Título: Escritório gaúcho se torna 'inferno dos bancos'
Autor: Marta Watanabe
Fonte: Valor Econômico, 04/07/2005, Políticos, p. A12

Tributação Cláudio Golgo é contratado por municípios para mover ações de cobrança de ISS de leasing

"O inferno dos bancos". É assim que tributaristas de grandes escritórios de advocacia classificam a atuação de Cláudio Golgo Advogados Associados. Sob orientação de uma estratégia que o gaúcho Cláudio Golgo diz ter criado, dezenas de prefeituras estão cobrando o Imposto Sobre Serviços (ISS) que alegam ser devido sobre bens adquiridos por leasing. Na defesa das instituições financeiras, os tributaristas tentam, em idas recorrentes ao Judiciário, muitas vezes em vão, evitar que bancos e empresas de arrendamento sejam obrigadas a efetuar depósitos milionários em ações de cobrança de ISS. A despeito disso, Golgo faz planos de expansão para o escritório. Entre as instituições financeiras que já enfrentaram as cobrança estão Citibank Leasing, Dibens Leasing, Unibanco, Bradesco, Banco General Motors, Banco Bilbao Vizcaya Argentaria, entre dezenas de outras. As ações de execução fiscal nas quais se cobra o ISS sobre leasing são movidas com a assessoria da Cláudio Golgo Advogados principalmente por municípios de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. O escritório, porém, já chegou a municípios paulistas, como Rio Claro, Itapira e Caçapava. Ele chegou a anunciar prestação de serviços a 48 municípios, 25 dos quais com contratos que previam a cobrança de ISS sobre leasing. Pelas contas do próprio Golgo, seu escritório acompanha atualmente 6 mil processos judiciais em andamento, que envolvem R$ 1 bilhão em cobranças de ISS sobre leasing. O escritório já conseguiu R$ 120 milhões em depósitos em juízo e R$ 32 milhões já foram liberados para as prefeituras. Os contratos assinados por Golgo com os municípios prevêem que o escritório ganha honorários de 20% calculados sobre os valores arrecadados pelos municípios. Contratado para assessorar as prefeituras a cobrar o ISS, o escritório Cláudio Golgo orienta os municípios a cobrar o tributo sobre as operações de leasing - principalmente de veículos - nos últimos dez anos. As prefeituras defendem em suas ações de cobrança que o ISS é devido no município em que é entregue o veículo. Os valores tendem a ser altos, porque o imposto é calculado com base no valor de saída do veículo entregue (embora essa conta gere controvérsias). As ações são movidas contra a empresa de leasing ou o banco, nos casos em que a contratação é feita por meio de uma agência bancária ou quando um banco aparece como parte da operação. As prefeituras são orientadas a tratar o ISS como definitivamente devido. Por isso, não autuam as empresas para discutir se a operação de leasing é tributável ou como deve ser tributada. Elas entram diretamente com a execução fiscal, uma ação de cobrança na qual o réu só pode se defender depois de apresentar garantias para a dívida. As prefeituras solicitam o depósito em dinheiro. Os bancos e as empresas de leasing são obrigadas a depositar ou apresentar cartas de fiança quando o município consegue uma liminar. Só no município de Tubarão, interior de Santa Catarina, por exemplo, o Banco General Motors enfrentou duas ações de execução fiscal que somam R$ 1,61 milhão, fora os acréscimos legais cobrados pela prefeitura. No mesmo município, a Dibens foi alvo de ação de execução de R$ 8,8 milhões, sem multa ou juros. Nas três ações o juiz da vara da fazenda pública local, Júlio César Knoll, determinou às instituições financeiras a apresentação de garantias como depósito em dinheiro, fiança bancária ou bens à penhora. Nas três decisões, o juiz ordenou que os réus seguissem, no oferecimento de garantias, a ordem determinada pela normas de execução fiscal. A lei em vigor determina que a penhora ou arresto de bens dê preferência ao dinheiro. Atualmente a lei permite que as prefeituras saquem 70% dos depósitos judiciais que garantem as ações em que são autoras. Isso permite que os municípios tenham acesso aos valores antes do fim do processo de cobrança. O escritório de Cláudio Golgo fica com 20% dos valores que as prefeituras conseguem, a título de honorários. Como os processos judiciais tendem a tramitar por cerca de oito anos, é possível que, no fim do processo judicial, as administrações municipais já tenham mudado. Para as prefeituras, o volume de recursos em jogo é representativo. Em Itajaí (SC), no ano passado, o ISS arrecadado sobre todos os serviços menos leasing chegou a R$ 18,6 milhões. O ISS sobre leasing obtido com base no contrato assinado com o escritório gaúcho, especificamente, rendeu R$ 11 milhões . Contratado por inexigilidade de licitação com base em notória especialização e singularidade, o escritório de Cláudio Golgo tem sido alvo de ações do Ministério Público, principalmente em Santa Catarina, Estado onde o escritório mantém atuação mais forte. Os promotores costumam alegar que o ajuizamento de ações de ISS e seu acompanhamento nos tribunais não demandaria trabalho especializado, realizado por um escritório específico. Para o Ministério Público, a atividade poderia ser feita pela assessoria jurídica ou pela procuradoria da própria prefeitura. Mesmo sendo alvo de ações civis públicas que pedem a suspensão dos contratos, o escritório continua ativo e propicia decisões favoráveis aos municípios que, em alguns casos, defendem a legitimidade das contratações. As instituições financeiras têm ido ao Judiciário para tentar oferecer imóveis em vez de dinheiro nos processos. Nos casos em que o dinheiro é depositado, a disputa é para que os 70% não sejam retirados pelas prefeituras. Os advogados das empresas de leasing e dos bancos alegam que há controvérsias não solucionadas sobre a questão do ISS sobre leasing. Para eles, ainda não há definição do Judiciário sobre vários aspectos, desde a tributação da operação pelo imposto até a discussão sobre como o ISS deve ser calculado e a que prefeitura é devido. Por isso, a retirada dos valores pela prefeitura poderia dar origem a um passivo no futuro, já que, caso percam a disputa, os municípios terão de devolver os valores para as contas sob guarda do Judiciário. Segundo o Ministério Público de Santa Catarina, os 20% em honorários destinados ao escritório Cláudio Golgo representam pagamento definitivo. As ações de execução demandam um verdadeiro vaivém de recursos. Uma ação de cobrança do município de Tubarão contra a Dibens Leasing é exemplar. Nela, o Judiciário determinou depósito em dinheiro. O juiz de Tubarão autorizou a transferência de 70% dos valores à prefeitura. A empresa recorreu ao Tribunal de Justiça catarinense, que suspendeu a autorização de levantamento dos 70%. O caso foi levado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF). Em abril, o STJ julgou um recurso da Dibens, na qual permite ao município o uso dos 70%. Segundo os ministros da primeira turma, o município já criou o fundo de reserva que, teoricamente, garante a restituição integral do dinheiro caso a prefeitura perca a discussão. O STJ também levou em consideração que o próprio tribunal tem decisões favoráveis aos pleitos dos municípios, inclusive com uma súmula, documento que é publicado pelos tribunais superiores nos casos em que a corte já chegou a um consenso sobre determinado assunto. Segundo a súmula, o ISS é devido sobre operações de arrendamento mercantil