Título: Presidente apela aos mais pobres para proteger a imagem e o mandato
Autor: Taciana Collet
Fonte: Valor Econômico, 26/07/2005, Política, p. A5

Para tentar proteger o governo e sua própria imagem, em meio à crise política, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva retomou, mais uma vez, a estratégia de se aproximar de sua base social, a que recorreu em alguns momentos de dificuldades. Ao invés de se recolher e evitar exposição na mídia, o presidente decidiu participar de muitos eventos. Em todos, adota discurso claramente dirigido aos mais pobres, que mantêm sua popularidade inabalada. O presidente voltou a viajar pelo Brasil - pelo menos duas viagens por semana - e a ter contato direto com a população, o que vinha evitando desde que estouraram as denúncias de corrupção contra o governo e o PT. Mas vem escolhendo com cuidado o público com o qual quer falar. A definição do comportamento público do presidente é ditada pelo publicitário Duda Mendonça. No último mês, foi ovacionado diversas vezes por agricultores familiares, movimentos sociais ligados à igualdade racial e à habitação e, principalmente, sindicalistas. Primeiro, recebeu os antigos companheiros no Palácio do Planalto, que ocuparam os salões aos brados de que a elite não deveria ousar tirar um operário da Presidência da República. Depois, passou o fim de semana em São Bernardo, seu berço político. A idéia de que a elite é preconceituosa e quer derrubar o governo Lula vem sendo repetida nesses encontros, às vezes pelo presidente, outras pelo seu público. O próprio presidente afirmou, na sexta-feira, que a elite brasileira não o faria "baixar a cabeça". Passado o fim de semana, ontem mesmo, bem cedo, o presidente visitou o canteiro de obras da segunda pista do aeroporto de Brasília e tomou café da manhã com 400 trabalhadores da empresa. Não faltaram fotos com os operários. Ao discursar, o presidente da Infraero, Carlos Wilson, fez questão de dizer que obras como aquela eram a "maior resposta" para os que não aceitam que um trabalhador chegue à presidência. Faixas espalhadas pelo local diziam: "Presidente Lula, estamos juntos nesta luta". Para reforçar, junto às classes C e D, a imagem do preconceito e de que a elite o quer fora do poder, Lula voltou a recorrer, com freqüência, à sua história de vida. Só ontem, em duas solenidades diferentes, repetiu a mesmíssima frase: "Eu sou o oitavo filho de uma mulher analfabeta e, por conta de ter uma profissão, eu fui o primeiro a ter uma casa, o primeiro a ter um carro, o primeiro a ter uma televisão", ressaltou. "Meu pai podia ter todos os defeitos que um homem pode ter, mas ele nunca deixou de mandar uma ajuda para minha mãe cuidar dos oito filhos." Além de visitar as obras do aeroporto, o presidente participou ontem da assinatura dos primeiros benefícios do programa Bolsa-Atleta, mais de um ano depois do seu lançamento, feito com festa pelo Palácio do Planalto em março do ano passado. Depois de concluída a reforma ministerial, a ordem é tentar colocar em pauta uma agenda positiva. Amanhã, o presidente viaja para o Rio Grande do Sul, onde fica dois dias. Vai visitar obras da refinaria Alberto Pasqualini e da duplicação da BR-101. Lança também um consórcio universitário. Na próxima semana, está prevista uma agenda bem familiar: a ida do presidente a Garanhuns, sua cidade natal no interior de Pernambuco, para lançamento regional do Plano Safra. O cientista político Marcos Coimbra, diretor do Instituto Vox Populi, avalia que, ao se aproximar de sua base social, o presidente pode nem estar seguindo uma estratégia consciente, mas apenas seguindo o "impulso natural" das pessoas que se sentem acuadas - de se voltar para o que lhe é mais familiar. "Na hora em que o presidente se volta para esses temas, de sua história de vida, ele mostra suas semelhanças com o povo", ressalta Coimbra. "As pessoas ainda apóiam o presidente muito mais porque há um sentimento de carinho por ele do que pelos resultados da economia." Nos discursos, quando fala sobre as denúncias de corrupção, reitera a defesa de todas as investigações, sempre reforçando, de uma forma simples e direta, que não está envolvido, apelando para sua trajetória de vida. Na visita às obras do aeroporto, ontem, Lula fez seu pronunciamento ao lado de Francisco Cavalcante, o funcionário da Infraero que achou US$ 10 mil dólares perdidos no aeroporto e devolveu o dinheiro ao seu dono, um suíço. "Gestos como esse engrandecem a figura humana, porque com todas as denúncias que acontecem no Brasil, se tivéssemos 180 milhões de Franciscos, certamente o dinheiro do Brasil daria para a gente fazer muito mais coisas para o povo pobre deste país." O presidente também faz questão de destacar, em seus contatos com esse público, as realizações do governo, e faz questão de comparar com o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, como fez ontem: "Em oito anos do governo que eu substitui, a média mensal de emprego de carteira assinada era de 8 mil por mês. No nosso governo, a média é de 104 mil, ou seja 12 vezes mais."