Título: Pão de Açúcar: como ficam os minoritários?
Autor: Juliana Martines
Fonte: Valor Econômico, 30/06/2005, Legislação & Tributos, p. E2

"Apesar do pequeno número de acionistas da CBD beneficiados com a orientação da CVM, o tag along somente se aplica às ações ordinárias"

O ofício publicado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em 14 de junho de 2005 é muito claro: o acordo celebrado entre o empresário Abílio Diniz, do Grupo Pão de Açúcar, e a empresa Casino Guichard Perrachon, na data de 3 de maio de 2005, enseja o tag along. O tag along, reinstituído na Lei das Sociedades por Ações - a Lei das S.A. - em 2001, assegura aos acionistas minoritários detentores de ações com direito a voto a extensão das condições oferecidas aos acionistas controladores, no caso de venda do bloco majoritário da companhia. Assim, o artigo 254-A da Lei das S.A. determina que, em caso de alienação do controle de uma companhia aberta, o adquirente das respectivas ações deverá estender a sua oferta aos minoritários, de modo a lhes garantir um preço de, no mínimo, 80% do valor pago pelas ações do antigo acionista controlador ("A alienação, direta ou indireta, do controle de companhia aberta somente poderá ser contratada sob a condição, suspensiva ou resolutiva, de que o adquirente se obrigue a fazer oferta pública de aquisição das ações com direito a voto de propriedade dos demais acionistas da companhia, de modo a lhes assegurar o preço no mínimo igual a 80% do valor pago por ação com direito a voto, integrante do bloco de controle"). Logo após a divulgação do acordo de associação entre Abílio Diniz e a empresa Casino, a CVM, atuando como autarquia fiscalizadora do mercado de capitais, levantou a hipótese de incidência do mecanismo do tag along. Na ocasião, chegou-se à interessante conclusão de que o acordo, na realidade, não retratava uma continuidade do compartilhamento do controle da Companhia Brasileira de Distribuição (CBD) e sim alienação do referido controle. Segundo a CVM, o acordo assinalado diferia da situação propagada por seus envolvidos, uma vez que desde 1999 a Companhia Brasileira de Distribuição era efetivamente controlada pelo grupo de empresas de Diniz, não se tratando, portanto, da continuação de um controle compartilhado. Na realidade, o controle da Companhia Brasileira de Distribuição - que passou a ser compartilhado mediante a celebração do acordo - será adquirido pela Casino com o exercício de uma opção de compra do controle (prevista no acordo), pelo preço de R$ 1,00. E isso deverá ocorrer em oito anos, após a quitação total do preço pela aquisição. Assim sendo, o evidente desequilíbrio entre causa e conseqüência - ou seja, entre a futura transferência do controle da Companhia Brasileira de Distribuição pelo insignificante valor - fez a CVM concluir que o prêmio pela outorga da opção de compra do controle já estaria embutido no valor recebido por Abílio Diniz quando da celebração do acordo.

O tag along assegura aos minoritários com direito a voto a extensão das condições oferecidas aos controladores

Partindo-se desse pressuposto, a CVM, com o intuito de resguardar os direitos dos acionistas minoritários da Companhia Brasileira de Distribuição, e respaldando-se no artigo 29 da Instrução Normativa nº 361/02 ("A OPA por alienação de controle de companhia aberta será obrigatória, na forma do artigo 254-A da Lei nº 6.404/76, sempre que houver alienação, de forma direta ou indireta, do controle de companhia aberta, e terá por objeto todas as ações de emissão da companhia às quais seja atribuído o pleno e permanente direito de voto, por disposição legal ou estatutária"), entendeu que seria obrigatória a realização da oferta pública de ações por alienação de controle, o tag along. Sem entrar no mérito da questão, é certo que, apesar do pequeno número de acionistas da Companhia Brasileira de Distribuição beneficiados com a orientação da CVM, o tag along somente se aplica às ações ordinárias, que, no caso da companhia, correspondem apenas a 0,05% de todo o capital. O mercado reagiu positivamente à decisão. Isso porque os operadores do mercado financeiro tinham receio de que, em razão do suave impacto financeiro a ser trazido pelo tag along, a CVM ficasse inerte, o que abriria um sério precedente, trazendo riscos às futuras trocas de controle que pudessem desrespeitar os direitos de acionistas minoritários das empresas. Ainda, como não poderia deixar de ser, houve um significativo aumento na procura dos títulos beneficiados com a decisão, resultando na valorização das ações ordinárias da Companhia Brasileira de Distribuição em aproximadamente 18%, após terem ficado quase três anos no esquecimento. Em que pese a concordância do mercado e o fato de que, teoricamente, o grupo Casino não teria de desembolsar tanto capital para a realização do tag along - pois, como dito, as ações beneficiadas são ínfimas - provavelmente este será o primeiro capítulo da história, uma vez que a Companhia Brasileira de Distribuição certamente recorrerá dessa decisão.