Título: Crise do PT é maior do que a do governo, diz Tarso
Autor: Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 14/07/2005, Política, p. A6

A longa viagem de 12 horas entre Brasília e Paris serviu para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro da Educação, Tarso Genro, acertarem os ponteiros sobre o PT. Entre um compromisso e outro de Lula na cidade, Genro fez o mais duro ataque de um dirigente da legenda ao antigo comando partidário. "A crise do partido é muito maior que a crise do governo", disse Genro, que a partir do dia 27 se afasta definitivamente do ministério da Educação para assumir a presidência do PT. "A crise do partido é uma crise de fundamentos, de princípios. Nós dilapidamos nosso capital moral em relação à sociedade, nós dilapidamos nossa referência ética". Na terça-feira, Genro recebe o resultado de uma sindicância interna que mandou fazer no partido para apurar as denúncias que envolveram a legenda. O ministro não descarta a hipótese de solicitar uma auditoria. Ele também acredita que os envolvidos nas denúncias terão de passar pelo conselho de ética do partido, coisa que alguns deles já se dispuseram a fazer, de acordo com Genro. O novo presidente da sigla também vai propor uma espécie de código de conduta para as relações do partido com o Estado. Essa relação, disse Tarso, foi "a principal deformação" no relacionamento do PT com o governo Lula. Uma relação de "pessoalidades, feita através de grupos e através de frações de instância". Tarso Genro não citou nomes, mas se referia às relações de dirigentes que não tinham vínculos com o governo com os gabinetes de Brasília, como Delúbio Soares e Sílvio Pereira. "Não é uma relação transparente, é uma relação feita de maneira velada em relação ao partido e de uma maneira instransparente em relação à sociedade", afirmou. "Uma das coisas que eu vou propor à Executiva é que essa relação seja previsível, pública e discutida interna e externamente". Segundo o ministro, "só assim haverá uma relação adequada e não uma relação inadequada como fazem não só o PT, mas todos os partidos. Essa relação tem de ser aberta, transparente, porque é isso que separa partido e Estado. Do contrário, é confusão". Tarso disse que o PT dilapidou a referência ética da legenda justamente porque o partido não tinha "controles internos para evitar que isso acontecesse". A intenção do ministro é discutir o futuro da sigla publicamente: "Nós não devemos lavar nossa roupa suja dentro de casa. Temos de lavar fora de casa. Nós temos de dialogar com a sociedade, temos que ir à comissão de ética investigar quem são as pessoas que assumiram responsabilidades por erros, se os erros são meras irregularidades ou ilegalidades". Tarso disse que ficou surpreso com a notícia segundo a qual o PT teria um cofre subterrâneo. "Tomara que tenha mesmo e que descubram, porque aí fica tudo claro. Mas sinceramente não acredito nessa hipótese". O ministro também disse que Lula pediu para que ele recolocasse o PT na trilha original, "um partido ético e progressista", e que não poupasse "nenhum gesto para alcançar esse objetivo". Ao contrário do grupo que comandava antes o PT, Tarso Genro também quer reabrir o debate sobre o modelo econômico. "Acho que o partido tem obrigação para o futuro de analisar os resultados da estabilidade macroeconômica, que é a grande conquista do governo, e não querer fazer uma intervenção conjuntural, em virtude da crise política". Seria, segundo explicou, uma intervenção para discutir "internamente e na sociedade uma transição para outro modelo de desenvolvimento, a médio e longo prazo", a partir das bases atuais. "Nem dentro do governo nem fora há quem defenda que a estabilidade econômica é um fim em si mesmo. Mas também não há ninguém, em sã consciência, que defenda uma ruptura com o sistema financeiro internacional e levar o país a uma situação de isolamento, de atraso. Nós temos que ver como se processa essa transição. O atual governo não a realizou". Mas Tarso esclareceu que a idéia é discutir "um modelo que pense no próximo período (de governo)".