Título: Silvio Pereira nega conhecimento de empréstimos e operações financeiras
Autor: Maria Lúcia Delgado e Mauro Zanatta
Fonte: Valor Econômico, 20/07/2005, Política, p. A5

Não e nunca foram as duas palavras mais utilizadas durante o depoimento ontem do ex-secretário-geral do PT, Silvio Pereira, à CPI Mista dos Correios. Ele negou ter conhecimento dos empréstimos feitos pelo partido com bancos, em estranhas triangulações financeiras que envolveram até contratos com estatais como garantia, e transferiu toda a responsabilidade nesta esfera ao ex-tesoureiro da legenda Delúbio Soares, que depõe hoje. O petista calou-se ao ser indagado sobre seu patrimônio. No olho do furacão, Silvinho, como é conhecido no PT, procurou ainda distanciar-se ao máximo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do ex-ministro José Dirceu e minimizou por completo sua influência em nomeações políticas no governo, ao contrário dos relatos de líderes e dirigentes partidários da base que negociavam cargos com ele. A estratégia do depoente foi seguir o seguinte mantra: "governo é uma coisa, partido é outra". O ex-secretário disse que nunca coordenou a campanha presidencial de Lula e que não se encontra com o presidente "há anos". O petista disse também que nunca ouviu falar da "história do mensalão". "Não é verdade que todos os nomes de cargos de confiança, de petistas ou não, passavam por mim. Não tenho esse controle. O governo que tomava a decisão de nomeação", disse. "Não participei da formatação de diretorias (de estatais", acrescentou. Abatido, mas bem preparado por seu advogado, o deslize de Pereira foi admitir ao líder do PSDB na Câmara, Alberto Goldman (SP), que aplica-se a ele a seguinte frase dita pelo presidente Lula: "Trabalhar com a verdade é muito melhor. A desgraça da mentira é que você, ao conter a primeira, passa a vida inteira para justificar a mentira que você contou". Apesar de negar a responsabilidade por nomeações políticas sucessivas vezes durante mais de dez horas de depoimento, o ex-dirigente petista assumiu que elaborou um banco de dados com mais de 5.000 nomes, com currículos e possíveis indicados. Esse relatório foi enviado à Casa Civil e aos ministérios. Foi distribuída até senha para cerca de 500 petistas consultarem o precioso banco de dados do PT. O empresário Marcos Valério de Souza, da DNA Propaganda e SMPB, afirmou em depoimento ao Ministério Público Federal que Sílvio Pereira e o ex-ministro José Dirceu sabiam dos empréstimos. Ontem, o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR) apresentou à CPI requerimento solicitando que o Ministério Público Federal e o Ministério Público de Minas Gerais peçam a prisão preventiva de Valério sob a alegação que o empresário está obstruindo os trabalhos da CPI e que documentos de empresas dele continuam a ser destruídos. "Temos que começar a pressionar e parar com essa brincadeira aqui na CPI, com horas de depoimentos mentirosos", disse Fruet. O parlamentar solicitou ainda à CPI que membros do Ministério Público façam parte da comissão. De fevereiro de 2003 a abril de 2004, as empresas de Marcos Valério ou sócios fizeram seis empréstimos ao PT, sendo duas pelo Banco Rural e quatro pelo BMG. Em março de 2004, em reunião do Diretório Nacional do PT, as dívidas partidárias foram debatidas. Num parecer assinado pelos membros da Executiva, incluindo Delúbio e Sílvio, as contas do PT foram aprovadas "sem qualquer ressalva". Naquela época, disse o petista, a dívida do partido chegava a R$ 20 milhões. "A única informação que sabia e sei, e assumo em qualquer lugar, é que o secretário de finanças (Delúbio) estava procurando recursos junto à rede bancária", justificou Pereira. O ex-secretário do PT contou que conheceu Valério em meados de 2003, nas dependências do partido, apresentado por Delúbio. O empresário tinha a intenção de fazer campanhas eleitorais para o PT. "Nosso contato se limitava a discutir planejamentos de campanhas", disse. As questões financeiras, salientou, eram tratadas por Delúbio. Mesmo assim, Pereira confirmou vários encontros com Marcos Valério, incluindo um em São Paulo, no Maksoud Plaza. A tese sustentada por Pereira, de distanciamento com o governo, apresentou fragilidades, como quando ele admitiu que fazia reuniões nas dependências do Palácio do Planalto, em salas de reuniões, salas de trabalho e hotéis. "Nunca tive salinha, nunca tive estrutura, nunca tive secretária (no Palácio)". Sobre a indicação de Eduardo Medeiros para a diretoria de Tecnologia dos Correios, Pereira disse que atendeu a um apelo de funcionários da estatal e sindicalistas do partido. Silvio Pereira admitiu conhecer e ter se encontrado com o empresário Luiz Gonçalves, dono da Skymaster, empresa que está sob suspeita de superfaturamento em contratos com Correios na área de tecnologia. O maior constrangimento de Pereira foi explicar suas relações com o empresário César Oliveira, ligado à GDK. A empresa tem contrato de R$ 90 milhões com a Petrobras para adaptações na plataforma P-34. O deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA) perguntou se a GDK quitou uma Land Rover de Sílvio Pereira. Ele se calou. No final do depoimento, o ACM Neto e o relator Osmar Serraglio (PMDB-PR) voltaram a pressionar Pereira sobre o Land Rover. O Jornal Nacional comprovou que o pagamento do carro foi feito pela GDK. "Foi um mimo da GDK para o sr. Silvio Pereira", ironizou ACM Neto. Se ficar comprovado que Vossa Senhoria ganhou, será responsabilizado por falsidade ideológica ou sonegação", disse Serraglio a Pereira. Mais uma vez ele se calou.