Título: CPI quebra sigilos de Roberto Jefferson
Autor: Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 08/07/2005, Política, p. A7
Crise Dirceu, Genoino, Delúbio e Sílvio Pereira autorizam comissão a acessar dados financeiros e telefônicos
Num momento de exacerbada partidarização política, a CPI Mista dos Correios aprovou ontem, por unanimidade, a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico do deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) e recebeu a autorização do ex-ministro José Dirceu, do presidente do PT, José Genoino; e dos ex-dirigentes petistas Sílvio Pereira e Delúbio Soares para que os membros da comissão também tenham acesso a todas as movimentações financeiras feitas por eles, bem como contatos telefônicos que tiveram. Os petistas autorizaram a quebra de sigilos por fax enviado ao gabinete do senador Sibá Machado (PT-AC). Delúbio e Sílvio Pereira foram convocados pela CPI e vão prestar depoimento até o dia 20. Enquanto os parlamentares trocavam insultos para discutir se seria votada a quebra de sigilo de dirigentes do PT, Sibá Machado telefonou para José Dirceu e Genoino pedindo que eles se antecipassem. "A oposição quer um troféu que não pode ter", disse o petista a Dirceu. Sibá insistiu com o ex-ministro que não bastava uma autorização verbal, e precisaria apresentar um documento por escrito à CPI. "Para os propósitos de bem cooperar com os trabalhos desta Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, venho voluntariamente colocar à disposição toda e qualquer informação referente às minhas operações bancárias, bem como as de ordem fiscal e telefônica", diz a autorização de Dirceu. Genoino e Sílvio Pereira enviaram um fax para Sibá com o timbre do PT, apesar de o último ter se desligado da Executiva. Delúbio enviou um fax reiterando que já tinha colocado os sigilos à disposição ao se afastar da tesouraria. As decisões tomadas pela CPI ontem são um divisor de águas no rumo das investigações. Fica claro que, a partir de agora, o foco central das apurações não é mais a denúncia de supostas irregularidades em licitações e tráfico de influência na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) envolvendo políticos da base aliada, mas sim a averiguação das ligações do PT com o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza e as denúncias de suposto caixa 2 de campanhas eleitorais, evasão de divisas, pagamento do mensalão e de ilegalidades na relação público/privado. Valério prestou depoimento na quarta-feira. Ele foi apontado por Roberto Jefferson como o operador do mensalão, suposto esquema de pagamento coordenado pelo PT a parlamentares do PP e PL em troca de apoio ao governo. Pivô da crise, Jefferson provocou novo incêndio na CPI. Enviou, por seus advogados, uma nota de esclarecimento sobre declarações que deu no "Programa do Jô", em que teria levantado suspeitas sobre todos os membros da CPI. Disse, na nota, que não se referiu à CPI, mas ao Conselho de Ética da Câmara, e que desconhece qualquer envolvimento dos membros da CPI no esquema do mensalão. Mas aproveitou para atacar o PT e a senadora Ideli Salvatti (SC). "Rejeito a participação de deputados federais do PT nos plenários em que estou sendo inquirido, na tentativa afoita de preservar a imagem de seu partido ao preço de minha honra pessoal e da integridade do PTB", disse. "Questiono ainda a isenção da senadora Ideli Salvatti, do PT, membro da mesma Executiva a quem acuso de fazer o pagamento do citado mensalão", acrescenta Jefferson na nota. A petista reagiu com ira, exigiu uma acareação com Jefferson na CPI, o desafiou a apresentar provas e avisou que não será intimidada. O presidente da CPI, Delcídio Amaral (PT-MS), criticou a partidarização na comissão, o descontrole e a troca de insultos dos parlamentares. Disse que foi contra a votação da quebra de sigilo de Jefferson ontem, por ser extemporânea. "Saímos de toda as estratégias que buscamos ao longo da semana. Uma CPI é política, sim, mas o povo e o Brasil esperam que tenhamos seriedade nas apurações", disse. O duelo entre o PT e a oposição na CPI ficou ainda mais explícito ontem. Numa reunião administrativa a portas fechadas, iniciada por volta das 10h, os membros da CPI discutiram quais requerimentos seriam votados por consenso. O clima foi pacífico. O único ponto de discórdia foi quando a bancada do PT sugeriu que fosse colocado em votação o requerimento para quebra de sigilo de Roberto Jefferson. A sugestão foi feita pelo deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP). O senador Demóstenes Torres (PFL-GO) reagiu: disse que se votassem a quebra de sigilo de Jefferson teriam que apreciar também a quebra de sigilos dos petistas. Sem acordo sobre o tema, os parlamentares decidiram votar o que fosse consensual e voltar a discutir à noite a questão de Jefferson. Já na sessão pública, votaram por unanimidade a convocação de Delúbio Soares; de Renilda Maria Santiago Fernandes de Souza, esposa de Valério; e de duas secretárias que trabalharam com ele. Aprovaram também por unanimidade a quebra de sigilos bancário, fiscal e telefônico de dez empresas ligadas ao empresário Marcos Valério. O clima de consenso durou pouco. A senadora Heloísa Helena (PSOL-AL) trouxe à tona o debate sobre a quebra de sigilo de Jefferson. O PT tentava justificar a quebra de sigilo de Jefferson, alegando que não se tratava de retaliação. "Há contradições visíveis entre o que o deputado diz e o que os documentos apontam", justificou Ideli Salvatti. O requerimento foi votado e aprovado por 18 votos. A partir daí, a oposição reivindicou a votação das quebras de sigilos dos petistas. Começava um novo bate-boca de horas. Ignorando o foco e a agenda da CPI, petistas e pefelistas se embrenharam num embate que envolveu até o papel das legendas no período militar. No meio da briga, os petistas antecipam-se e enviam as autorizações para quebras de sigilo, cessando o foco de conflito.