Título: Conselheiro prepara queixa-crime contra Nucleos
Autor: Catherine Vieira, Chico Santos e Raquel Balarin
Fonte: Valor Econômico, 25/07/2005, Especial, p. A12
O sindicalista Neildo de Souza Jorge, membro do conselho deliberativo do Nucleos (fundo de pensão dos funcionários das estatais do setor nuclear), prepara uma queixa-crime a ser encaminhada ao Ministério Público Federal contra a diretoria responsável pelo fundo em 2004. À época, a diretoria era comandada pelo hoje presidente da Eletronuclear (uma das patrocinadoras do Nucleos), Paulo Figueiredo, ligado ao PCdoB. Com patrimônio de R$ 460 milhões, o Nucleos teve no ano passado rentabilidade de apenas 5,98% - bem abaixo da meta atuarial de 12,51% e da rentabilidade média dos fundos de pensão, de 17%. Neildo diz que acusará a diretoria de má gestão e de suspeita de irregularidades com objetivos políticos a partir da ingerência do ex-secretário de comunicação do PT, Marcelo Borges Sereno. Segundo o sindicalista, Figueiredo foi indicado por Sereno para presidir o Nucleos e alterou a gestão do fundo, tornando-a mais arriscada e levando a prejuízo. O fundo, que, segundo ele, só aplicava em bancos de primeira linha, passou a atuar com o Rural, o Industrial e o BMC. Figueiredo nega ter sido indicado por Sereno ou de ter alterado a política do Nucleos. Segundo ele, as afirmações de Neildo devem-se ao fato de ele ter sido recentemente demitido da Indústrias Nucleares do Brasil (INB), outra estatal do setor. Mas o conselheiro diz que sua demissão ocorreu no mês passado e ele já questiona a direção do fundo desde novembro. A fundação interpelou judicialmente Neildo no Juizado Especial do Rio. O petista Marcelo Sereno afirma que o conselheiro lhe tem rancor pessoal. "Neildo me atribui ser responsável por sua demissão por justa causa na INB", informa Sereno em nota, ressaltando que está movendo contra o sindicalista uma ação por injúria, calúnia e difamação. Ele nega qualquer interferência nos investimentos do Nucleos. Neildo ainda não decidiu se a ação contra o Nucleos será encaminhada por ele como pessoa física, como conselheiro, ou em nome do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Química do Sul Fluminense, do qual é diretor. O sindicalista afirma não ter participado das articulações que alçaram Figueiredo da diretoria de benefícios para a presidência da fundação, em julho de 2003. "A gente sabe que foi articulação dele (Figueiredo) com o Vieira (Luiz Carlos Vieira, presidente da INB) e o Sereno", afirma. Vieira foi indicado ao cargo na INB por Sereno. Ambos iniciaram carreira na Vale do Rio Doce e foram da diretoria do Sindicato dos Trabalhadores em Indústrias Extrativas do Rio. Figueiredo diz que foi escolhido para passar de diretor a presidente pelo conselho deliberativo, do qual Neildo participa. "Se houve interferência política, os conselheiros é que devem responder." Quanto à gestão do fundo, Figueiredo diz que há um conselho consultivo de investimentos, subordinado ao conselho deliberativo. E que, entre as atribuições do conselho, está a de aprovar o plano anual de investimentos. "Mas isso é feito no macro, sem entrar em detalhes. Suspendemos o comitê em outubro para que a diretoria se submetesse diretamente ao conselho, e aí começaram a aparecer as coisas", afirma Neildo. André Luiz Fernandes de Almeida, também do conselho deliberativo, não entra no aspecto político das indicações, mas quer saber o porquê do fiasco de 2004. "Botar dinheiro no bolso? Não sei. Agora, investir mal, investiram. Alguém ganhou. Quem? Não sei." Para ele, a linha de investigação é saber porque o Nucleos trabalhou tanto com bancos de segunda linha. A assessoria da presidência do Nucleos admite que pode ter havido "erro estratégico" nas aplicações de 2004, mas ressalta que o conselho tinha condições e a missão de ter acompanhado tudo. Desde o fim de 2004, por determinação do conselho deliberativo, as aplicações ficaram mais conservadoras. O BMC e o Industrial, por exemplo, devem ser substituídos pelos bancos HSBC e Bradesco. O presidente da Nucleos afirma que, de 2000 a 2004, a fundação só conseguiu atingir a meta atuarial em 2003 (rentabilidade de 33%, quase o dobro da meta), embora no longo prazo (dez anos) tenha ficado acima dessa meta. Segundo ele, a estratégia de 2004 foi a mesma que deu certo em 2003. Outra fundação que registrou pesadas perdas em 2004 e decidiu ser mais conservadora é a Real Grandeza, dos funcionários de Furnas. Benito Siciliano, ex-gerente de investimentos e há 17 anos na fundação, foi afastado pelo presidente Marcos Antonio Carvalho Gomes, indicado pelo deputado federal Jorge Bittar (PT/RJ). A Benito foi imputada a decisão de aplicar R$ 150 milhões em Certificados de Depósito Bancário (CDB) do Banco Santos. No total, 16% do patrimônio da fundação estavam em CDB de bancos de segunda linha. Dois diretores da Real Grandeza, ligados ao PTB, teriam se manifestado contra a demissão de Benito. Sereno e o ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, também manifestaram a mais de um interlocutor contrariedade com o afastamento. A perda com o Santos e uma auditoria especial em abril levaram a fundação a alterar a política de investimentos. As aplicações foram restringidas a grandes bancos nacionais e estrangeiros (12 instituições). Os R$ 388 milhões que a fundação tinha aplicados em maio em quatro bancos médios (BMG, Mercantil, Panamericano e Rural) seriam resgatados e transferidos. A Secretaria de Previdência Complementar (SPC) informou que fez fiscalização direta na Real Grandeza de maio de 2004 a junho de 2005 e lavrou autos de infração por operações realizadas no Banco Santos. No Nucleos, há fiscalização direta (com a presença de auditores na fundação) desde 27 de junho. (CS, CV e RB)