Título: Rabinovich chegou a negociar com Gerdau
Autor: Ivo Ribeiro e Raquel Balarin
Fonte: Valor Econômico, 01/07/2005, Empresas, p. B8
Siderurgia Benjamin Steinbruch foi obrigado a agir rápido para não dividir a CSN com o grupo concorrente
A partir de hoje, Benjamin Steinbruch traça uma nova trajetória em sua carreira de empresário. Passa a controlar, com seus dois irmãos e três primos, um império de empresas que fazem de aço a tecidos e latas, gera energia, opera ferrovias e porto e tem até banco. Mas isso não foi nada fácil para Steinbruch, conhecido entre seus pares da indústria como um homem que joga duro nos negócios para alcançar seus objetivos. Há cerca de seis meses Steinbruch se viu pressionado pela decisão de saída do sócio Jacks Rabinovich da parceria que as duas famílias mantinham desde os anos 40 no grupo Vicunha. Jacks, depois de contratar bancos e consultorias para avaliar sua parte e buscar compradores, levou uma proposta na casa de US$ 800 milhões. Ninguém menos que Jorge Gerdau Johannpeter, dono e presidente do grupo que mais aquisições tem feito nos últimos anos, estava do outro lado, ávido por ficar com uma expressiva fatia da CSN, a jóia da coroa do Vicunha. O grupo Gerdau foi assessorado pelo JP Morgan. O interesse, segundo fontes do setor financeiro que acompanharam de perto as negociações, não parou por aí. A Usiminas, controlada por Nippon Steel, Votorantim, Camargo Corrêa e clube dos funcionários, também teria preparado sua proposta. Gerdau e Usiminas, procuradas, não quiseram se pronunciar. A decisão de Jacks, aos 75 anos, um apreciador de pescarias em alto mar em seu confortável barco, foi tomada por volta de maio do ano passado. Contratou o banco Goldman Sachs para fazer a avaliação das participações dele e da irmã Clotilde (falecida em 2004) nas holdings Vicunha Steel, controladora de CSN, e Textília, dona da Vicunha Têxtil, os dois principais negócios do grupo fundado por ele e por Mendel, pai de Benjamin. Por ter o direito de preferência no negócio, Steinbruch montou uma operação de guerra desde o fim do ano passado, quando chegou a proposta da concorrência à sua mesa, para criar uma fórmula que lhe permitisse assumir as ações dos Rabinovich. O principal empecilho eram as amarras ao empréstimo monstro (R$ 1,9 bilhão), feito em 2001 e que ainda tinha com o BNDES para comprar as partes de Bradespar e Previ na CSN. O banco Pactual foi contratado para liderar uma engenharia financeira que permitisse quitar antecipadamente a dívida com o BNDES. Devido a prazos contratuais, Pactual, Itaú-BBA e Unibanco concederam um empréstimo-ponte à Vicunha no último dia 15 de cerca de R$ 1 bilhão. Os recursos, somados aos R$ 1 bilhão de dividendos pagos pela CSN referentes ao gordo lucro de 2004, permitiram a liquidação do financiamento do BNDES. Uma emissão de R$ 1,2 bilhão em debêntures, fechada ontem, será utilizada para quitar o empréstimo-ponte. Sai a dívida com o BNDES, entra a dívida com os Rabinovich. Embora a estimativa fosse de que o valor das ações dos Rabinovich alcançasse R$ 1,3 bilhão, elas foram negociadas por mais. Com uma proposta dos Gerdau na mão, Jacks conseguiu que os Steinbruch aceitassem pagar cerca de R$ 1,7 bilhão por sua participação, segundo o Valor apurou. Os Rabinovich financiaram a transação, com garantia de ações da CSN, em cinco parcelas anuais, de 2006 a 2010. Procurado, Jacks preferiu não comentar o acordo. Segundo informações no mercado financeiro, ele foi também assessorado na transação pela consultoria Focus Desenvolvimento Empresarial, especializada em fusões e aquisições. Os três sócios da Focus evitaram se pronunciar. Steinbruch estava ansioso na última