Título: Cristovam diz que saída para Lula é desistir da reeleição
Autor: Raymundo Costa e César Felício
Fonte: Valor Econômico, 04/07/2005, Políticos, p. A7

Crise Aval deve afastar Delúbio da Executiva e coloca permanência de Genoino na presidência em cheque

O presidente do PT, José Genoino Neto, joga seu destino à frente do comando da sigla na reunião da Executiva Nacional do partido, convocada para amanhã. Pressionado para renunciar em função de ter sido avalista solidário em um empréstimo do BMG para o partido, junto com o publicitário Marcos Valério de Souza, Genoino tentará articular a sua manutenção como dirigente e candidato à reeleição no processo de eleição interna da sigla, em setembro.Marcos Valério é apontado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) como o operador do esquema de "mensalão" na Câmara dos Deputados. A crise leva para dentro do PT, pela primeira vez , a discussão de um acordo que envolva a desistência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de se reeleger no próximo ano, uma hipótese já colocada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em recente entrevista. "Acho que não concorrer à reeleição pode ser a saída para o PT e para Lula", disse o senador Cristovam Buarque (PT-DF), detalhando a proposta. "O Lula mandaria uma emenda constitucional ampliando o mandato para cinco anos para os eleitos em 2006, terminando com o direito de se reeleger. E ao mesmo tempo faria o anúncio de que não concorrerá no próximo ano, com o apoio do PSDB para uma agenda de propostas do interesse do País". Segundo o senador brasiliense, que foi ministro da Educação e terminou demitido na primeira reforma ministerial de Lula, este gesto do presidente teria como efeito o esvaziamento da crise. " Esta atitude tira a disputa pelo poder do centro da CPI", argumenta. Cristovam Buarque sugere que o candidato do PT à presidente poderia ser então escolhido em um sistema de prévias, eventualmente, com a participação de presidenciáveis de outros partidos governistas. Em relação à CPI propriamente dita, Buarque é contra qualquer acerto com o PSDB em torno de uma lista de cassações dos envolvidos no "mensalão". "Esta discussão com a CPI em seus primeiros dias é absurda e não podemos aceitar que o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) tenha o poder de elaborar uma lista de quem fica e de quem não fica", disse. Em seus sucessivos depoimentos e entrevistas, Jefferson já arrolou como envolvidos em esquemas de propina os seguintes deputados: José Dirceu (PT-SP), José Janene (PP-PR), Pedro Corrêa (PP-PE), Pedro Henry (PP-MT), Valdemar Costa Neto (PL-SP), Sandro Mabel (PL-GO), Carlos Rodrigues (PL-RJ), Osmânio Pereira (PTB-MG), Salvador Zimbaldi (PTB-SP) e Luiz Piauhylino (PDT-PE). O único afastamento que já está certo, entretanto, é o do secretário de Finanças do PT, Delúbio Soares, que já decidiu deixar o comando da sigla, após a denúncia publicada na revista "Veja" segundo a qual o PT tomou um empréstimo de R$ 2,4 milhões do BMG com aval de Valério . A decisão de se afastar foi informada por Delúbio em tensa reunião realizada na tarde de sábado, na sede do PT, em São Paulo, da qual participaram também José Genoino, e o secretário-geral Silvio Pereira, que chorou durante a conversa. Também envolvido nas denúncias feitas pelo deputado Roberto Jefferson, mas sem participação no episódio do empréstimo, Pereira ainda analisa a hipótese de se afastar. Genoino disse na reunião que está disposto a ficar e manter sua candidatura à presidência do partido, mas é forte a pressão para que ele também saia. A primeira vice de Genoino é a ex-prefeita de São Paulo, Marta Suplicy, mas o que está sendo no partido e poderá ser sacramentado até mesmo antes na reunião de terça, uma das alternativas em análise é entregar o comando do PT a uma comissão provisória até as eleições internas, prevista para setembro. Também é discutida a hipótese de adiamento da eleição-para a qual estão habilitados a votar 810 mil filiados-para o próximo ano, depois que as CPIs em andamento no Congresso concluírem as investigações. Um dos nomes citado para substituir Genoino na presidência é o do ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini, que deve perder o posto na reforma ministerial. Na reunião na sede do PT, genoino reclamou de Delúbio por não ter sido informado sobre o aval de Marcos Valério no contrato com o BMG. Delúbio respondeu que Genoino lhe perguntara sobre o Banco Rural. O aval, segundo Delúbio, era do conhecimento da direção. O secretário de Finanças reconheceu que cometeu um "erro administrativo" - no sábado, o PT não tinha um registro sobre a parcela de R$ 350 mil paga por Marcos Valério ao BMG. Aliás, o débito com o banco aparece na prestação de contas do PT apresentada do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O presidente Luiz Inácio Lula da Silva , que se reuniu com Genoino por quinze minutos durante uma solenidade em São Paulo na manhã de sábado, avalia que a direção do PT deveria se afastar - até agora o partido não teria feito nada pelo governo. Mas no comando da legenda a sensação é outra: o governo procura se salvar e abandona o PT. A decisão sobre o adiamento das eleições também pode ser tomada no encontro da Executiva, que ocorrerá na véspera do depoimento de Marcos Valério na CPI e um dia depois de uma entrevista sobre toda a crise do partido de Genoino para o programa "Roda Viva", da TV Cultura. Qualquer solução definitiva para o partido, contudo, terá que ser sacramentado pelo órgão máximo de decisão partidária, que é o Diretório Nacional . A Executiva deverá convocar a reunião, provavelmente para o próximo fim de semana. Somente o diretório pode fazer a inclusão de novos nomes na Executiva Nacional da sigla. Em público, os dirigentes envolvidos na questão foram lacônicos. Ainda no sábado, Genoino garantiu que não iria reununciar e disse que de fato assinou o contrato para o empréstimo de R$ 2,4 milhões com o Banco de Minas Gerais (BMG), mas o fez sem discutir o assunto com o tesoureiro do partido, Delúbio Soares. Delúbio se manifestou divulgando, na página do partido na Internet, uma nota à imprensa. " Para a concretização da operação, o banco exigiu avais de terceiros, a começar pelos dirigentes que, no ato, assinavam pelo Partido, Delúbio Soares de Castro e José Genoino Neto. Como nosso patrimônio é notoriamente insuficiente para garantir uma dívida desse valor, o BMG exigiu aval de pessoa com patrimônio compatível, tendo Marcos Valério Fernandes de Souza concordado em nos dar essa garantia", afirma. Delúbio acrescentou que "o PT não conseguiu cumprir a obrigação assumida, tendo 'rolado' a dívida, com pagamentos parciais e prorrogações de vencimento. Em razão de sua responsabilidade como avalista, Marcos Valério Fernandes de Souza realizou esse pagamento ao Banco, ficando credor (...)junto ao PT (...) solicitaremos ao Banco na segunda-feira todos os extratos referentes à operação".