de 6,90% para 5,15% - 1,75 ponto a menos. As três quedas são expressivas para um país que persegue uma inflação de 5,1% ao ano. Nas projeções para os próximos 12 meses, os recuos também variam entre 1,5 e 1,7 ponto percentual quando se comparam as informações coletadas no final de abril e as atuais. Quando se trata de inflação, o mercado costuma ser mais conservador que o BC. Neste momento, a regra não está se confirmando. O Copom deu uma explicação absolutamente confusa para a elevação das expectativas em torno das projeções do reajuste dos administrados (o que não é praxe nas atas redigidas pela autoridade monetária, que costumam ser muito claras quando se trata da leitura dos indicadores macroeconômicos).

Expectativa para IGP-DI do ano já caiu para 5,09%

Diz a ata no item 8, subitem "d" : "A projeção dos reajustes de todos os itens administrados por contrato e monitorados para 2006 foi revista para cima em 0,6 p.p., passando de 5,1% para 5,7%. A revisão deve-se ao fato de que alguns dos itens administrados, para os quais já se dispõe de maiores informações em função dos reajustes para 2005 já terem ocorrido, foram projetados individualmente para 2006. Para os demais itens, as projeções continuam baseadas no modelo de determinação endógena de preços administrados, que considera componentes sazonais, variações cambiais, inflação de preços livres e inflação medida pelo Índice Geral de Preços (IGP) ". Interpretações são bem-vindas... e esclarecimentos devem aparecer no relatório trimestral de inflação, que será divulgado amanhã. A leitura que o "mercado" e o BC fazem da inflação futura e do que pode agir para impulsionar os preços para cima ou para baixo não teria nenhuma importância se ela não fosse um componente do sistema de metas de inflação. Além de olhar para o presente, o BC considera tanto a expectativa dos agentes como a sua própria. Se o IGP-DI ficar próximo aos 5,09% esperados pelo "mercado" no fechamento deste ano, será a menor taxa desde o 1,71% de 1998. Depois daquele ano, a menor taxa foi o 7,66% de 2003. Fora isso, chegou a 26,41%, em 2002, e 19,99%, em 1999. Os caminhos da inflação para este ano e 2006 são incertos, como é normal em uma economia aberta e de preços não controlados (apesar da brutal colher-de-chá que representa a indexação dos preços da telefonia e da energia elétrica). Mas há riscos bastante consideráveis, que podem turvar a boa notícia embutida na deflação dos IGPs e do IPC da Fipe. Entre eles, um é o mais preocupante: o repique do câmbio. Em algum momento, o câmbio vai retomar o rumo da desvalorização. Dólar a R$ 2,38 não pode ser considerado um preço de equilíbrio, apesar de festejado pela classe média, que já lota os vôos para Miami nas férias que se aproximam. Quando esse movimento se inverter, novas previsões serão feitas para os IGPs e para o IPCA. Resta saber com que velocidade o BC vai incorporar essa alta nas suas previsões e qual sua reação. Diante dos atuais IGPs (e considerando os sinais de acomodação da atividade econômica), alguns analistas até arriscam que a queda na taxa básica de juros pode ser antecipada para agosto ou mesmo julho. A alta projetada para os administrados reforça a tese conservadora, segundo a qual é preciso esperar o último trimestre. E torcer muito para que o câmbio não "atrapalhe".