Título: Oposição vê triangulação com versão de Lula
Autor: Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 19/07/2005, Política, p. A5

Causou perplexidade entre políticos do PT ao PFL a declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que o seu partido cometeu uma irregularidade comum no sistema eleitoral brasileiro, que é o caixa 2 de campanhas. "Eu nunca vi, na história, um presidente da República assumir um crime", comentou um deputado petista. "Um verdadeiro desastre. Lamentável. A confissão pública de um crime", definiu outro parlamentar do PT, sob reserva. Boa parte dos integrantes da CPI Mista dos Correios acredita que a tentativa do governo e do PT de concentrar todos os supostos crimes em financiamentos ilegais de campanha é uma versão frágil e aos poucos vai sendo desmontada. A entrevista de Lula foi ao ar no domingo, no Fantástico, da "Rede Globo", mas foi gravada antes de o ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, apresentar uma versão, na mesma linha, em depoimento à Procuradoria Geral da República. O empresário Marcos Valério disse que suas empresas fizeram vários empréstimos para o PT. O fato mais grave, denunciaram oposicionistas e admitiram governistas, é a conexão entre as versões de Valério, Delúbio e Lula. Os parlamentares acreditam que há indícios que já apontam que o suposto esquema de corrupção é muito mais amplo e envolve, direta ou indiretamente, uso de dinheiro público. Integrantes da CPI ouvidos pelo Valor citaram pelo menos dois fatos já revelados e preocupantes: o empréstimo feito no BMG pela empresa Graffite, de Marcos Valério, ao PT, em que a garantia foi um contrato com os Correios; e o fato de o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato ter recebido R$ 326,6 mil de uma conta da DNA Propaganda, também de Valério. "Isso é um sinal horrível. O governo entra na história", avalia um membro da CPI. O relator da CPI, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), deu ainda novas pistas: "Há mais de um empréstimo nesses moldes", disse. Ao ser questionado se o empréstimo da Graffite com o BMG poderia ser interpretado como uma maneira tortuosa de usar dinheiro público para caixa 2, Serraglio respondeu: "Com um esforço mental, sim, pode". O presidente da CPI, Delcídio Amaral (PT-MS), e o relator ainda vão submeter à análise da comissão a intenção de reconvocar Valério a prestar depoimento nesta quinta-feira. O Banco Central prometeu a Delcídio Amaral que hoje, até às 18h30, todos os documentos pendentes chegam à CPI. O mais aguardado são as movimentações de Valério e suas empresas no Banco Rural, especialmente na agência do Brasília Shopping. O fato de Lula tentar se distanciado do PT, alegando que não acompanhava mais as reuniões do diretório, e banalizar o financiamento irregular de campanhas - ao justificar que "o que a direção do PT fez é sistematicamente feito no Brasil" - colocou mais pólvora na crise e provocou constrangimentos na base. Para a oposição, ficou claro que Delúbio e Marcos Valério combinaram uma versão para explicar a espantosa movimentação financeira de empresas de publicidade e o intrigante número de empréstimos que o empresário avalizou. "E o terceiro a falar, no mesmo tom, na mesma linha de coerência, e as mesmas coisas, foi o presidente", criticou o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM). O líder do governo no Senado, Aloízio Mercadante (PT-SP), fez a defesa do presidente. O petista disse que a oposição quer mudar o foco da crise e atingir Lula. "É evidente que o presidente não está envolvido. Todo esse processo foi feito no PT".