Título: China admite 'disciplinar' comércio com o Brasil
Autor: Dalian
Fonte: Valor Econômico, 11/07/2005, Especial, p. A12

A China indicou ao Brasil que está pronta a negociar um acordo bilateral para "disciplinar" o crescimento de suas exportações de têxteis e outros produtos, a fim de evitar a imposição de barreiras por Brasília, informou o embaixador brasileiro em Pequim, Luiz Augusto de Castro Neves. A data para começar a negociação será examinada amanhã, em Dalian (China), num encontro entre o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, e o ministro chinês de Comércio, Bo Xilai, à margem de reunião do G-20, grupo liderado pelo Brasil para as negociações agrícolas. "O ministro Xilai disse que os chineses querem que o comércio se expanda, mas sem causar disrupção no mercado brasileiro", relatou o diplomata, em entrevista feita por telefone. Lembrou que Xilai e o ministro Luiz Fernando Furlan já trocaram cartas sobre a negociação. A expectativa é que o encontro entre ambos ocorra antes de o Brasil regulamentar salvaguardas para aplicar sobre exportações chinesas. Um acordo sino-brasileiro poderá seguir o formato negociado entre Pequim e a União Européia (UE) em junho. Por ele, Bruxelas estabeleceu crescimento anual entre 8% e 12,5% para a entrada de dez categorias de têxteis chineses para o mercado europeu até 2007 - taxa maior do que o 7,5% anual que os EUA e outros países impuseram a produtos têxteis chineses, com base nas condições que a própria China aceitou se submeter para entrar na OMC. Além disso, lembrou Castro Neves, Pequim tem estabelecido imposto à exportação para auto-restringir certas vendas. O fato é que um acordo bilateral evita estrago diplomático e pode dar clareza e previsibilidade nos negócios, na visão de Bruxelas e Pequim. De um lado, permite uma alta "razoável" das exportações chinesas. De outro, ao frear a explosão das vendas, dá um pouco de oxigênio para as indústrias locais. Um acordo sino-brasileiro pode ir além de têxteis, calçados, brinquedos. "Sua abrangência dependerá das conversações entre os ministros Furlan e Xilai, mas tem a complicação de estatísticas", disse o diplomata. As taxas de crescimento das exportações calculadas pelos dois parceiros são diferentes. Segundo o diplomata, embora se fale muito de têxteis e calçados, o produto chinês com aumento significativo de exportações para o Brasil são os insumos eletroeletrônicos. A Zona Franca está importando "muitíssimo", afirma. Ele chama a atenção para uma especificidade no caso dos calçados: "Quem está exportando mais e mais calçados para o Brasil são justamente gaúchos, que se estabeleceram na região de Cantão"´. Ele contou que já são mais de 2 mil gaúchos, que abandonaram o Brasil para produzir na China, alegando que o sistema tributário é mais favorável - sem contar, evidentemente, o custo da mão-de-obra. Na outra direção, o Brasil está procurando abrir o mercado chinês para as carnes bovina, aves e porco. Cinco frigoríficos, incluindo Perdigão e Seara, já foram certificados. As exportações não começaram em bases definitivas, mas o embaixador acha que neste segundo semestre vão decolar de vez. "O crescimento da renda chinesa é vertiginoso, e a demanda é tão grande que fica até arriscado estimar potencial." Do lado dos investimentos, o diplomata vê movimentos, apesar das criticas em relação à lentidão em se transformar promessas em negócios com a China. Ele acredita que a "MP do Bem" viabilizará o investimento da Baosteel com a Vale do Rio Doce numa siderúrgica no Maranhão. "Havia um problema de tributação com a exigência de pagamento de US$ 300 milhões de impostos de equipamentos. Os chineses disseram que não teriam problema de pagar imposto sobre a produção, mas sobre investimento dificultava", contou. Além disso, diz haver procura por "joint ventures". "Diariamente somos procurados por pessoas querendo se estabelecer no Brasil"´. Os chineses demonstram interesses na infra-estrutura portuária, ferroviária e também em projetos de integração da cadeia produtiva, por exemplo, no setor eletroeletrônico. Por sua vez, mais empresas brasileiras procuram se instalar na China. A Tramontina está avaliando a instalação de uma linha de produção para ferramentas leves. A Embraco e a Weg recentemente fizeram investimentos. No setor de turismo, a avaliação é igualmente positiva. Os chineses estão viajando cada vez mais e o Brasil quer atrair uma parte deles. Os dois países estão registrando agências de turismo. O consulado de Pequim já é o número dois em renda consular, só atrás de Nova York. Faturou mais de US$ 1 milhão com cobrança de vistos para os chineses no ano passado. Enquanto o Brasil e a China ainda discutem data para negociar, hoje será a vez de Pequim sentar a mesa com os EUA. O secretário de Comércio dos EUA, Carlos Gutierrez, o principal negociador comercial americano, Rob Portmann, e o secretário de Agricultura, Mike Johanes, se encontram em Pequim com o vice-primeiro-ministro Wu Xi e o ministro de Comércio Xilai. A agenda é ampla. Mas um acordo têxtil já não foi possível ser delineado na parte técnica, no final de semana. (AM)