Título: Brasil quer aval para retaliar americanos
Autor: Assis Moreira, Tatiana Bautzer e Cibelle Bouças
Fonte: Valor Econômico, 01/07/2005, Agronegócios, p. B13

Comércio Isso porque EUA ainda não implementaram as medidas definidas pela OMC no processo do algodão

Para preservar seus direitos, o Brasil deverá pedir na próxima terça-feira, na Organização Mundial do Comércio (OMC), autorização para retaliar os Estados Unidos por conta da disputa do algodão. Durante a disputa na OMC, o Brasil alegou que os seus produtores perderam receita de US$ 478 milhões entre 1999 e 2002 devido à queda nos preços internacionais do produto provocada pelos subsídios concedidos por Washington. Essa cifra envolveria todos os subsídios e não apenas os destinados à exportação, que deveriam ser eliminados nesta sexta-feira e serão alvos da ação brasileira. Os brasileiros dizem que não há cifra definida. "Tudo que está sendo dito sobre montante eu nunca vi", disse Roberto Azevedo, chefe de contenciosos do Itamaraty. Negociadores brasileiros disseram ontem (dia 30) que tampouco havia definição sobre os rumos das tentativas de entendimento com a administração Bush sobre como agir após a demanda na OMC. A demanda de retaliação ocorre porque Brasília esperava que Washington anunciasse alguma medida para eliminar ou reduzir os subsídios do algodão. Pelas regras da OMC, o Brasil tem 15 dias para pedir a retaliação e precisa apresentar a demanda dez dias antes de uma reunião do Órgão de Solução de Controvérsias; portanto, no próximo dia 5. Ate o fechamento desta edição, o United States Trade Representative (USTR) e o Departamento de Agricultura não haviam anunciado a solução que será proposta ao Congresso para cumprir a resolução do painel da OMC sobre açúcar, apesar da expectativa ao longo do dia sobre o assunto. Um dos problemas para o anúncio é a polêmica discussão sobre o acordo de livre comércio com a América Central (Cafta). A discussão começou ontem no Senado. Senadores de oposição e republicanos de Estados produtores de açúcar criticaram duramente o acordo, assinado há mais de um ano. A briga para aprovar o Cafta mobilizou o USTR e o governo dos EUA queria evitar comprar a briga com mais um lobby agrícola antes de garantir a vitória sobre outro (açúcar, afetado por um pequeno aumento no volume de importações acertado no Cafta). Segundo fontes diplomáticas em Washington, se o Brasil adotar retaliação comercial pelo não cumprimento da decisão do painel da OMC, os EUA não podem revidar com medidas retaliatórias. De qualquer forma, uma retaliação não provoca pressão sobre os EUA - hoje o Brasil tem superávit comercial. O mais provável é que sejam afetados produtos hoje importados dos EUA por áreas não-agrícolas. No Brasil, representantes dos produtores de algodão que estiveram reunidos em um seminário em São Paulo ainda aguardavam a resposta americana para o caso. Jorge Maeda, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), preferiu não falar em retaliação antes do prazo final para os EUA apresentarem seu pacote de medidas. "O Roberto Azevedo [do Itamaraty] está discutindo um acordo com o governo americano e espero que ele faça uma declaração até sexta", afirma Maeda. O executivo afirma que espera dos Estados Unidos mudanças no programa "Step 2", que paga a diferença entre o preço interno mais alto e cotação mais baixa do mercado internacional. Para Marcos Sawaya Jank, presidente do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), o mais provável é que o governo americano proponha uma solução parcial nos programa de crédito à exportação (GSM 102/103 e SCGP), mas não altere o "Step 2". "Eles devem propor mudanças, porque a imagem dos EUA vai ficar muito arranhada se eles se negarem a fazer alterações, mas tenho dúvidas se irão implementar medidas no curto prazo". Ele observou que o pacote americano passará pelo congresso e o mais provável é que "empurre" a decisão para 2007, quando os EUA terão de reformular a legislação agrícola ("Farm Bill"). Para Jank, o Brasil deve pedir a retaliação caso os EUA se neguem a fazer as mudanças definidas pela OMC. "O Brasil não pode baixar a guarda. Todos esses contenciosos produziram resultados que melhoraram a imagem externa do Brasil. O país precisa usar os resultados desses contenciosos como base para avançar nas negociações internacionais", afirmou Jank. Segundo a Abrapa, se os EUA de fato retirarem os subsídios ao algodão, o Brasil poderá dobrar as suas exportações, para volume entre 2,3 milhões e 2,4 milhões de toneladas até 2010, tornando-se o maior exportador mundial. da pluma. Na safra 2004/05, o país produz 1,15 milhão de toneladas e exportar entre 350 mil e 400 mil toneladas de algodão. Maeda observou, no entanto, que mesmo com o fim dos subsídios, dos EUA, o país ainda precisará resolver problemas de logística, carga-tributária e infra-estrutura para se tornar competitivo no mercado.