Título: O segredo dos fundos de pensão
Autor: John F. Wasik
Fonte: Valor Econômico, 01/08/2005, Opinião, p. A11

Se você estivesse trabalhando numa empresa ou investisse nela, não iria querer saber quanto dinheiro a companhia está alocando a seu plano de pensões? Alguns membros do Congresso norte-americano conhecem a resposta, embora não a revelem. Se fossem divulgados, esses números poderiam afetar as classificações de crédito de companhias, suas valorações de mercado e a contabilização de quanto dinheiro está realmente sendo destinado a planos de pensões de benefícios determinados. Em alguns casos, os números mais precisos disponíveis são muito mais baixos do que os obtidos em relatórios anuais "10-K", que a maioria das companhias de capital aberto encaminham à Comissão de Valores Mobiliários americana (SEC). Segundo uma estimativa do Birô de Orçamento do Congresso, somente metade do déficit de US$ 450 bilhões nos planos de pensões foram comunicados a investidores em documentação pública anualmente encaminhada às agências fiscalizadoras do mercado acionário. Os denominados "dados 4010" revelam quanto uma companhia estaria devendo a seu plano de pensões, se fosse encerrado no fim de 2004. Devido a brechas na lei, as empresas podem apresentar um quadro muito mais róseo a seus investidores e ao público em geral sobre a alocação de recursos a seus planos de pensões, o que sugere a existência de dois conjuntos de livros contábeis. Membros da Comissão de Educação e Mão-de-Obra da Câmara dos EUA, ao examinar dados sobre os esquemas de pensões de 850 grandes de companhias capital aberto, verificaram que menos de 75% delas estão fazendo o devido aporte de recursos em seus planos de pensões. Entretanto, eles não divulgaram a informação e não se sabe se ela será tornada pública por uma legislação ainda não em vigor. A Pension Benefit Guaranty Corporation (PBGC), agência americana que garante os planos de pensões de benefício determinado e é a fonte dos dados 4010, usa as informações para estimar quanto teria de pagar em benefícios caso uma companhia encerre suas atividades ou seu plano. A agência é seguradora de benefícios para 41 milhões de americanos em mais de 30 mil programas - e está em dificuldades. Ela acumula um déficit de US$ 23 bilhões e teve de cobrir US$ 14,7 bilhões em encerramentos de planos apenas no ano passado. Kevin Smith, um porta-voz da comissão da Câmara, disse que um projeto de lei aprovado pela comissão - a Lei de Proteção a Pensões - revelará a maior parte dos dados 4010, embora isso possa acontecer apenas de forma parcial ou resumida. Um projeto de lei similar em tramitação na Comissão de Finanças do Senado pretende a revelação integral de informações dos fundos de pensões. No passado, os dados foram divulgados pela agência seguradora das pensões. Isso foi embaraçoso para as companhias com planos deficitários. O Congresso então mudou a lei para restringir o acesso aos dados 4010 aos fundos de seguro e membros do Congresso. Embora o tamanho do déficit não seja público, a PBGC estimou que o "buraco" nos planos de aposentadoria é de cerca de US$ 353 bilhões, em comparação com US$ 279 bilhões em 2003. O déficit nos planos de pensões tornou-se uma questão de segurança crucial para as aposentadorias. Das 369 companhias computadas no Índice 500 da Standard & Poor´s que têm planos de pensões tradicionais, a S&P estima que o montante total a descoberto foi de US$ 164 bilhões em 2004.

Embora números não sejam públicos, a seguradora dos planos estima que de US$ 353 bilhões deixaram de ser aportados pelas companhias

Muitas companhias estão com dificuldades para custear e manter seus planos. O número de grandes companhias que congelaram ou encerraram seus fundos de pensões quase dobrou, para 71, no ano passado, em comparação com 39 em 2002, segundo a Watson Wyatt Worldwide, uma firma de consultoria de Nova York especializada em benefícios. Em virtude de a legislação permitir que as companhias declarem valores inferiores aos que efetivamente têm acumulado de déficits, funcionários e investidores são por vezes vítimas de uma desagradável surpresa, quando uma empresa sofre um colapso ou encerra um plano de pensões. A agência descobriu diversos casos onde as companhias deviam a seus planos de pensões bilhões de dólares a mais do que informavam publicamente. Consideremos o que aconteceu quando a UAL Corp, controladora da United Airlines, deu entrada com um pedido de concordata em dezembro de 2002 e abandonou seu plano de benefícios definidos, produzindo o maior colapso de um plano de pensões na história dos EUA. Exigiu-se que a UAL pagasse apenas US$ 75 milhões em prêmios de seguro à PBGC, à qual coube a responsabilidade pelo buraco de US$ 9,8 bilhões no plano de pensões da companhia aérea. Os trabalhadores vinculados a planos de pensões assumidos pela seguradora receberão apenas um máximo de US$ 45.613 por ano em benefícios, aos 65 anos de idade, não importa quanto lhes havia sido prometido - e apenas se eles tiverem contribuído integralmente com sua parte. Milhares de trabalhadores poderão receber muito menos - ou até nada -, dependendo dos anos de serviço e nível salarial. O congressista George Miller, um democrata da Califórnia e um dos principais membros da minoria na Comissão de Educação, quer tornar públicos os dados 4010. O fornecimento de informações adicionais sobre os planos de pensão seria uma favorável ou desfavorável aos investidores e funcionários? Laura Rosenberg, ex-executiva da PBGC, hoje na Fiduciary Counselors Inc., uma firma de consultoria com sede em Washington, questiona até que ponto seriam relevantes os dados 4010, porque "a maioria dos planos de pensões não são encerrados". Ela diz que pode ser mais importante avaliar quanto dinheiro uma companhia está aportando a seu plano de pensões e se este tem condições de continuar a cumprir suas obrigações. "Se uma companhia está mantendo seu fluxo de contribuições ao plano de pensões, não é tão preocupante", diz ela. Foram apresentadas ao Congresso diversas propostas de reforma para as atuais regras, muitas delas contidas na Lei de Proteção dos Fundos de Pensão. Não é fácil prever como a legislação avançará neste ano, tendo em vista o impasse na questão da Seguridade Social, um problema associado ao das pensões. Não há razões para que os déficits nos planos de pensão devam ser tratados como "roupa suja". Depois de revelada a situação real, poderemos enfrentá-la.