Título: Empresas buscam taxa mais baixa fora do BNDES
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Fonte: Valor Econômico, 08/07/2005, Brasil, p. A5

RIO - Pelo segundo ano consecutivo o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) não deverá cumprir 100% do seu crescente orçamento, que neste ano chegou a R$ 60,8 bilhões, aí incluídos R$ 650 milhões para compra de ações no mercado secundário. No ano passado, o banco programou R$ 47,3 bilhões, mas realizou apenas R$ 39,8 bilhões (sem mercado secundário), ainda que isso tenha significado crescimento de 18,8% sobre 2003.

Os números do primeiro semestre, divulgados ontem, revelam a realização de aproximadamente um terço do previsto para o ano todo e praticamente ninguém no banco acredita mais que o orçamento de 2005 será cumprido. Já em 2003, o BNDES realizou a duras penas o orçamento de R$ 33,4 bilhões. Passados dez meses, faltavam R$ 12 bilhões para emprestar e foi necessário um grande esforço, que incluiu inéditos financiamentos de capital de giro (pré-embarque de exportações) para a indústria automobilística no valor de R$ 1,4 bilhão. A compra de R$ 1,5 bilhão em ações da Vale do Rio Doce também ajudou a fechar a conta.

O dólar barato, os juros elevados e a disponibilidade de caixa nas empresas (especialmente em setores como o siderúrgico, gerada pelos altos preços praticados em 2004) são fatores reconhecidos como inibidores dos empréstimos do BNDES. O endividamento líquido de Usiminas e CSN, por exemplo, recuou 25,8% e 25,4%, respectivamente, entre dezembro de 2004 e março deste ano. Não é de hoje que a direção do banco briga pela redução da taxa de juros de longo prazo (TJLP), sua taxa básica, atualmente em 9,75% ao ano.

Outra razão é que as companhias estão encontrando fontes alternativas - e mais vantajosas em alguns casos - de financiamento. As emissões de debêntures para captações no mercado financeiro dispararam no primeiro semestre, alcançando R$ 24 bilhões, mais dez vezes superiores às do mesmo período do ano passado. Somadas às emissões primárias, as captações no mercado chegaram a R$ 40 bilhões. Grandes empresas como a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e a petroquímica Braskem estão emitindo bônus perpétuos, sem prazo de vencimento, para captar dinheiro no exterior. E a liquidez própria está fazendo com que empresas como a Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST) prefiram tocar os investimentos com dinheiro do caixa a pegar financiamento do BNDES.

O bônus perpétuo de US$ 150 milhões da Braskem, por exemplo, foi colocado no mercado a 9,75% ao ano. Se o banco tivesse recorrido ao BNDES teria pago TJLP a 9,75% ao ano, somada ao spread para remuneração do BNDES, que faz o juro subir a 13,25% ao ano. Na captação, a empresa corre risco cambial, diluído quando a companhia for exportadora.

Técnicos do banco e especialistas do mercado concordam que o orçamento é um número político, um chamado ao mercado para investir, que pode ou não ser realizado. Em 2004, a direção do banco preferia ficar em R$ 40 bilhões, mas pressões de Brasília forçaram R$ 47 bilhões. " O banco não pode ser mais realista que o rei. Ele deve se antecipar aos movimentos da economia. O banco está correto. O que não foi correto foi o movimento da economia " , analisa Julio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Econômico (Iedi).

O problema é que a não realização orçamentária sempre acarreta desgaste e uma chuva de críticas ao funcionamento do banco, ainda que os empréstimos não estejam encolhendo. No ano passado, eles cresceram 18,8%, mesmo ficando abaixo do programado. No primeiro semestre deste ano, o crescimento ficou em 10%. Em segmentos como o de insumos básicos, os empréstimos em seis meses corresponderam a mais de 85% dos desembolsos de todo o ano passado.

Mas esse era um dos segmentos nos quais o banco apostava para realizar o orçamento do ano. Nele estão setores de metalurgia (siderúrgicas), químico, petroquímico e de papel e celulose, todos intensivos em capital e nos quais projetos novos estão sempre na casa dos bilhões.