Título: Lula reforça posição no Congresso e no PT
Autor: Rosângela Bittar
Fonte: Valor Econômico, 12/07/2005, Política, p. A5

Há 15 dias, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu aos então demissionários ministros Aldo Rebelo e Eduardo Campos que permanecessem no governo, eximindo-os de se incluírem no critério de afastamento em razão de candidaturas em 2006. Na noite desta segunda-feira, porém, depois de uma reunião de quatro horas em que passou a política brasileira em revista, Lula decidiu que o melhor era tê-los na Câmara. O que mudou entre uma decisão e outra? A intensidade e imprevisibilidade da crise. Lula não lhes está dando atribuições de liderança formal, eles não precisam apresentar resultados de votações do interesse do governo ou outras realizações deste tipo. O presidente, segundo explicou ele próprio a vários interlocutores, ontem, quer tê-los no Congresso como referência. Quer, também, ter lá outros políticos, além desses, que são com ele solidários. Aliados fortes, gente que considera com autoridade para dialogar com parlamentares do governo e da oposição, pessoas que tenham condições de conversar, inclusive com ele, Lula, para trocar informações sobre os acontecimentos. Está convicto o presidente de que todos os partidos de sua base de apoio estão fragilizados. Todos, sem exceção, e quando não o estão por envolvimento nas denúncias, mostram-se em frangalhos pela divisão interna. Pior ainda está o PT. Reconhece também que a situação no Congresso é muito ruim para o governo. E que a tendência é piorar. Não se sabe, por exemplo, quantos e quais parlamentares serão cassados. Nas estimativas de ontem, o cálculo se fixava entre 10 e 12 parlamentares. São desconhecidas as reais dimensões do envolvimento de políticos do PT e do governo, até de alguns que ainda estão bem próximos ao presidente, com os esquemas de corrupção denunciados. À medida em que forem sendo desvendados esses processos, nas investigações da polícia e do Congresso, a oposição pode se ver impelida a apresentar proposições de medidas mais drásticas, inclusive contra o presidente da República. Neste quadro de incertezas e fragilidade, Lula preferiu mandar seus melhores interlocutores políticos para o Congresso. Até para saber a real extensão dos seus problemas. Pelo menos até outubro, a opção do presidente foi pelo fortalecimento dessa rede de apoio. Evidentemente que não são apenas os dois ministros citados os que receberam a missão. Além dos dois que tinham clara atuação política no governo, enquadram-se neste critério o retorno do ex-ministro Ricardo Berzoini à Câmara e de Romero Jucá ao Senado. Neste conjunto de iniciativas com o mesmo objetivo, é possível incluir a intervenção direta do presidente na direção do PT, ocupada por ministros e parlamentares de sua estrita confiança. Dentro de pouco mais de três meses, avaliam auxiliares do presidente, a situação pode realmente clarear e esses aliados, a quem recorreu para as missões que considera mais importantes no momento, podem ser chamados de volta ao governo.

O modelo é para vigorar pelo menos até outubro

Este teria sido o critério verdadeiro da reforma ministerial em curso, segundo informações a respeito das conversas conduzidas pelo presidente para o interior do seu governo. Elas permitem uma análise da situação totalmente diferente daquela produzida a partir das informações que o governo transmite para fora. Nesta, os critérios da reforma são incompreensíveis e não combinam com os fatos por eles gerados. Por exemplo, o critério 2006: teriam que sair todos os ministros que pretendem ser candidatos no ano que vem, pois o presidente não quer fazer nova reforma ministerial em abril, prazo limite da desincompatibilização. Ora, estão ficando ministros declaradamente candidatos, embora haja versões de que a disputa do ano que vem está presente de alguma maneira nas mudanças de hoje. O ex-ministro Humberto Costa (PT), diz-se, teria exigido a saída do ministro Eduardo Campos (PSB), por ser ele seu provável adversário na disputa do governo de Pernambuco. Outro critério anunciado que não faz sentido com a realidade: a reforma teria o objetivo de aumentar votos na coalizão que apóia o governo no Congresso. Na ponta do lápis, é possível que tenha havido redução. Os três ministros do PMDB nomeados agora agregam menos do que seus antecessores, e a dispensa do ministro Eduardo Campos, do PSB, dando lugar a Sergio Resende, uma opção técnica na Ciência e Tecnologia, tira do governo alguém com lastro sólido na bancada parlamentar e deixa representando o partido o ministro Ciro Gomes. Que acabou de chegar ao PSB, já passou por inúmeras legendas, e a sustentação congressual do governo não parece ser sua especialidade, os parlamentares fogem dele. Um cargo pelo qual o PT lutou tanto, o da articulação política no Planalto, foi também alterado agora sem acrescentar um só voto ao governo, além de promover a recriação de uma situação esdrúxula. Na era Fernando Henrique Cardoso, foi criado um Ministério das Reformas Institucionais, que ganhou o apropriado apelido de Mirin, para abrigar um senador do PFL do Piauí, Freitas Neto. Ele tinha um título e uma escrivaninha. Pois o presidente Lula criou o seu Mirin, dando a Jaques Wagner o título de ministro das Relações Institucionais, que vai acumular com o de ministro da Secretaria do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Wagner não tem diálogo com os partidos da coalizão governista nem com a oposição, e não conquista votos dissidentes do seu partido, o PT. O único critério que vinha sendo anunciado como um dos pilares da reforma, ao qual os fatos guardaram certa obediência, foi o de criar uma rede de proteção para o presidente Lula, tirando do governo aqueles que estão diretamente citados em escândalos de corrupção. Por este princípio, pode-se justificar a queda dos ministros José Dirceu e Romero Jucá, embora ainda existam realidades a contrariar o enunciado. Permanecem, por exemplo, Henrique Meirelles, na presidência do Banco Central, e Luiz Gushiken, na Secretaria de Comunicação. Só que, embora no Palácio do Planalto, agora subordinado à ministra Dilma Rousseff, chefe da Casa Civil.