Título: Partidos fecham acordo e Congresso cria CPI Mista do Mensalão
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 06/07/2005, Brasil, p. A8

BRASÍLIA - Um novo cenário formou-se ontem ao longo do dia e foi criada, como fruto de amplo acordo político envolvendo todas as legendas no Congresso, a CPI Mista do Mensalão. O foco de investigação serão as denúncias de supostos pagamentos a deputados neste governo (em troca da aprovação de projetos) e no governo passado (para aprovação da emenda constitucional da reeleição, que permitiu ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disputar o segundo mandato). A nova CPI Mista foi criada oficialmente em sessão conjunta do Congresso na noite de ontem, iniciada somente após as 21h. Não está descartada a possibilidade de, numa negociação futura, a CPI Mista do Mensalão ser anexada à CPI Mista dos Correios, já em funcionamento.

A criação da CPI Mista do Mensalão tornou-se inevitável a partir de uma somatória de fatos políticos. Perdeu fôlego a estratégia de aliados do governo de concentrar as investigações do mensalão somente na Câmara, com a CPI da Compra de Votos. Até o PMDB passou a defender oficialmente a CPI Mista no início da noite, após o líder da legenda, José Borba (PR), ter o nome envolvido nas denúncias.

O presidente nacional do PMDB, Michel Temer, ocupou a tribuna à noite e defendeu inclusive a anexação da CPI Mista do Mensalão à CPI dos Correios. " Me soou boa essa proposta " , defendeu Temer (SP). " A anexação da CPI do Mensalão à dos Correios ainda será possível, desde que com a criação de uma sub-relatoria e ampliação do número de membros " , disse o líder do PMDB no Senado, Ney Suassuna (PB).

Um dos autores da CPI Mista do Mensalão, o deputado Raul Jungmann (PPS-PE) comemorou a criação da comissão ontem. Ele reconheceu que a anexação de uma CPI à outra é positiva, mas será um passo futuro, pois ontem não havia clima político para evoluir nas negociações. " O principal problema que enfrentávamos era o fato de defenderem uma CPI cujos signatários são os suspeitos " , disse Jungmann.

Os principais propositores da CPI da Compra de Votos só na Câmara foram os líderes do PL, Sandro Mabel (GO); do PP, José Janene (PR), citados pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) como atuantes na operacionalização do esquema. Os demais líderes da base sentiram-se encurralados e decidiram apoiar a CPI. " Não tínhamos outra opção " , confessou um governista. O governo passou duas semanas tentando aprovar o projeto de resolução para criar a CPI da Compra de Votos. " Está claro a fadiga política desta estratégia " , disse no início da tarde o líder do PSB, deputado Renato Casagrande (ES).

Além da adesão tardia do PMDB, defendiam a CPI Mista os seguintes partidos: PFL, PSDB, PV, PDT, PPS. Havia, ainda, deputados do PT, PSB e PCdoB claramente incomodados com a tentativa de líderes do PL e PP em concentrar as investigações somente na Câmara.

Ex-petista, o deputado Fernando Gabeira (PV) arrancou aplausos do plenário ao criticar o PT na tribuna. " Não importa que o Senado investigue (os deputados). Que venha o Senado. Não afundem junto com o José Dirceu. Vocês merecem muito mais. Saiam desse barco furado porque o Brasil precisa de vocês. A CPI (na Câmara) está sendo pedida pelos principais acusados. Insistir nisto com a expectativa de controlá-la é ridículo " , disse Gabeira.

A concretização do acordo de líderes para a criação da CPI Mista só ocorreu tarde da noite. O presidente do Senado, Renan Calheiros, ficou esperando o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, encerrar a sessão. Não poderia ser realizada sessão do Congresso com uma das Casas em funcionamento. Havia resistências do PP, partido de Cavalcanti, em realizar a CPI mista.