Título: BNDES quer intensificar as operações de microcrédito
Autor: Vera Saavedra Durão
Fonte: Valor Econômico, 02/08/2005, Finanças, p. C3

Financiamento Banco tem 25 pedidos para liberar, no total de R$ 59 milhões

Após dois anos fora desse mercado, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) voltou em abril a atuar com microcrédito. Maurício Borges Lemos, diretor da área social da instituição de fomento, relatou ao Valor que o BNDES já tem uma carteira de 25 pedidos, correspondente a R$ 59 milhões - superior aos R$ 43 milhões liberados ao longo de sete anos de existência do programa no banco. Agências de fomento, cooperativas de crédito, OSCIPs, Sociedades de Crédito do Microempreendedor (SCMs) e bancos repassam os recursos do BNDES destinados ao microcrédito, em empréstimos que vão geralmente para trabalhadores informais do setor de serviços. O dinheiro para as instituições não-bancárias vai custar TJLP, mais 0,5% ao ano e taxa de risco de 1% ao ano, com prazo de 96 meses e 24 de carência. O juro cobrado ao tomador final será de TJLP mais 4% ao mês, com limite máximo de empréstimo de R$ 5 mil, para capital de giro ou investimento fixo. "Eles (os repassadores) queriam uma taxa para os empreendedores entre 4,5% a 5%, mas consideramos 4% razoável", explica Lemos. Durante a gestão de Carlos Lessa o microcrédito ficou praticamente parado no BNDES, principalmente em 2003 e 2004, pois houve endurecimento em relação às garantias dos repassadores - só eram aceitas garantias reais - e por conta do juro baixo de 2% ao mês cobrado ao tomador final. "O resultado foi que o programa não rodou", diz Lemos. Na época, só foi aprovada uma operação, para o Banco do Povo de Sergipe. Essa atitude da direção do banco, na época, decorreu de um balanço da atuação do microcrédito nas gestões anteriores - o microcrédito foi instalado no BNDES em 1996, durante o governo FHC -, no qual se verificou que pelo menos 50% dos recursos do programa foram desviados para o mercado financeiro, para compras de CDIs, sob o argumento de falta de demanda, contou Lemos. O diretor considera que o microcrédito na gestão FHC "era um factóide". Segundo ele, o programa não tinha nenhum critério de aplicação, não tinha plano de negócios, "nem mesmo uma versão tosca". Além disso, o dinheiro era barato, cobrava-se apenas TJLP aos repassadores, que podiam cobrar até 6% de juros ao tomador final e não havia exigência de garantias, revelou. Para amarrar bem o novo programa e evitar inadimplência ou desvio de aplicações dos recursos, o BNDES definiu que as instituições repassadoras terão de apresentar um plano de negócios, definindo seu foco de atuação, para fazer jus ao dinheiro oficial, e vão precisar comprovar que pelo menos 80% dos recursos liberados estão em sua carteira ativa, aplicados em projetos de microcrédito. As instituições repassadoras são obrigadas também a apresentar garantias reais, ou através de recebíveis (carteira das instituições). No caso do tomador final, as OSCIPs poderão trabalhar com o "aval solidário" - geralmente grupos de empreendedores que se conhecem e se avalizam mutuamente, o que constrange e inibe o calote. O BNDES pretende trabalhar para ampliar o microcrédito no país, cujo estoque soma atualmente R$ 150 milhões, podendo chegar a um fluxo de R$ 300 milhões. O ideal, na avaliação de Lemos, é que o mercado nacional trabalhe com um estoque de R$ 1 bilhão em microcrédito. "O BNDES vai tentar ser relevante no microcrédito, mas não vai resolver sozinho a carência desse crédito", pondera o diretor. "Vamos atuar junto com outros bancos, como Banco do Brasil e Banco do Nordeste (que tem uma carteira de R$ 65 milhões)." Os planos de Lemos começam por deslanchar a atual carteira do microcrédito, que até agora não teve nenhum projeto aprovado. Na nova carteira do banco existem dois projetos em análise (da Caixa do Rio Grande do Sul, uma agência de fomento local) e a Credisol, também gaúcha. Tem mais 10 projetos enquadrados, oito em consulta e cinco em perspectiva. Neste momento, a área de microcrédito, que é tocada pela chefe do Departamento de Economia Solidária do BNDES, Ana Cristina Rodrigues da Costa, está trabalhando para aumentar a capilaridade da instituição de fomento, criando uma estrutura de repassadores que Lemos denomina de "segundo piso", formada pelos agentes financeiros do banco, como o Banco do Brasil, para repassar o microcrédito, além das OSCIPs, SCMs e agências de fomento. "Vamos criar uma rede maior de atuação. No primeiro piso estão as instituições já mencionadas, mas vamos aumentar a escala dessa operação e o setor privado também vai fazer parte dessa expansão. Nossa vocação será de atacadista", explicou.