Título: Apoio no Congresso é maior obstáculo
Autor: Raquel Salgado
Fonte: Valor Econômico, 07/07/2005, Brasil, p. A3

A proposta de se perseguir a meta de déficit nominal zero, apresentada pelo deputado Antonio Delfim Netto (PP-SP), foi, em linhas gerais, bem recebida pelos cerca de 40 convidados ao jantar promovido pelo parlamentar terça-feira, em Brasília. Todos, no entanto, mostraram claramente sua apreensão em relação à dificuldade de aprovação no Congresso e de implementação da medida. Também restou nítida a impressão que a proposta é endossada pelo Executivo e que o deputado Delfim Netto é apenas a face não-petista em condições de colocar o tema em pauta no Congresso com alguma chance de tramitação. O clima da reunião, segundo um dos empresários participantes, foi positivo e com raras referências à atual crise política. A única referência de peso ao assunto partiu do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que mencionou o contraste entre as discussões sobre a necessidade de um choque de gestão, que tinham lugar no jantar, e negociações que no mesmo momento ocorriam no Palácio do Planalto, com a oferta de ministérios ao PMDB, em troca de apoio ao governo no Congresso. A reunião foi aberta com uma exposição de Delfim sobre a importância da proposta para o crescimento do país. O deputado relembrou estudo do Goldman Sachs, publicado anos atrás, que tratava da potencialidade de crescimento dos BRIC - as potências emergentes Brasil, Rússia, Índia e China. Delfim observou que o país tem crescido nos anos recentes a uma taxa acumulada que é quase um quarto da taxa desses outros países. Deputado Delfim Netto: proposta importante para o crescimento do país

O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, falou em seguida, explicitando seu apoio à tese, que também recebeu o aval do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, e de Dilma Rousseff, da Casa Civil. A nota dissonante entre os ministros coube a Jaques Wagner, do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, que se manifestou preocupado com a proposta de desvinculação das receitas orçamentárias e com perdas de recursos na área social. De suas preocupações também comunga o senador Aloizio Mercadante (PT-SP), que teme a perda de conquistas da sociedade na área social. Entre os empresários, o mais longo discurso foi o de Jorge Gerdau Johannpeter, que não poupou críticas à política de juros altos, à falta de investimentos públicos em infra-estrutura e, principalmente, à ineficiência administrativa. O mérito da reunião, na visão dos participantes, foi a mobilização para se trazer ao centro do debate a questão do desafio da retomada do crescimento da economia e a necessidade de melhorar a eficiência da gestão pública. O último ponto, obviamente, foi prontamente apoiado, já que é uma crítica recorrente do setor privado, mas os empresários observam como positivo ter sido germinada a idéia de se trocar o indicador do superávit primário pelo equilíbrio nominal das contas públicas. O que está sendo comprado, afirma um dos presentes, é a idéia de que lentamente "temos que caminhar para incluir nas contas públicas a conta dos juros, temos que olhar para os números como um todo". Ou seja, interromper o atual ciclo em que se comemora o esforço ao atingir metas de superávit primário, enquanto o impacto da conta de juros, tratado isoladamente, consome esse esforço e continua a fazer crescer a dívida. Para os empresários, mesmo que esse assunto não vingue na pauta do Congresso, é agenda importante para os próximos anos. Não se tocou, na reunião de Brasília, na preocupação manifestada por economistas de que a meta fiscal de déficit nominal zero represente a perda de significância da meta de inflação, hoje principal objetivo a ser perseguido pelo Banco Central, e um freio à atuação do BC . "O tema da autonomia do BC não freqüentou a reunião", disse um dos presentes. Entre as ausências notadas, o empresário Antonio Ermirio de Moraes, os banqueiros Pedro Moreira Salles e José Safra. Também notou-se a ausência do presidente do BC, Henrique Meirelles. "Mas o Murilo Portugal estava lá", afirmou, irônico, um dos presentes. Para Rogélio Golfarb, presidente da Anfavea, a associação dos fabricantes de veículos, tornar o projeto viável politicamente é o maior desafio da proposta apresentada pelo deputado Delfim Netto. Segundo ele, os representantes da indústria automobilística endossam a idéia e parecem ansiosos pela continuidade da mobilização, durante seminário do Ipea. Golfarb diz que setores que investem pesadamente e a longo prazo, como o automotivo, deverão se sentir mais estimulados a aplicar recursos no país a partir da tendência de queda de juros que, na sua avaliação, aconteceria de imediato a partir do projeto de déficit zero. Para ele, os resultados devem aparecer antes da meta estabelecida para o déficit zero, em 2008. "Se o governo pegar menos dinheiro no mercado e a dívida cair, os agentes projetarão taxas de juros mais baixas, o que estimulará investimentos", afirma.