Título: Tesoureiros defendem fiscalização
Autor: Caio Junqueira
Fonte: Valor Econômico, 01/08/2005, Política, p. A8

Resgatada em meio à crise como solução para os defeitos do sistema político-eleitoral brasileiro, a reforma política aguarda na Mesa da Câmara determinação do presidente da Casa, Severino Cavalcanti (PP-PE) para que seja levada ao plenário. Porém, a eficácia no combate ao caixa 2 de um dos seus pontos mais polêmicos, o financiamento público das campanhas eleitorais, é questionada pelos tesoureiros dos maiores partidos do país. Eles afirmam que o real problema do sistema está na falta de fiscalização e na deficiência dos instrumentos de controle da Justiça para coibir esse hábito. O tesoureiro do PP, deputado Leodegar Tiscoski (SC), é um dos mais céticos. Para ele, além da incapacidade de fiscalização, o caixa 2 está enraizado na cultura política brasileira. "Dentro da realidade da nossa cultura e da dificuldade dos mecanismos para fiscalizar, acredito que, na prática, é muito difícil haver rigor na fiscalização. O que impedirá alguém que tenha dinheiro de gastá-lo e continuar a fazer o que sempre foi feito? A compra do voto vai continuar, não haverá mecanismos de fiscalização possíveis para coibir essa cultura". O catarinense diz ainda que não é o momento adequado para a adoção do financiamento público e sugere até uma exarcebação do atual modelo. "Uma das formas possíveis é oficializar o caixa 2, como nos EUA. Com isso, pelo menos fica na realidade. Quem dá o dinheiro assume." O tesoureiro pefelista Saulo Queiroz compartilha a mesma opinião do pepista. De acordo com ele, não há um instrumento capaz de impedir manipulação de caixa 2 em eleição, qualquer que seja o modelo. "No sistema público, você vai gastar um horror de dinheiro do governo e de alguma forma não tem garantia de que não continuará existindo caixa 2 na eleição. Não tem muito como fazer isso, simplesmente porque alguém pode doar um recurso de caixa 2 em espécie. Há uma burla à Constituição, mas é de difícil comprovação. Diria mesmo que, em condições normais, é impossível fiscalizar." Queiroz até acredita que o sistema público seja mais viável que o privado, mas afirma que ele deve vir acompanhado de medidas que fortaleçam os partidos. Na verdade, a reforma política aprovada na CCJ no final de junho estabeleceu uma gama de medidas cujas metas são tornar os partidos brasileiros mais fortes do que seus integrantes. A própria sistemática do financiamento público segue essa linha. Os recursos destinados a ele serão incluídos no Orçamento com valores equivalente ao número de eleitores do país. Para chegar ao valor, multiplica-se por R$ 7 o número de eleitores existentes em 31 de dezembro do ano anterior. Hoje, por exemplo, com cerca de 115 milhões de eleitores no país, o valor destinado à campanha ficaria por volta de R$ 805 milhões, dos quais 1% seria dividido entre todos os partidos registrados no TSE, 14% entre os partidos com representação na Câmara e 85% entre os partidos, proporcionalmente ao número de representantes que elegeram na última eleição. Assim, em tese, o dreno dos recursos para a campanha eleitoral seria obtido diretamente pelos partidos, sem a aquisição privada realizada hoje, individualmente, pelos candidatos. Além disso, os eleitores não mais votarão em candidatos específicos, mas sim, em um partido, que terá uma lista pré-ordenada preferencial. O deputado João Almeida (PSDB-BA), responsável pelas finanças do seu partido, crê que no sistema de lista fechada há um avanço no combate ao caixa 2, na medida em que será indiferente um candidato conseguir arrecadar mais ou menos recursos, já que terá mais importância sua colocação na lista partidária. Sobre financiamento, ele considera o modelo público mais adequado, mas também afirma que tão importante quanto ele é uma fiscalização adequada e eficiente. "Mais importante do que o financiamento ser público ou privado é termos um sistema controlável em relação aos gastos de campanha." Outro entusiasta do modelo público, o cearense José Pimentel, deputado federal e tesoureiro do PT, afirma que o sistema de fiscalização deve ser alterado totalmente. "Como hoje a prestação de contas das eleições é única e feita após a conclusão do processo eleitoral, teria de ter uma prestação mensal durante todo o processo eleitoral e, ao mesmo tempo, alterar os procedimentos judiciais, reduzindo os prazos de instrução processual para a cassação de registro de candidaturas por abuso de poder econômico. Atualmente, leva de 8 a 10 anos para julgar um processo desses, e, na sua maioria, quando ele é julgado, o mandato do candidato eleito já expirou." O Valor tentou por uma semana ouvir a tesoureira do PMDB, Mônica Oliveira, mulher do ex-ministro das Comunicações Eunício Oliveira, mas não foram dados retornos às solicitações de entrevista.