Título: A virada das aplicações
Autor: Felipe Frisch e Angelo Pavini
Fonte: Valor Econômico, 01/07/2005, Eu & Investimento, p. D1

Depois de um primeiro semestre ruim para a renda variável - bolsa e dólar - e excelente para quem apostou na taxa de juros, a dúvida dos investidores é com relação ao cenário para a metade restante do ano. Mesmo que os juros Selic caiam e a bolsa se recupere, gestores avaliam que vai ser complicado alguma aplicação bater no ano a remuneração dos tradicionais fundos DI, que acompanham a taxa das operações entre bancos, o CDI. Para o mercado de ações, os especialistas acreditam que as oportunidades vão estar em setores como de mineração e petroquímico. Já o dólar, a R$ 2,334 no fim de junho, é considerado ainda uma forma de proteção e de diversificação de risco. Para confirmar as projeções do mercado, de R$ 2,65 no final do ano, o dólar precisaria subir 13,54% até dezembro. No primeiro semestre, a liderança em rentabilidade foi dos certificados de depósito bancário (CDBs), com variação acumulada de 8,99%. O problema é que, na prática, o investidor comum e com poucos recursos não consegue esta taxa, reservada aos grandes aplicadores. Há ainda o inclui o imposto de renda, que, para o caso de uma aplicação de renda fixa de seis meses seria de 22,5% sobre o rendimento, o que resultaria numa rentabilidade líquida de 6,97% para os CDBs. Já os fundos DI acumulam valorização de 8,74%, ou 6,77% descontado o IR. O Ibovespa amarga uma perda acumulada de 4,37% no semestre. Acompanhando a variação, os fundos de quem aplicou o fundo de garantia (FGTS) em ações da Companhia Vale do Rio Doce acumulam prejuízo de 8,61%, enquanto os da Petrobras sobem 17,66%, revelando-se a melhor aplicação do ano até agora. O dólar comercial quase lidera as perdas, com desvalorização acumulada de 12,06% (ver tabela). A surpresa ficou por conta do ouro: apesar das perdas de 11,73% no semestre, no mês passado o metal teve valorização de 1,53%, entre os melhores investimentos de junho. A valorização é explicada pelas altas do petróleo, que fazem o investidor correr para o metal, diz o consultor Fábio Colombo. "Tanto ouro quanto fundos cambiais são indicados para os mais conservadores", diz ele, que recomenda 7% da carteira no metal e 10% em fundos cambiais para esse público. Na avaliação dele, o segundo semestre ainda vai ser conturbado, favorecendo as aplicações em juros. "Mesmo que as taxas caiam, o nível ainda vai estar alto", diz. Mesmo a decisão do governo de recompor suas reservas cambiais não deve abalar o interesse de controlar a inflação. Portanto, o impacto das eventuais compras de dólar na cotação não será sentida a ponto de aumentar os preços e compensar o uso da moeda americana como investimento. "E o dólar subir é ruim para o investidor estrangeiro que está aqui de olho no curto prazo." Sobre os CDBs, Colombo critica o que ele chama de concentração do risco de crédito. Ele explica que a melhora das taxas se deve justamente à necessidade das instituições de captar recursos no mercado para emprestar aos seus clientes na outra ponta. Apesar de concordar que o balanço do ano já está dado, com a liderança da taxa de juros, o diretor de renda fixa da Bradesco Asset Management (Bram), Carlos Otero, acha que só o movimento de redução dos juros já serviria de sinalização positiva para a bolsa. "É viável dólar e bolsa subirem ao mesmo tempo", afirma Paulo de Sá Pereira, estrategista-chefe da SulAmérica Investimentos. Ele mantém sua projeção do início do ano de Ibovespa aos 28.500 pontos em dezembro. O que pode significar uma boa valorização, de 13,77%. Dos setores com ações em bolsa, ele destaca o desempenho das de petróleo - a Petrobras, basicamente, por causa do aumento da produção e dos preços internacionais - e de mineração, que em breve, segundo ele, deve começar a caminhar independente do setor siderúrgico. Para ele, a queda dos juros aqui deve começar já em setembro ou outubro. Na avaliação de Sá Pereira, o dólar deve subir pouco - ele previa a R$ 2,70 para dezembro e está revisando para baixo - até o fim do ano, por conta da queda dos juros. Para Eduardo Castro, superintendente de renda fixa do ABN Amro Asset Management, pode ser a hora de entrar nos fundos ou títulos prefixados. Uma escolha ainda polêmica é a respeito das carteiras que acompanham o indicador de inflação IGP-M, puxado para baixo pela queda dos preços do atacado. "Não é ainda uma boa pedida porque a inflação tende a cair e os juros também." No segundo semestre, a principal variável para definir a tendência do mercado acionário brasileiro deve ser o juro doméstico, diz Pedro Martins Junior, estrategista chefe para América Latina da gigante de investimentos americana Merrill Lynch. "Quando o mercado ganhar confiança na visão de que o juro local vai cair, a bolsa anda", diz. Para isso, há dois fatores a serem monitorados de perto: indicadores de inflação declinante ou baixa; e dados de atividade econômica aquém do esperado. "O mercado não vai esperar, vai antecipar a queda dos juros", diz. Para a Merrill, a expectativa é de que a redução da taxa Selic comece em agosto, fechando o ano em 17,75%, dois pontos percentuais abaixo dos 19,75% atuais. Agosto é também um mês decisivo para o cenário externo, diz Martins. O motivo é a expectativa da Merrill Lynch e de parte do mercado de que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) interrompa a trajetória de alta dos juros nos Estados Unidos, em 3,5% ao ano. Essa interrupção reduziria o risco de explosão da bolha no mercado de imóveis americanos, sustentada pelos refinanciamentos a juros baixos dos últimos anos. A explosão da bolha afetaria a economia americana e levaria a um risco para os mercados globais. O desaquecimento global mais acelerado é um dos riscos para o mercado brasileiro, alerta Martins, pois pode reduzir os preços das commodities e afetar empresas importantes como Petrobras, Vale do Rio Doce, e setores como siderurgia e papel e celulose. Já o principal risco domestico é uma trajetória de queda de juros muito mais con- servadora, por percalços no controle da inflação ou por decisão do próprio BC. A avaliação de Martins é, porém, de um cenário benigno para a economia mundial e para o Brasil. O Fed poderia começar a cortar os juros americanos no segundo semestre de 2006 e a taxa terminaria o ano em 3% ao ano, acompanhando um leve desaquecimento da economia dos EUA. Isso manteria condições de liquidez global favoráveis para investidores tomarem mais risco, tanto em renda fixa quanto variável. "Além disso, não detectamos nenhum país emergente em situação delicada que possa preocupar os investidores", diz. Martins trabalha com um Ibovespa próximo de 32.000 pontos em 12 meses. Entre as recomendações da Merrill Lynch estão Petrobras, Vale do Rio Doce, Pão de Açúcar, Unibanco, Telemar ON, CPFL e Aracruz.