segunda-feira com os arremates finais da operação. "Dedicamos todo o primeiro semestre a definir a compra das ações do Jacks. Depois disso vou poder trabalhar a nova estratégia da Vicunha." O empresário relatou ao Valor que a idéia é não ficar amarrado às cláusulas impeditivas da emissão de debêntures para realizar vôos mais ousados nas empresas. "Em dois anos, quero antecipar o pagamento das debêntures". Para isso, ele vai contar com uma forte geração de dividendos da CSN. O desaquecimento do mercado do aço não deve ser problema, a seu ver. "A média dos preços do aço neste ano está mais elevada que a do ano passado", explica Steinbruch. Isso sinaliza que a empresa, um dos mais baixos custos mundiais do setor, poderá exibir um extraordinário lucro e um pagamento de dividendos gordo. A distribuição feita dia 14 de junho, referente a 2004, beirou R$ 2,3 bilhões (o Vicunha detinha 46,8% do capital da CSN até 30 de abril; depois disso, com acertos com o BNDES, a participação baixou para 40,5%). Outra aposta do mercado é de que a quitação da dívida com o BNDES deixará a CSN mais livre para tocar alguns projetos e para melhorar seu posicionamento no mercado de capitais. "A empresa tem dois negócios que estão sub-avaliados. Um é a área de logística. Outro, a mina de Casa de Pedra", afirma Marcelo Aguiar, analista da Merrill Lynch. Segundo ele, o valor da ALL tem sido entre 7 e 8 vezes sua geração de caixa. Da Vale, acima de 8 vezes. "Da CSN, é de 4,4 vezes, embora o potencial seja maior", explica. Para Aguiar, uma maneira de aumentar o valor seria, por exemplo, separar a área de logística e abrir o capital da MRS. Steinbruch fez questão de realçar que seu projeto é crescer ainda mais, e não vender a CSN ou sua preciosa mina de mina de ferro, como ainda é a aposta de muitas pessoas no setor empresarial. "Não queremos vender a mina". Casa de Pedra é hoje alvo de uma acirrada disputa entre a CSN e a Vale do Rio Doce. Em 2001, o acordo de descruzamento das ações das duas companhias garantiu à Vale o direito de preferência sobre o minério excedente às necessidades da CSN. O direito está em análise nos órgãos de defesa da concorrência. Finalizada a separação com os Rabinovich, Steinbruch pretende partir para a organização do Vicunha em áreas de negócios - aço (CSN), minério de ferro, logística, têxtil (Vicunha Têxtil) e cimento (em fase de montagem), segundo informou o empresário no programa "Roda Viva", da TV Cultura, na segunda-feira. O Banco Fibra, que era um negócio isolado dos Steinbruch e que está hoje sob o comando de Ricardo, irmão de Benjamin, passará a fazer parte da nova holding. Curiosamente, a estratégia de diversificação dos negócios do grupo, que nasceu têxtil, é a mesma que Benjamin tentou empreender na Vale do Rio Doce quando foi presidente da mineradora. "Vou passar para meus filhos a CSN numa condição bem melhor do que quando a compramos", afirmou, destacando que quer dar a eles algo para trabalhar e não apenas dinheiro em espécie. "Meu pai fez isso comigo", acrescentou. Steinbruch, casado com Carolina, tem quatro filhos. E sua aposta é de que Vitória, hoje com 14 anos, é a que tem mais jeito para os negócios. Foi ela quem Benjamin levou recentemente a um encontro entre os principais empresários da América Latina e seus herdeiros. Benjamin é agora o homem que dá as cartas no grupo Vicunha. Mas não é o controlador. Com o acordo com os Rabinovich, Dorothéa, mãe de Elizabeth, Ricardo e Benjamin, passa a deter 60% do grupo. Eliezer, irmão de Mendel, e pai de três filhos, tem outros 40%. Uma fonte próxima à família acredita que os planos de Benjamin passam pela aquisição das partes dos primos, no futuro.