Título: Salvaguarda para TV contraria OMC
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 27/10/2004, Brasil, p. A-3

As salvaguardas impostas pelo governo da Argentina para os televisores brasileiros estão infringindo as regras do Mercosul e da Organização Mundial de Comércio (OMC). Estudo realizado pelo Departamento de Comércio Exterior do Brasil (Decom), do Ministério do Desenvolvimento, demonstra que as exportações de televisores provenientes da Zona Franca de Manaus não provocaram "dano grave" à indústria do país vizinho. Para o governo brasileiro, a baixa utilização da capacidade instalada e o desemprego na indústria de televisores da Argentina são resultados da crise enfrentada pelo país. O documento do Decom será a base da argumentação do setor privado brasileiro. Os fabricantes nacionais de televisores enfrentam hoje, em Buenos Aires, audiência pública do processo. A delegação brasileira é formada por representantes das empresas que exportam TVs para a Argentina: Philips, Sony, Panasonic e CCE. O grupo também conta com um técnico do Decom. A Argentina impôs tarifa de importação de 21,5% - hoje em 20% - para os televisores da Zona Franca de Manaus em julho. Em um caso de salvaguarda, a tarifa é imposta preventivamente e o processo tem até nove meses para ser concluído - ou seja, março de 2005. Segundo o estudo elaborado pelo Decom, ao qual o Valor teve acesso, o processo movido pela Argentina está cheio de incongruências. A tarifa é aplicada apenas para os produtos da Zona Franca de Manaus. Pelas regras da OMC, não é possível discriminar países ou regiões na aplicação de uma salvaguarda. A Argentina ainda não delimitou um plano de ajuste para o setor privado - uma das exigências do processo de salvaguarda. O mais importante, contudo, é que não existe uma relação de causalidade entre as perdas da indústria argentina e as importações do Brasil. "Não se pode atribuir ao produto originário da Zona Franca de Manaus a queda no consumo aparente na Argentina, o aumento nos estoques, o custo laboral das empresas", diz o Decom. Em 2003, a Argentina importou 58,3 mil televisores de Manaus. O volume é bastante superior aos 5 mil aparelhos de 2002, mas ainda inferior às 86,37 mil unidades de 2001. Nesse período, aumentou muito a participação das importações provenientes do Brasil em relação à produção da Argentina. Essa relação saiu de 7,2% em 2001e atingiu 17,5% em 2003. Na avaliação dos técnicos brasileiros, esse fato é conseqüência direta da forte queda da produção argentina, que desabou de 1,2 milhão de aparelhos em 2001, para 332 mil em 2003. Apesar de convicto de que a salvaguarda contraria as normas da OMC, o Brasil ainda não está disposto a apelar à principal instância regulatória do comércio mundial. Segundo Paulo Saab, presidente da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), o país só deve recorrer à OMC se a Argentina, no fim do processo, mantiver as tarifas. "Ainda acreditamos que o governo argentino reconhecerá que errou", diz Saab, ressaltando que é preciso retirar a tarifa o mais rápido possível. O executivo pretende fazer esse apelo ao governo argentino e, se não for atendido, diz que recorrerá à justiça local. O governo também prefere a negociação. Segundo o Mdic, haverá nova reunião do comitê de monitoramento do Mercosul em novembro.