Título: Empresário usa habeas corpus para silenciar sobre saques
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 07/07/2005, Política, p. A7
O empresário Marcos Valério Fernandes de Souza utilizou-se do habeas corpus preventivo que obteve no Supremo Tribunal Federal (STF) e recusou-se a dar explicações aos parlamentares da CPI Mista dos Correios sobre as movimentações financeiras e saques milionários que fez nos últimos anos, conforme dados do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Ele alegou que os saques eram feitos para pagar fornecedores, que tinham cheques endossados, mas se negou a dar ao relator da CPI, Osmar Serraglio (PMDB-PR), os nomes de pessoas físicas ou jurídicas com as quais fez negócios: "Me reservo o direito de não revelar. Será apresentado no foro adequado". O empresário também silenciou quando a senadora Heloísa Helena (P-Sol-AL) lhe perguntou sobre seus investimentos. Valério argumentou que o volume de saques - que superam R$ 1 bilhão nos últimos oito anos - é compatível com a atividade financeira de suas principais empresas, a SMP&B e DNA Propaganda. As empresas, afirmou, tiveram um faturamento bruto de aproximadamente R$ 400 mil cada no ano passado. "Representa 4% do faturamento de cada uma, mais ou menos", disse. Ele afirmou nunca ter dito ser pecuarista ou criador de gado, conforme publicado na revista "Veja". Ele disse que todas as movimentações de suas empresas estão devidamente registradas nos livros contábeis e em seu Imposto de Renda. A DNA Propaganda e a SMP&B, no entanto, não estão no nome de Valério, mas sim de sua esposa, Renilda Santiago. Ao explicar os saques individuais superiores a R$ 100 mil feitos no Banco do Brasil entre julho de 2003 até maio deste ano, e que somam R$ 20 milhões, Valério explicou que recebeu algumas notas fiscais e recibos de fornecedores que comprovam as operações. No entanto, acabou reconhecendo que não tem notas fiscais que comprovariam todo esse volume de operações. Sobre os contratos da SMP&B com os Correios, o empresário disse que não há nenhuma possibilidade de superfaturamento e disse que a CPI pode recomendar a suspensão de todos os contratos temporariamente e investigá-los, pois não encontrará ilegalidades. A justificativa é que em contratos de publicidade cabe às agências remunerar os veículos de massa, ficando apenas com uma comissão de 5% a 20%. Portanto o superfaturamento precisaria de conivência da mídia. O mesmo argumento foi defendido pelos deputados Jorge Bittar (PT-RJ) e Maurício Rands (PT-PE), da bancada governista na Comissão. "Não houve nenhuma facilitação para a SMP&B ganhar. Foi uma licitação técnica, dentro de normas técnicas", disse. O faturamento do contrato com os Correios em 2004, ano da assinatura, foi de R$ 28 milhões. A SMP&B tem contratos ainda com o Ministério dos Esportes desde 2001 e com a Câmara dos Deputados desde 2003. Do contrato desta Casa, que rendeu à agência um faturamento bruto de R$ 8,8 milhões, recebeu os maiores questionamentos. "Assim como PC Farias usava os laranjas no passado, a publicidade é usada hoje. A Câmara precisa de R$ 20 milhões de publicidade por quê? Não tem motivo", disse Pompeu de Mattos (PDT-RS). A DNA faz a publicidade do Banco do Brasil desde 1994; do Ministério do Trabalho desde 2001; e da Eletronorte, desde 2002. Chama a atenção os valores citados por ele no contrato com o BB, que saltou de R$ 43, 8 milhões em 2001 para R$ 103 milhões em 2004. As movimentações empresariais de Valério deixam os parlamentares perplexos, assim como o fato de seu patrimônio ter quase quintuplicado de 2001 a 2004, chegando agora a R$ 14,2 milhões. O empresário disse que tira mensalmente das empresas um rendimento de R$ 30 mil. "Me espantei com o emaranhado de empresas das quais Vossa Senhoria participa", disse Serraglio. Além das participações indiretas na SMP&B e DNA Propaganda, Valério tem uma empresa de eventos - Multi Action -, usou dois funcionários para abrir a empresa 2S Participações; e é dono da Cepel, empresa de hípica em Belo Horizonte. Isso sem contar empresas que abriu e fechou, e ações que vendeu recentemente. A empresa Presépio foi aberta para gerir a Cepel, mas sequer chegou a funcionar. Abriu uma empresa com o cunhado, Humberto Santiago, e fechou rapidamente. Ia criar a empresa JBN para deixar imóveis aos filhos, mas desistiu. Criou ainda duas empresas para participar de licitações de TV à cabo, a Brastelecom e BrasTV, mas fechou. É ainda sócio na MG5 Participações, criada para gerir a Multi Action, mas a empresa não tem conta em banco nem emite nota fiscal, segundo ele. O empresário confirmou que é devedor da Previdência Social, débito em questionamento na Justiça. Tem certidão negativa com efeito positivo e, por isso, pode participar de licitações em órgãos públicos. Entre os saques feitos, Valério confirmou que pagou R$ 150 mil ao ex-ministro Pimenta da Veiga, por serviços jurídicos de consultoria prestados às empresas dele. Ele contou, ainda, que fez uma negociação com o Banco Rural, onde tinha dívida de R$ 9 milhões. Pelo acordo feito, pagou apenas R$ 2 milhões. A SMP&B tem conta no Rural, segundo ele, há mais de 10 anos. (MLD e CF)