Título: Conceição diz que macroeconomia de esquerda não existe
Autor: Chico Santos
Fonte: Valor Econômico, 26/10/2004, Brasil, p. A3

A economista Maria da Conceição Tavares, ex-deputada federal pelo PT e uma das mais veementes críticas da política macroeconômica dentro do partido do governo, mudou ontem de tom e disse que "não existe uma macroeconomia de esquerda". Em entrevista, após fazer palestra em seminário sobre o legado do período de Getúlio Vargas no governo brasileiro (1930-1945 e 1951-1954), ela disse que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva não tinha outra alternativa a não ser praticar uma política econômica ortodoxa. "Não tinha, você acha que tinha outro jeito?", disse replicando a pergunta de um jornalista. No mês passado, em artigo no jornal "Folha de S. Paulo", a economista havia dito que se retirava do debate macroeconômico brasileiro. Para Conceição Tavares, o fato de praticar uma política macroeconômica ortodoxa não significa que o governo Lula não seja diferente da gestão do seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso. "Política macroeconômica ortodoxa se faz em situações de crise financeira do Estado, de crise do balanço de pagamentos", disse, ressaltando que situações semelhantes foram enfrentadas por governos desenvolvimentistas, como o do próprio Getúlio Vargas, o de Juscelino Kubitschek (1956-1960) e o de João Goulart (1961-1964). Segundo ela, o que diferencia o governo FHC (1995-2002) dos de Vargas, Goulart, JK e Lula é que a gestão tucana "combinou uma macroeconomia ortodoxa com o desmantelamento do Estado nacional", via programa de privatizações. "O Lula barra isso. Volta aquilo que é natural, você tem a Sumoc (antiga Superintendência da Moeda e do Crédito, embrião do Banco Central), depois o BC, que trata lá do equilíbrio monetário, da política monetária restritiva quando tem inflação, e do outro lado tem o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), criado por Vargas, para tratar do desenvolvimento". A economista disse que o governo Lula restaurou no Brasil uma dualidade histórica no campo econômico, representada pelos pontos de vista divergentes do BC e do BNDES, que havia sido eliminada nos anos 90 e ficou até o fim do governo FHC, quando o Banco Central e o BNDES se uniram para fazer o programa de privatizações. Mesmo afirmando que não há contradição entre uma política macroeconômica ortodoxa e um governo progressista, Conceição Tavares não poupou críticas à gestão e aos gestores do BC, sem citar nomes. "Você tem as contradições no interior da política econômica. Esses falcões do BC estão enchendo a paciência, porque eles são ruins, são piores do que Bulhões (o ex-ministro da Fazenda Octavio Gouveia de Bulhões no governo Castelo Branco, 1964-1967), que era um liberal convicto. Eles são falcanizados, passam por lá para virar banqueiros e milionários", atacou. Conceição Tavares é considerada a principal avalista dentro do PT da presença do economista Carlos Lessa na presidência do BNDES. Lessa, que organizou, na sede do banco estatal o seminário sobre o período Vargas, inaugurou ontem um monumento em homenagem ao líder da Revolução de 1930 e aproveitou para fazer ataques. Ele disse, também sem citar nomes, que nos últimos dias têm sido publicados textos defendendo que os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), fonte primária do caixa do BNDES, sejam transferidos para os bancos privados e culpando a TJLP (taxa de juros de longo prazo), custo financeiro básico dos empréstimos do banco estatal, pela alta da taxa Selic, os juros básicos da economia. "No discurso dessas pessoas está a defesa da destruição do BNDES, da desmontagem da Caixa Econômica Federal, do despojamento do Estado nacional de instrumentos básicos para construir o futuro com que sonhamos", afirmou.