Título: Brecha para ilegalidades
Autor: Vaze, Lúcio; Jerônimo, Josie
Fonte: Correio Braziliense, 18/04/2010, Política, p. 3

Favorecimento partidário no preenchimento de cargos serve, em alguns casos, como ¿muleta¿ para o nepotismo. Parlamentares não consideram a prática ¿constrangedora¿

Luiz Cláudio Romanelli Filho ficou na mão quando o Supremo Tribunal Federal vetou definitivamente a prática do nepotismo no serviço público. Ele perdeu o emprego que tinha no gabinete do pai, Luiz Cláudio Romanelli (PMDB), na Assembleia Legislativa do Paraná. Mas quem tem padrinho não morre pagão. Romanelli Filho foi acomodado no gabinete de Alex Canziani (PTB-PR), grande amigo de seu pai, na Câmara dos Deputados. ¿Ele é muito conhecido do deputado e trabalha com a gente lá¿, afirma a assessoria do petebista.

A mistura de nepotismo com favorecimento partidário também atinge a liderança do PV na Câmara. A mulher do chefe de gabinete do deputado Marcelo Ortiz (PV-SP), Denise Guardieiro Cardozo, foi nomeada para a liderança do partido quando o parlamentar paulista era líder. Continua no cargo. Segundo o gabinete do atual líder, Edson Duarte (PV-BA), Denise é responsável pela assessoria das comissões. Procurada em seu local de trabalho na tarde de sexta, Denise não foi encontrada. ¿A sogra dela está hospitalizada, ela eventualmente tem saído¿, informou a assessoria da liderança.

O trabalho ¿remoto¿ dos dirigentes partidários contratados como secretários parlamentares facilitaria a vida de quem acumula atividades na legenda com funções nos gabinetes, segundo o secretário nacional de comunicação do PV e assessor parlamentar do deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), Fabiano Carnevale. ¿Eu trabalho com o Gabeira há 12 anos e sou dirigente partidário há três anos. O meu trabalho é internet, sou webmaster do Gabeira. Ainda que esteja aqui no gabinete quase diariamente, é um trabalho que conseguimos fazer remotamente.¿ No escritório político do presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), a situação se repete. Arlon Viana integra a executiva estadual do PMDB e é lotado no gabinete do presidente da Câmara. Segundo a assessoria de Temer, ¿ele cumpre agenda no estado e responde pelo atendimento político em São Paulo¿.

Impedimento

A prática de indicar dirigentes e ex-dirigentes partidários para compor o gabinete não constrange os deputados que elegem os colegas de partido para ocupar funções de natureza legislativa. A falta de impedimento legal para barrar a ausência de critérios na escolha dos comissionados é o principal argumento dos parlamentares. ¿Tem normas que dizem `isso é vedado e isso não é vedado¿. Entre as vedações de nomeação, não está incluído impedimento por ser dirigente partidário¿, alega o deputado Jutahy Júnior (PSDB-BA).

A suposta falta de trabalho dos dirigentes em suas regiões justifica, para alguns deputados, o acúmulo de função dos dirigentes nos gabinetes. Para o deputado Flaviano Melo (PMDB-AC), ¿errado¿ seria se ele contratasse alguém de outro partido: ¿O Armando Dantas é tesoureiro, mas não tem dinheiro para cuidar. Todo mundo do PMDB está comigo, eles me ajudam¿.

Membro da Comissão Nacional de Ética do PT, Wilmar Lacerda argumenta que o STF deu aval para a prática de empregar dirigentes partidários quando reconheceu que o mandato parlamentar pertence à legenda. Segundo Lacerda, lotado no gabinete de Ricardo Berzoini (PT-SP), a função do secretário parlamentar nos estados é ligar o mandato do deputado ao partido. ¿A relação de assessoria, no meu caso, é com o partido. Depois que o Supremo definiu que os mandatos pertencem ao partido, ficou claro. Não há impedimento.¿

1 - Mudança em estudo O controle de presença e horas trabalhadas dos funcionários com cargo comissionado é de responsabilidade dos gabinetes parlamentares. De acordo com a assessoria da Câmara, a Casa não tem controle sobre o expediente dos servidores que ficam nos estados. ¿Não tem como a Casa colocar um departamento de pessoal em todos os escritórios¿, informa a assessoria. A Mesa Diretora estuda mudança para atribuir a esses comissionados denominação diferenciada. A Câmara planeja criar dispositivo para obrigar os comissionados a bater ponto.

COMANDO REMOTO O pré-candidato à Presidência José Serra (SP) visitou o Mercado Modelo, em Salvador, colocou fitinha do Bonfim e o 2º vice-presidente da legenda na Bahia nem viu. José Valdomiro Pena, o Zezito Pena, estava em sua fazenda no interior. De São Sebastião do Passé, município de 40 mil habitantes a 60km de Salvador, Zezito ajuda a comandar o partido e atua como assessor parlamentar do gabinete do líder do PSDB na Câmara, João Almeida (BA). Vez por outra, dá um pulo em Brasília. ¿Trabalho aqui, trabalho lá, em Salvador. Em Brasília não tenho residência. Tem um neto meu que estuda aí, estou sempre com ele.¿ A assessoria da liderança do PSDB na Câmara informa que Pena realiza um grande trabalho na Bahia, pois conhece bem a região.