Título: Indústria torce por renda e queda de juros
Autor: Sergio Lamucci
Fonte: Valor Econômico, 01/07/2005, Especial, p. A14

Conjuntura Cenário benigno para o resto do ano também depende de economia isolada da crise política

O desempenho da economia no primeiro semestre decepcionou a maior parte das entidades empresariais, que esperam um resultado melhor na segunda metade do ano. A recuperação do ritmo da atividade tem três pressupostos: a taxa de juros cai logo, a renda cresce e a crise política não contamina a economia. Mesmo nesse cenário benigno, o câmbio valorizado continuará a causar desconforto em alguns setores, como os de máquinas e equipamentos e plásticos, apesar de ainda não ter impedido um aumento robusto das exportações brasileiras. O setor de embalagens é um dos que revisaram para baixo as perspectivas para o ano devido ao desempenho do primeiro semestre. O presidente da Abre (que reúne as empresas do setor), Fábio Mestriner, projetava uma expansão da produção de 4% a 4,5% em 2005 e agora estima um número entre 3% a 3,5%. O total do semestre deve ficar perto dos 2,3% de alta acumulada até abril, diz ele, que aposta em recuperação. Mestriner diz que tradicionalmente o segundo semestre é melhor para o setor de embalagens, acrescentando que a expectativa de queda dos juros e de recuperação mais forte da renda deve ajudar. Como 60% das vendas do segmento vão para a indústria de alimentos e bebidas, o comportamento da renda é essencial para o setor de embalagens, afirma. A indústria química também acredita em melhora do desempenho a partir de julho, após um segundo trimestre muito ruim, conforme o vice-presidente da Abiquim, Guilherme Duque Estrada. O maior problema foi o mercado interno. Em maio, o volume de vendas domésticas caiu 0,6% em relação ao abril, quando já havia se retraído 9,12% ante março. Segundo Duque Estrada, o que tem garantido um desempenho melhor para o setor são as exportações. De janeiro a maio, elas cresceram 39,5% em relação ao mesmo período de 2004. Com a queda do dólar, os custos do setor caíram para boa parte das empresas. Para o segundo semestre, a expectativa é de otimismo cauteloso, pois um ambiente de queda dos juros e recuperação da renda traz melhora do desempenho dos outros segmentos da indústria. No setor de aço, o cenário é nebuloso. Carlos Loureiro, presidente da distribuidora de aços planos Rio Negro, diz que em junho a distribuição poderá cair até 5%. Ele ainda não tem os dados fechados do semestre, mas afirma que está preocupado com o fato de que seus clientes já estão com níveis de estoque normais e seguem comprando menos. "Antes, vendíamos menos porque estavamos estocados. Agora, a distribuição cai, pois a produção está em patamares mais baixos", explica. Segundo Loureiro, apenas o setor automobilístico tem apresentado bom desempenho. Ele não espera uma mudança nesse quadro a partir do segundo semestre. "O câmbio e os juros continuam como variáveis perturbadoras", diz. Para o executivo, o setor do aço vai contribuir negativamente para o crescimento econômico do país neste ano. "O volume vai cair, só não sabemos ainda qual será a magnitude da queda", completa. Há quem seja mais pessimista quanto ao desempenho da economia nos próximos meses. É o caso do setor de máquinas e equipamentos, com aumento de 33% nas vendas de janeiro a maio em relação ao mesmo período do ano passado. O resultado, porém, foi muito desigual entre os diversos subsetores, afirma o presidente da Abimaq, Newton de Melo. Enquanto o segmento de mecânica pesada teve aumento de 170% nas vendas, o de máquinas agrícolas registrou queda de 27%, e o de equipamentos petroquímicos, de 12%. Melo acredita que o setor deve terminar o ano com um crescimento bem menor que os 33% registrados de janeiro a maio, considerando possível algo como 10% a 15%. Ele reclama principalmente do câmbio valorizado e dos reflexos, no setor, do ano ruim para a agricultura. Nesse cenário, o segmento reduziu de 230 mil para 212 mil o número de empregados. A indústria de plásticos também teve um primeiro semestre ruim, de acordo com Mehreg Cachum, presidente da Abiplast. Ele avalia que a previsão de crescimento de 8% da produção neste ano não deverá ser concretizada e também culpa o nível dos juros e do câmbio. Para piorar, diz ele, a crise política também torna o cenário complicado, dificultando novas decisões de investimento. Na Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia) a expectativa é de que a produção no primeiro semestre deste ano oscile na casa dos 5%. Até maio, os dados apontam avanço de 5,7%. No entanto, a projeção de Denis Ribeiro, diretor-econômico, é de que o setor cresça 4,5% no ano. Isso significa que no segundo semestre a produção vai perder força, movimento que também reflete uma base de comparação mais forte. Já as vendas reais da indústria de alimentos ficaram 2,29% maiores entre janeiro e maio deste ano. O diretor explica que elas têm evoluído abaixo da produção devido à redução da margem de lucro. Para os próximos meses, no entanto, ele acredita que o cenário melhore. (Colaborou Raquel Salgado)