Título: Cruzamento com dados da CPI do Banestado revela contradições
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 07/07/2005, Política, p. A7

A partir de um cruzamento de dados obtidos pela CPI do Banestado em 2003 com a investigação em curso na CPI dos Correios, surgiram os primeiros indícios de que o empresário Marcos Valério de Souza possa ter praticado crime de evasão de divisas. Embora à época Valério não tenha sido convocado para depor no Congresso, ele prestou depoimento à Polícia Federal na ocasião e assumiu que algumas de suas empresas enviaram recursos para o exterior. Ontem, entretanto, ele negou esse fato. "Eu nunca enviei recursos ao exterior, e acredito que as minhas empresas também não fizeram isso", afirmou. Ao longo do depoimento, no entanto, ao ser sucessivamente pressionado por vários parlamentares, o empresário foi obrigado a admitir que pelo menos a DNA Propaganda fez remessas ao exterior. "Talvez tenha pago fornecedores no exterior, e não sei se foi por doleiros, mas vou checar e informar à CPI", disse. Uma das principais suspeitas dos parlamentares, que têm acesso a informações sigilosas da PF e da Receita Federal, é que Valério possa ser direta ou indiretamente responsável pela evasão de US$ 1 milhão. "Eu não enviei (esse montante)", afirmou diretamente em resposta à deputada Laura Carneiro (PFL-RJ). A parlamentar informou a Valério que, na semana passada, a PF fez busca e apreensão no Rio de Janeiro e teria autuado dois doleiros que supostamente trabalharam em empresas de Valério: "O senhor sabia? É para ficar informado". "Ok, obrigado", respondeu Valério. Valério foi ouvido pela PF em 28 de outubro de 2003, em Brasília. No depoimento, ele assumiu que a DNA fazia transferências ao exterior para pagamento de mídia internacional, sobretudo para Nova York. À época, foi firme ao negar que usasse doleiros para as transações e assegurou que as transferências eram feitas sempre pelo Banco do Brasil. Ele afirmou, ainda, que os pagamentos se situavam entre US$ 5 mil e US$ 10 mil por transação. Os valores, pela apuração da PF, são bem superiores. Valério negou que tivesse relação ou sequer conhecesse as empresas Beacon Hill, Trust Turismo, Full Viagens, San Remo, Vigo, Sipasa ou Brasil Central Genética Agropecuária. A PF, contudo, sempre investigou as relações entre o publicitário e a Beacon Hill. De acordo com o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), as movimentações de Valério no exterior, por meio da Beacon Hill, ultrapassam US$ 1 milhão. Fontes da PF confirmaram, ontem, que Valério continua a ser investigado mesmo após o seu depoimento ao órgão em 2003. A conta onde o dinheiro foi destinado estaria sob o codinome Lonton. "Prometo uma procuração para a CPI averiguar se tenho empresas no exterior", disse Valério. Parlamentares da oposição estão se concentrando agora na relação de Valério com doleiros. Alguns deputados acreditam que se esta linha de investigação for seguida, poderá ser fechado um círculo das denúncias do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). Ele disse que um repasse de R$ 16 milhões do PT ao PTB não foi honrado e que, segundo o então ministro José Dirceu, a inadimplência petista teria ocorrido porque a PF estava prendendo doleiros que atuam no país. Na mesma linha de investigação, parlamentares da CPI indicam que o pedido que Valério teria feito a Jefferson para transferir a administração de R$ 600 milhões mantidos pelo IRB-Brasil Resseguros na Suíça para o banco português Espírito Santo, pode indicar um esquema de lavagem de dinheiro. (Colaboraram Thiago Vitale Jayme e Mauro Zanatta)