Título: Novo teto para a construção
Autor: Felipe Frisch
Fonte: Valor Econômico, 29/06/2005, Eu & Investimentos, p. D1

"MP do Bem" estimula mercado imobiliário como forma de aplicação financeira que pode ser renovada a cada cinco anos e evita a perda de dinheiro com o efeito da correção da inflação no preço dos imóveis

A"MP do Bem" - como vem sendo chamada a Medida Provisória nº 252, que, entre outras coisas, eliminou o imposto de renda sobre o ganho de capital na troca de imóveis por pessoas físicas - pode ser um estímulo para quem vê o mercado imobiliário como uma fonte para os seus rendimentos. A mudança pode ser a oportunidade que faltava para quem possui um imóvel e quer trocar por um mais novo ou com maior potencial de valorização no curto e no médio prazo, dizem os especialistas. Apesar de o benefício só poder ser usado uma vez a cada cinco anos - o que evita o uso para especulação - e para um imóvel vendido por até R$ 440 mil, permitirá ao contribuinte não pagar IR sobre a diferença entre os preços de compra e venda, que muitas vezes é simples ajuste à inflação. Portanto, mesmo a desejada casa própria, o único imóvel, pode servir como investimento. Ou como forma de proteção do patrimônio financeiro. "A medida estimula a troca de uma 'posição' velha por uma nova", avalia o presidente do sindicato da habitação de São Paulo (Secovi-SP), Romeu Chap Chap, usando jargões tradicionais no mercado financeiro e também no mobiliário. Ele lembra que imóveis novos costumam ter uma forte valorização, de 10% a 20% além da inflação nos primeiros cinco anos. Depois disso, as valorizações tendem a ser mais modestas, dependendo do ponto e da qualidade do produto. Normalmente, as pessoas não levam em conta a valorização do próprio bem quando pensam em investir em imóveis, mas consideram apenas o valor do aluguel, critica Chap Chap. "E se, além disso, o investidor consegue uma locação que dê de 10% a 12% do valor do produto imobiliário ao ano, tem um ganho de capital maior do que em muitos investimentos", diz. O executivo vai ainda mais longe. Ele avalia que, como o benefício se renova a cada cinco anos, o investidor pode vender a casa ou o apartamento que já tiveram sua valorização inicial para comprar um imóvel mais novo a cada período. "E o comprador não é obrigado a morar lá", diz. Com isso, é possível morar num imóvel menor mesmo alugado e manter o rendimento da propriedade. Para ficar isento do imposto de renda na venda do imóvel, o investidor contribuinte tem 180 dias (seis meses) para adquirir um novo imóvel residencial. E, se este for adquirido por um valor inferior ao original, a tributação incidirá normalmente - à alíquota de 15% - sobre o valor da parcela não reaplicada. Outra mudança importante considerada positiva pelos representantes do setor está justamente na base de cálculo deste eventual ganho. A título de imposto de renda, os imóveis passam a ter seus valores corrigidos ao fator de 4,28% ao ano, explica o vice-presidente imobiliário do sindicato da construção civil de São Paulo (Sinduscon-SP), Ely Flavio Wertheim, diretor da construtora Luciano Wertheim Empreendimentos Imobiliários. O percentual está próximo da meta de inflação do Banco Central para 2006, de 4,5%, e é retroativo: vale para a venda do imóvel que foi comprado há até quase dez anos. Ou seja, a partir de janeiro de 1996. Até então, não havia correção prevista em lei para imóveis. Segundo Wertheim, só essa medida já aquece o mercado de imóveis. "Quem comprou há dez anos vai ter um incentivo de negociação e, se a inflação vier abaixo, a vantagem está mais do que garantida", diz. Segundo ele, a MP ajudou os donos de imóveis que estavam indecisos por causa do alto imposto sobre a venda a se decidirem. Uma das primeiras instruções dos especialistas em planejamento tributário - advogados, contadores e economistas - para quem possuía imóveis até então era pedir anualmente a reavaliação do bem, para evitar pagar altos impostos desnecessários na eventual venda futura. Para o diretor da companhia hipotecária Brazilian Mortgages, Fábio Nogueira, apesar do incentivo, as medidas não colocam o Brasil na bolha imobiliária pela qual o mercado avalia que os EUA estão passando. Isso porque as taxas de juros aqui ainda são elevadas, o que ainda desestimula em parte os financiamentos para o setor e para quem compra imóveis. Além de deixar outros investimentos de renda fixa mais atraentes. "O Brasil pode ser afetado porque vai faltar dinheiro para imóveis no mundo todo, mas aqui não vai haver perda de valor, como se espera lá", diz. O motivo, segundo ele, é o fato de que - justamente por conta do risco atribuído ao país - há mais capital envolvido na construção civil. Diferente dos EUA, onde o setor vive alavancado, ou seja, mais dependente de terceiros. Outro benefício trazido pela MP, segundo Fábio Nogueira, é o afastamento do "risco Encol" com a definição do "patrimônio de afetação": qualquer empreendimento comprado na planta está separado do risco da incorporadora, o que acaba também barateando o crédito. Ele avalia que as mudanças fazem parte de uma série de alterações que o país vem implementando desde 1994, com a criação dos fundos imobiliários, seguida pela criação do Sistema Financeiro Imobiliário em 1997 e depois pela Cédula de Crédito Imobiliário, pela isenção fiscal nos Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) a partir do ano passado. É justamente de incentivos que carece cada vez mais um setor, o de fundos imobiliários, na opinião do consultor de investimentos Sérgio Belleza Filho, da corretora Coinvalores. Segundo ele, com os benefícios fiscais dados à compra e venda física de imóveis, os fundos ficam ainda mais distantes de ser uma opção de aplicação para os pequenos investidores, com um IR de 20% sobre os ganhos. "É pior do que a renda fixa em alguns casos" , critica. Desde o início desse ano, os fundos tradicionais de renda fixa podem pagar imposto de renda de até 15% se o investidor permanecer mais de dois anos num fundo com títulos também de longo prazo. E a renda variável, a bolsa, paga sempre 15%. "Como pode ser considerado um investimento de renda variável se, na hora da tributação, fica junto com a renda fixa e paga até mais do que ela?", ele questiona.