Título: Valério terá direito de ficar calado na CPI dos Correios
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 06/07/2005, Brasil, p. A8

BRASÍLIA - O publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza obteve uma liminar no Supremo Tribunal Federal (STF) que lhe garantiu o direito de ficar calado durante o depoimento que deverá prestar hoje à CPI dos Correios.

A liminar foi concedida pela presidente em exercício do STF, ministra Ellen Gracie. Pela decisão, Valério poderá prestar depoimento acompanhado de seu advogado e terá o direito de se calar sempre que entender que uma eventual resposta às perguntas dos parlamentares pode levar à auto-incriminação.

Ellen decidiu que Valério deverá ser tratado como " investigado " no depoimento, e não como " testemunha " . A diferença é importante, pois o investigado pode se recusar a responder aos parlamentares, e não ser preso por isso. Já a testemunha tem que assinar um termo perante a CPI, comprometendo-se a colaborar. O descumprimento a este juramento pela testemunha pode levar à prisão imediata. Valério ingressou no STF justamente para evitar que fosse preso. É o Supremo que julga os pedidos de habeas corpus de depoentes em CPIs.

A ministra Ellen justificou a liminar com a jurisprudência do STF favorável ao direito dos investigados por CPIs de ficarem em silêncio sempre que forem questionados sobre fatos que puderem incriminá-los.

Marcos Valério, sócio das agências de publicidade SMP & B e DNA Propaganda, é o depoente que poderia fazer a conexão entre as denúncias de suposto esquema de corrupção nos Correios - estatal com a qual firmou contratos de publicidade - e de pagamento a deputados em troca de votos favoráveis ao governo, já que foi apontado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) como o " operador do mensalão " . Como o tão esperado depoimento pode se transformar numa frustrante sessão de silêncio contínuo, os parlamentares, pelo menos os de oposição, já traçaram uma estratégia: vão fazer revelações sobre documentos sigilosos da CPI ao inquirir Valério.

A principal munição dos parlamentares serão os relatórios sigilosos do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), já que até ontem à noite os sigilos bancário, fiscal e telefônico de Marcos Valério tinham chegado à CPI. O publicitário fez nos últimos anos movimentações financeiras milionárias, a maior parte em espécie. Não consegue, ainda, dar explicações convincentes e consistentes sobre o patrimônio. Integrantes da CPI confirmaram ao Valor que há elementos suficientes para configuração de crime de evasão de divisas. " O silêncio será incriminatório e sinal evidente de culpa " , opinou o líder do PFL no Senado, José Agripino Maia (RN).

Para o relator da CPI, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), não há razão para questionar a condição do depoente hoje. " Ele deporá como investigado. E como determinar que uma pessoa fale algo contra si própria? " , disse o relator, descartando a hipótese de o plenário da CPI tentar mudar a condição de Valério para testemunha, o que o obrigaria a assinar um termo de compromisso de só falar a verdade.

" A CPI apura um delito principal. Não há delito em mentir em defesa própria " , explicou o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP). Segundo o deputado Jorge Bittar (PT-RJ), membro da CPI, o depoente é investigado e tem direitos que precisam ser respeitados.