Título: Apoio do PMDB a Lula será parcial na Câmara
Autor: Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 29/06/2005, Política, p. A5

Crise Além dos governadores, boa parte da bancada da Câmara resiste a acordo; só o Senado adere em peso

A cúpula congressual do PMDB decidiu aceitar a oferta do presidente Luiz Inácio Lula de apoio ao governo em troca de quatro ministérios, mas, em contrapartida, só vai assegurar os votos de 20 da bancada de 23 senadores no Senado e de cerca de 50 dos 85 deputados federais. A tendência de Lula é aceitar, segundo apurou o Valor. Os dois atuais ministros do partido devem ser substituídos por outros nomes a serem indicados pela legenda, cuja definição só ocorrerá depois de o presidente estabelecer os critérios da reforma ministerial. Durante a noite de ontem, a cúpula pemedebista ainda tentava um acordo com os setores que se opõem à ampliação do espaço do partido no governo. O maior problema é na Câmara, onde o ex-governador do Rio Anthony Garotinho exerceria influência sobre algo em torno de 16 e 21 deputados. A ala ligada ao presidente da sigla, Michel Temer (SP), após participar de todas as negociações com o governo, também se opõe ao entendimento com Lula. As dissenções ficaram explícitas em reunião da bancada na Câmara, ontem à tarde. Enquanto a reunião era realizada, os defensores do acordo tentavam implementar a decisão de aceitar a oferta de Lula, tomada numa conversa na véspera, na casa do presidente do Senado, Renan Calheiros (AL) - a assinatura de uma nota de apoio à "governabilidade". No Senado, o apoio ao acordo com Lula foi amplamente majoritário - 20 dos 23 senadores. Até as 19h de ontem os governistas haviam conseguido as assinaturas de 52 dos 85 deputados. A expectativa é entregar a lista a Lula com pelo menos 55 assinaturas. O PMDB, que escolheria hoje seu novo líder, o que poderia ser um teste para governistas e oposicionistas, deixou a votação para agosto. Os governistas acenavam com a possibilidade de eleger Moreira Franco (RJ), ligado a Garotinho, caso a oposição aceitasse a entrada do partido no governo sem muito barulho. Tanto a eleição foi adiada, como Moreira retirou sua candidatura. As conversas prosseguiam ontem à noite, agora apenas em torno da questão principal, que é apoiar o governo sem divisão no partido. Na reunião na casa de Renan, a cúpula pemedebista avaliou que isolar Lula, neste momento, só fortalece PSDB e PFL. Com o PT passando por grandes dificuldades, uma oposição ferrenha do outro lado e PTB, PL e PP desconstruídos, o risco é o de não deixar alternativas para o presidente a não ser investir contra o Congresso, o que Lula, por sinal, já ensaiou em discurso, semana passada, em Luiziânia (GO). "Governabilidade não é mercadoria que se compra em qualquer escambo. A ingovernabilidade prejudica a economia. Independente de a qual partido pertencemos, é fundamental preservarmos a governabilidade", disse Renan Calheiros ."Nessas horas não temos que pensar em interesses individuais. Se qualquer partido pudesse substituir o PMDB nesse pacto de governabilidade, seria muito bom. Mas não pode. É uma convocação pela responsabilidade. O relevante é não ter uma crise existencial (do PMDB) neste momento". Na avaliação dos governistas, apoiando o presidente o partido ganha tempo para decidir sua sorte em 2006: ou fica com Lula, na hipótese de o presidente se recuperar e se apresentar forte para a reeleição, ou tem candidato próprio que, em eventual segundo turno, pode vir a ter o apoio dos eleitores petistas, que não votariam num candidato tucano. Além disso, com quatro ministérios os governistas acreditam que podem diminuir a resistência dos governadores e ganhar mais adiante o comando do partido. O deputado Jader Barbalho (PA) defendeu que a opinião pública não entenderia uma atitude do PMDB que, quando Lula estava forte, entrou no governo, e agora, com o presidente e o PT fragilizados, se recusava a ajudar. "O que não podemos é utilizar o discurso das más companhias", ironizou. O presidente Lula vai aceitar o PMDB, chegue como chegar. Neste momento, avalia que não pode contar - seja para que finalidade for - com os presidentes dos partidos envolvidos nos escândalos de corrupção em apuração, tanto do PP, Pedro Corrêa (PE), como do PL, Valdemar da Costa Neto (SP), do PTB, Roberto Jefferson (RJ), e do próprio PT, José Genoíno (SP). Embora sejam todos da base do governo, estão inteiramente voltados para os próprios problemas. Com o PSB, o presidente ainda mantém um bom diálogo, mas seu presidente, Miguel Arraes, está afastado por doença. Restou-lhe o PMDB. Foi, também, contra a turma de áulicos mais próximos (como o ministro Luiz Gushiken), partidários do isolamento do presidente "que não precisa se expor porque teve 52 milhões de votos", que, há mais ou menos duas semanas, Lula se convenceu que deveria conversar com o PMDB. Não teria todos os votos no Congresso, mas passaria a contar com um partido estruturado. Além disso, aceitar parte do partido seria mais racional que perder o PMDB para a oposição, o que só aumentando o isolamento do presidente. (Colaboraram Daniel Rittner e Rosângela Bittar)