Título: Acordo evita quebra de sigilo dos fundos
Autor: Cristiano Romero
Fonte: Valor Econômico, 05/08/2005, Política, p. A7

Crise Deputada Denise Frossard denuncia "acordão" entre PT, PFL e PSDB para abafar investigações

Um acordo entre o presidente da CPI dos Correios, Delcídio Amaral (PT-MS), e deputados do PFL impediu ontem a quebra dos sigilos fiscal e bancário dos fundos de pensão patrocinados por empresas estatais. O requerimento de quebra de sigilo, feito por pefelistas, foi substituído por pedido de informação à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e à Secretaria de Previdência Complementar (SPC) sobre os investimentos dos fundos e suas operações com títulos públicos. Numa sessão tumultuada, a deputada Denise Frossard (PPS-RJ) denunciou o que chama de "acordão" entre PT, PFL e PSDB para abafar as investigações da CPI. O acordo sobre os fundos de pensão foi costurado ontem, durante café da manhã na casa do deputado José Carlos Aleluia (PFL-BA). Participaram do encontro, que provocou atraso de uma hora e 15 minutos no início dos trabalhos da CPI, o senador Delcídio Amaral e os deputados pefelistas Onyx Lorenzoni (RS), ACM Neto (BA) e Rodrigo Maia, além do anfitrião Aleluia. A negociação não foi fácil. Contrário à quebra do sigilo desde o início, o presidente da CPI alegou no café da manhã que a medida poderia provocar distúrbios no mercado financeiro, uma vez que apenas três fundos (Previ, Funcef e Petros), dos 11 ligados a estatais, movimentam mais de R$ 100 bilhões. Delcídio pediu o encontro com os pefelistas porque o requerimento de quebra do sigilo estava agendado para ser votado ontem pela Comissão. Como a oposição está dividida - o PSDB é contra a quebra de sigilo -, alguns pefelistas acharam melhor fechar acordo com o presidente da CPI. "Se tivesse ido à votação, o requerimento de quebra de sigilo dos fundos teria sido rejeitado", reconheceu Onyx Lorenzoni. Questionado sobre o acordo fechado com o presidente da CPI, o deputado ACM Neto adotou o tom do discurso que vem sendo feito por representantes do PT contrários à quebra de sigilo. "Nós temos responsabilidade com o país. Os fundos de pensão estão no centro dos investimentos financeiros do país", ponderou ACM Neto, ressalvando que, uma vez analisadas as informações a serem fornecidas pela CVM e a SPC, o PFL poderá solicitar a quebra de sigilo de fundos específicos. "Se detectarmos falhas, irregularidades, quebraremos o sigilo daquele fundo. Foi isso que ficou acertado", contou o deputado. O relator da CPI, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), explicou que há dúvidas jurídicas sobre a competência da Comissão para investigar os fundos. As informações sobre os investimentos dos fundos já são repassadas periodicamente à CVM e à SPC. O pedido, então, não configuraria investigação de informações confidenciais dos fundos e livraria a comissão de problemas jurídicos posteriores. "Houve um acordo mais produtivo porque vamos solicitar diretamente a quem pode esclarecer imediatamente nossas dúvidas", disse ele. Irritada com o atraso do início da sessão da CPI e desconfiada de possíveis acordos fechados nos bastidores da Comissão, a deputada Denise Frossard denunciou o "acordão", supostamente firmado entre partidos governistas e da oposição, para abafar as investigações. "A CPI está indo para o buraco. O cheiro de pizza está fedendo na sociedade porque há um grande acordo entre PT, PSDB e PFL", sustentou. A deputada afirmou que há falta de foco na CPI e atribuiu a esse problema a possibilidade de as investigações não avançarem. Ela criticou a convocação do policial Davi Rodrigues, responsável pelo transporte de milhões de reais das agências do Banco Rural para a sede da agência de publicidade SMP&B, em Belo Horizonte. "Não vou ouvir o carregador de mala. Esse trabalho é da polícia", bradou. Os integrantes do PT, do PFL e do PSDB, a começar pelo presidente da CPI, reagiram com veemência às críticas da deputada carioca. "Rejeito a afirmação de acordo. Não há nem haverá 'acordão'. Não fui procurado por ninguém para fazer acordo. A CPI não é chapa-branca", reagiu o senador Delcídio Amaral. "Não há cheiro de pizza." Em defesa de Frossard, pronunciaram-se apenas os senadores Heloísa Helena (PSOL-AL) e Jefferson Péres (PDT-AM). "Ninguém vai impressionar a sociedade brasileira com discursos. Temos a obrigação aqui de apurar os fatos dos Correios, propor medidas para coibir a corrupção naquele órgão e apurar os indícios de corrupção em todos os órgãos, mesmo que seja necessária a criação de novas CPIs", declarou Peres. "Não é delírio persecutório falar em pizza", disse Heloísa Helena. O pedido de informação aos fundos tem dois objetivos. O primeiro é verificar as aplicações de onze fundos de pensão ligados a estatais em fundos de investimento e títulos privados de bancos públicos e privados. Integrantes do PFL na CPI suspeitam que houve, no governo Lula, concentração de investimentos nos bancos BMG e Rural. O segundo objetivo é analisar as compras de títulos públicos pós-fixados indexados ao IGP-M e ao IPCA, no período entre janeiro de 2003 e junho de 2005. Segundo um integrante da CPI, um alto funcionário do Banco Rural informou que corretoras contratadas por alguns fundos para adquirir esses papéis forjaram prejuízos para as fundações e lucros para as corretoras, utilizando os recursos para financiar políticos e campanhas eleitorais. Um deputado da CPI revelou que pelo menos um grande fundo de pensão realizou três operações suspeitas com títulos públicos. No pedido de informação, o deputado Rodrigo Maia exigiu que a CVM e a SPC revelem a data de emissão dos papéis, a data de compra dos títulos, o prazo de vencimento, a taxa de juros e o preço unitário dos papéis. "Precisamos disso para averiguar a distorção de preço nas negociações dos papéis", justificou Maia. (Colaborou Thiago Vitale Jayme)