Título: Chance de empresa ser condenada por crime fiscal é remota
Autor: Marta Watanabe
Fonte: Valor Econômico, 15/07/2005, Empresas & Tecnologia, p. B5

Gestão Decisões judiciais trabalham a favor dos acusados nos casos da cervejaria Schincariol e da loja de luxo Daslu

Juntas, as operações por suposta sonegação fiscal nos casos da Schincariol e Daslu movimentaram mais de mil pessoas, entre agentes da Polícia Federal e servidores da Receita Federal, resultaram em 166 mandados de busca e apreensão e levaram à prisão executivos e sócios das empresas. Se depender do que diz o Judiciário atualmente, porém, as acusações de sonegação fiscal envolvendo a Schincariol e a Daslu não devem resultar em condenação por crime tributário. É essa a avaliação dos especialistas com base em decisões consolidadas do Judiciário que estabelecem a autuação fiscal como pressuposto básico para um processo sobre crime de sonegação. "Mais do que isso, o processo penal por sonegação depende de decisão final em processo administrativo no qual se julga a validade da autuação fiscal", diz o tributarista Francisco Nogueira de Lima. Tanto no caso da Schincariol como no da Daslu, a Receita Federal informa que não há nenhuma autuação fiscal relacionada às acusações divulgadas. Mesmo depois de se concluir por sonegação e estipular o valor que deveria ter sido pago, os contribuintes podem ainda encerrar qualquer processo criminal com o pagamento dos tributos. "Essa é uma previsão da legislação brasileira que vem sendo acatada nas decisões do Judiciário", diz a advogada Dora Cavalcanti. O entendimento, diz ela, tem prevalecido, inclusive, em julgamentos dos ministros do Supremo Tribunal Federal, a mais alta corte do país. "A chance desses casos resultarem em alguma condenação criminal tributária é quase nenhuma", diz o advogado Antônio Sérgio de Moraes Pitombo, especialista em direito criminal. "Pela investigação ainda incipiente, as prisões parecem simbólicas, para marcar posição", diz Dora. A Receita Federal diz que o caso da cervejaria está em processo de fiscalização que deve demorar seis meses, no mínimo, embora o órgão tenha divulgado, no dia da prisão dos executivos da Schincariol, uma suposta sonegação da empresa da ordem de R$ 1 bilhão nos últimos cinco anos. Sem processo de fiscalização concluído, a assessoria de imprensa da Receita diz que o valor foi estimado com base na arrecadação do setor de bebidas. Divulgada pela Receita Federal e Polícia Federal como a maior ação da história contra sonegação praticada por uma só empresa, a "Operação Cevada" resultou em 68 prisões em 15 de junho, mesmo dia para o qual estava marcado o depoimento sobre o suposto "mensalão" pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) na Câmara dos Deputados. Na última semana o procurador José Maurício Gonçalves, do Ministério Público no Rio de Janeiro, que acompanha o inquérito da cervejaria, disse que o oferecimento da denúncia por crimes relacionados à alegada sonegação fiscal ainda dependem da Receita Federal. Na semana passada, o Ministério Público anunciou que adiaria por pelo menos um mês o oferecimento da denúncia, previsto inicialmente para esta semana. O procurador informou que tinha apenas uma minuta da denúncia e que os crimes indicados eram de suposta formação de quadrilha, corrupção ativa e passiva. O procurador não informou, porém, se o oferecimento da denúncia envolveria os dirigentes da família Schincariol. O criminalista Antônio Sérgio Pitombo acredita, porém, que algumas acusações, como a de formação de quadrilha, por exemplo, são consideradas como crimes acessórios, que dependeriam de uma denúncia relacionada a um crime principal, como o da alegada sonegação fiscal. No caso da Daslu, a Receita informa que o processo de fiscalização também deverá demorar seis meses. Somente após o final das fiscalizações é que a Receita concluirá se existirá autuação fiscal para a Daslu ou para a Schincariol.