Título: Caixinha para a campanha
Autor: Herdy, Thiago
Fonte: Correio Braziliense, 19/04/2010, Política, p. 7

Deputados de Minas usam verbas da Assembleia Legislativa para adiantar o pagamento a gráficas de despesas para as eleições deste ano

Gráficas que receberam nos últimos meses recursos oriundos da verba indenizatória da Assembleia Legislativa de Minas Gerais já fazem uma espécie de ¿caixinha¿ para bancar gastos dos deputados na campanha de 2010. Sem saber que eram gravados, os donos de duas empresas que estão entre as que mais receberam dinheiro público a título de divulgação parlamentar admitiram que parlamentares já adiantam o pagamento de despesas das eleições de outubro, o que contraria a legislação eleitoral. Há indícios de que parte da verba da Assembleia seja usada para este fim. O empresário Ângelo Buldrini de Souza, 44 anos, é dono da Gráfica e Editora Expressa Ltda., a segunda que mais recebeu recursos de verba indenizatória entre julho de 2009 e janeiro de 2010: R$ 257,5 mil, atrás apenas da Máxima Comércio. O endereço da empresa cadastrado na Receita Federal é um galpão vazio, na Rua João Carlos, 264, no Horto, em Belo Horizonte. O endereço real fica na rua de baixo, no mesmo bairro, onde a firma se apresenta com outro nome: Bigráfica. É lá que Buldrini trabalha e mantém uma grande estrutura e maquinário, que funciona 24 horas por dia. Quando perguntado sobre como estavam os preparativos para a campanha eleitoral, pensando que falava com um assessor parlamentar, o empresário soltou: ¿Eu tenho feito até uma, como assim dizer, caixinha, para não ficar pesado, sabe? Desde agosto vêm pagando R$ 2 mil, R$ 3 mil, R$ 4 mil, R$ 7 mil por mês, aí tem uns 12 deputados assim¿, afirmou, preferindo não dizer o nome dos parlamentares. Ângelo explicou que aqueles que participam da ¿caixinha¿ fazem uma carta de crédito, com base nos valores da tabela de preços da gráfica. ¿Uns já têm R$ 20 mil, outros R$ 40 mil¿, diz o empresário, que há 30 anos trabalha com gráficas e política, sempre torcendo para todos os candidatos, segundo ele. ¿Só não dei sorte com o PMDB. Hoje eu rodo tudo do PSDB, do PT, do PV¿, gaba-se. No pátio da gráfica há desde informativos do PT a livro comemorativo do centenário de Tancredo Neves. Ainda pensando que falava com um assessor, ele desconversou quando perguntado se era possível usar recursos da verba indenizatória para a ¿caixinha¿. ¿Não, aí deputado só coloca uma gordurinha aqui, outra ali¿, afirmou. Seis deputados contrataram a Gráfica Expressa com uso de verba indenizatória nos sete meses analisados. Os que mais gastaram foram Juarez Távola, do PV, R$ 82,8 mil, e Rêmulo Aloise, do PSDB, R$ 82,6 mil. Os dois deixaram o posto no início deste ano para dar lugar a parlamentares que integravam o secretariado do governo estadual. Mesmo emitidas em datadas diferentes, várias notas apresentam numeração seriada, fato estranho para uma gráfica de grande porte, que funciona por 24 horas. A nota mais cara foi apresentada por Távola (PV) em 30 de novembro, ao custo de R$ 58,5 mil. É a nota mais cara apresentada por um deputado no período analisado. Buldrini não é o único que já recebe recursos para campanha. ¿Tem uns deputados aí que já estão até adiantando um dinheiro para comprar papel e deixar estocado¿, disse Renê Aparecido Fraga, dono da gráfica Papelform Editora, no Bairro São Francisco, em BH, sem saber que era gravado. Desconfiado, ele evitou dizer os nomes dos parlamentares que adiantam recursos. ¿Não sei se você sabe¿, continuou ele, ¿mas pelo TRE (Tribunal Regional Eleitoral) não se pode gastar. Mas a gente pode fazer uma nota menor, pode fazer uma nota num valor maior, isso depende muito¿, afirmou.

Só a nota Com didatismo, Renê explicou como produzir a nota com recursos da Assembleia. O caminho seria forjar a produção de um jornal. ¿Nós vamos fazer uma arte dele, uma coisa simples. Você vai pegar, nós vamos tirar uma cópia com papel couché e anexar junto com a nota. O jornal não vai acontecer. O que vai acontecer é a nota¿, disse. Realizada a manobra, o deputado pode usar o dinheiro a seu gosto. ¿Se quiser comprar papel, se quiser pagar um serviço, você faz o que quiser, para tudo o que você quiser, pode¿. O pagamento deve ser feito em dinheiro. Na receita, a empresa de Renê está cadastrada como especializada no comércio atacadista de artigos de escritório e papelaria, o que não corresponde à sua verdadeira atividade, a produção gráfica. No período analisado pelo EM, três deputados apresentaram seis notas que, somadas, alcançaram R$ 55 mil. O slogan da empresa é ¿sua melhor impressão é o nosso papel¿. Eu tenho feito até uma, como assim dizer, caixinha, para não ficar pesado, sabe? Desde agosto eles pagam R$ 2 mil, R$ 3 mil, R$ 4 mil, R$ 7 mil por mês, aí tem uns 12 deputados assim¿ Ângelo Buldrini, dono da Gráfica e Editora Expressa, segunda empresa que mais recebeu recursos por serviços pagos com verba indenizatória da Assembleia Legislativa de Minas Gerais