Título: BC mostra que a medida teria efeito limitado
Autor: Chico Santos
Fonte: Valor Econômico, 03/08/2005, Finanças, p. C2

Um controle tradicional de capitais, conforme proposto pelo deputado Delfim Netto (PP-SP), teria efeitos limitados para conter a valorização da taxa de câmbio. Dados do balanço de pagamentos, divulgados pelo Banco Central, mostram que, mais do que capitais especulativos, os dólares que estão irrigando o mercado são provenientes de fontes como exportações e investimentos diretos. As posições de estrangeiros para ganhar com as diferenças entre juros internos e externos estão se concentrando sobretudo no mercado futuro. "Não tem sentido limitar o ingresso de algo que já não está ingressando", disse o ex-diretor do BC Luiz Fernando Figueiredo, hoje na Mauá Investimentos. Na época do câmbio quase fixo, quando o país atraía altas somas de capitais especulativo, os dólares entravam principalmente para serem investidos em títulos de renda fixa negociados no país. No primeiro semestre deste ano, porém, entraram apenas US$ 263 milhões para essa finalidade. Outra fonte importante naquela época eram as captações de empresas e bancos no exterior. No primeiro semestre, porém, houve mais saídas do que ingressos em bônus privados (US$ 559 milhões) e notes e commercial papers (US$ 849 milhões). O movimento foi positivo apenas em títulos de curto prazo, em que houve ingresso líquido de US$ 663 milhões. São bem mais expressivos os fluxos de capitais ligados a atividades produtivas. É o caso do ingresso líquido de investimento estrangeiro direto, que somou US$ 8,566 bilhões. Ou dos investimentos em ações, seja na Bolsa brasileira ou por meio de ADRs (negociadas nos EUA), com US$ 2,510 bilhões. "Não é possível negar que estão entrando dólares no país também porque os fundamentos da economia são favoráveis", avalia Sérgio Goldenstein, também ex-integrante do BC e hoje na ARX Capital Management. O fluxo mais importante de dólares que irriga o mercado, porém, não se origina da conta financeira e de capitais - ele vem das exportações, que têm mantido a conta corrente positiva. O saldo comercial no primeiro semestre foi de US$ 19,667 bilhões, volume mais do que suficiente para cobrir os gastos com serviços e renda. Incluindo as transferências unilaterais, o saldo em conta corrente é positivo em US$ 5,184 milhões no semestre. As exportações, por outro lado, pouco tem a ver com ganhos de arbitragem que exportadores possam ter entre juros internos e externos, por meio de operações de Adiantamento Contrato de Câmbio (ACCs). Essas operações chegaram a US$ 17,606 bilhões no primeiro semestre de 2004, o que representa 45,69% dos contratos de cambio para exportação no período; no primeiro semestre de 2004, os ACCs representavam 48,99% dos contratos de câmbio da mesma época. Diferentemente do que aconteceu no passado recente, os investimentos especulativos de estrangeiros no país estão ocorrendo pelo mercado futuro. Há dois indicadores que ajudam a medir a dimensão desse fenômeno. Um deles é a soma das posições líquidas de investidores institucionais estrangeiros na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) no mercado futuro de cupom cambial e no mercado futuro de dólar - anteontem eram 139 mil contratos, o que representa um volume de US$ 6,942 bilhões. Outro termômetro são as posições líquidas dos investidores institucionais estrangeiros no mercado futuro de taxa de juros. Anteontem, eram 911 mil contratos, o que equivale a um volume financeiro de R$ 91,1 bilhões. Esses dois conjuntos de números mostram, em resumo, que investidores estrangeiros - sobretudo Hedge Funds - tem montado posições no mercado futuro para lucrar com as altas taxas de juros dentro do país. Não é um evento desprezível. A grande oferta de moeda estrangeira no mercado futuro tem influência sobre a cotação no mercado de dólar à vista, provocando a apreciação do câmbio. E, no caso de uma crise econômica, teriam efeitos desestabilizadores, porque haveria uma corrida para encerrar posições. "É um risco que existe", afirma Goldenstein. Mais do que controle de capitais, portanto, a medida que faria efeito para impedir a depreciação do câmbio seria impedir a atuação de estrangeiros em derivativos. A ausência de investidores estrangeiros no mercado futuro, porém, teria conseqüências negativas para a administração da dívida pública. Primeiro, porque é o apetite dos investidores estrangeiros por reais que tem permitido ao BC e ao Tesouro reduzir o estoque de dívida vinculada ao dólar. Segundo, porque cresce entre esses investidores o interesse por contratos em reais com prazos mais longos - o que cria um ambiente favorável para o Tesouro alongar sua dívida mobiliária prefixada.