Título: Sob ameaça de cassação, Costa Neto renuncia
Autor: Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 02/08/2005, Política, p. A5

Crise Presidente do PL diz que dinheiro recebido do PT destinava-se a ajudar as campanhas de seu partido

Ao renunciar ontem a seu mandato de deputado federal, Valdemar Costa Neto (SP), presidente nacional do PL, expôs ainda mais o PT e colegas parlamentares que receberam caixa 2 para campanhas eleitorais ou que foram envolvidos no suposto esquema do mensalão - pagamento em troca de apoio a projetos do governo -, gerando a expectativa de que pode estar aberta a temporada de renúncias no Legislativo. O deputado, em discurso, confessou ter recebido recursos do PT "para compromissos de campanha de 2002", que não foram declarados, ou seja, caixa 2. "Posso garantir que os recursos que o PL recebeu do PT não serviram para pagar mesada a deputados", assegurou. Costa Neto tentou livrar correligionários de qualquer responsabilidade por recebimento "de dinheiro do PT", mas, no meio político, a avaliação é que nenhum parlamentar será poupado de dar respostas às denúncias. Valdemar Costa Neto foi a Belo Horizonte no sábado avisar o vice-presidente José Alencar (PL) da decisão. Alencar o perguntou se não havia outra alternativa. O vice-presidente tem dito a interlocutores que agosto será o pior mês da crise, e que decidirá em setembro se fica ou não no PL. A renúncia soou, para alguns, como confissão de culpa, sobretudo por ter ocorrido no mesmo dia em que a diretora financeira da SMP&B, Simone Reis Vasconcelos, prestava depoimento à Polícia Federal. A CPI Mista dos Correios já comprovou que vários parlamentares fizeram saques nas contas da SMP&B, do empresário Marcos Valério de Souza. O empresário fez empréstimos em bancos para o PT saldar dívidas. Simone Vasconcelos, que presta hoje depoimento à CPI, é peça-chave na investigação porque controlava a lista de quem poderia fazer saques. Apesar de Valério e o PT alegarem que os recursos foram utilizados apenas para campanhas e terem confessado o caixa 2, integrantes da CPI mantêm a suspeita de que o dinheiro pode ter sido utilizado para outros fins, como o mensalão. Outra razão que pode explicar a renúncia de Costa Neto, conforme parlamentares, é que havia a expectativa na Câmara de que o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) protocolasse hoje no Conselho de Ética um pedido de abertura de processo de cassação de quatro ou cinco deputados, incluindo Costa Neto. Jefferson o acusou de receber e operar o mensalão. A partir da abertura do processo, o parlamentar não pode renunciar. A cassação gera a perda de direitos políticos por oito anos. Já a renúncia não impede que Costa Neto dispute eleições no próximo ano. Roberto Jefferson, segundo sua assessoria, não protocolará nenhum processo hoje. "Admito que recebi esses recursos (do PT). Entretanto, por direito, esses valores se destinavam, especificamente, aos compromissos da campanha da aliança PT-PL. Neste momento, assumo a única e absoluta responsabilidade por esse ato. Isto quer dizer que nenhum membro do Partido Liberal pode ser responsabilizado pelo que foi decidido ou praticado por mim", afirmou Costa Neto. Ele disse que nunca suspeitou da "origem dos recursos" que o PL recebeu do PT. "Reconheço que fui induzido ao erro quando aceitei receber recursos destinados à campanha, sem a devida documentação que oficializasse a doação", disse ele. O presidente do PL afirmou ainda que não tem como comprovar a origem do dinheiro e muito menos o destino, pois não exigiu recibos ou notas fiscais dos credores: "Aceitei a pressão dos credores e concordei em fazer os pagamentos informalmente". Conforme interlocutores do ex-deputado, ele recebeu o dinheiro como pessoa física, e fará ratificações à Receita Federal. Costa Neto disse a jornalistas que dará novas explicações, incluindo o valor global do acordo com o PT. Ontem, ele limitou-se a fazer um discurso na tribuna da Câmara. "Ele ainda tem muita coisa para falar", disse um interlocutor de Costa Neto, que mostra mágoas com o PT. O deputado protocolou pela manhã na Mesa Diretora da Câmara a renúncia, a fim de evitar que correligionários o demovessem da idéia. Interlocutores do parlamentar admitiram que havia pressão "dentro e fora do PL" para Costa Neto selar um acordo com Jefferson: o PL, que protocolou no Conselho de Ética o pedido de cassação do ex-presidente do PTB, desistiria de levar o caso adiante. Em troca, Jefferson desistiria de processos contra membros do PL e outros. Ontem, Costa Neto fez uma adendo à representação contra Jefferson, dizendo que ele mentiu no seu depoimento ao conselho e utilizou-se do cargo para obter vantagens indevidas de empresas públicas. O presidente do PL foi orientado por advogados ao tomar a decisão de renunciar. Somente à tarde, no plenário da Câmara, o presidente do PL - que permanece à frente da legenda - tornou pública a decisão. Antes do discurso, Costa Neto telefonou para o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP). "É um desmentido contundente para quem imaginava que um acordão estava em curso", disse Chinaglia. O líder do governo reconheceu, também, que Costa Neto "cravou contra o PT". "Vai aumentar mais um item na pauta de explicações que o PT tem que dar", admitiu o petista. Para Chinaglia, como saques das contas da SMP&B já foram comprovados, seria "uma loucura" alguém querer negar que recebeu dinheiro. O petista preferiu não analisar se o caixa 2 pode significar quebra de decoro parlamentar sob o ponto de vista jurídico. "Do ponto de vista da opinião pública, o caixa 2 é inaceitável", concluiu. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi informado da renúncia durante evento no Sindicato dos Taxistas de Brasília. (ver página A7). (Colaborou Taciana Collet)