Título: Maia propõe que PFL e PMDB se unam para cassar Lula
Autor: Heloisa Magalhães e Chico Santos
Fonte: Valor Econômico, 05/08/2005, Especial, p. A12

Crise Para o prefeito do Rio, o PSDB está descartado porque teme correr riscos na sucessão de 2006

O prefeito do Rio, Cesar Maia, está certo que PSDB não avança na crítica ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva porque teme ser julgado negativamente pela população. Para o prefeito, o PFL deve buscar o PMDB para forçar o impeachment de Lula, reeditar a Aliança Democrática de Tancredo Neves e forçar um regime de transição para a sucessão do presidente que adote o parlamentarismo. Para isso, os dois partidos têm que envolver os governadores, que estão ausentes da crise. A seguir, a entrevista do prefeito ao Valor: Valor: O sr. vê chances de um grande abafa? Maia: A atitude do presidente Lula é de quem tem culpa. Quem não tem culpa, fica com uma atitude de indignação e tranqüilidade. Mas a ninguém interessa que o Lula saia. Não interessa às elites, à economia, à oposição. Tem tanta gente qualificada, com mandato ou sem mandato, que poderia formular uma transição que deixasse bem o país. As instituições brasileiras estão respondendo positivamente. A CPI está funcionando, a Justiça Federal, a Receita Federal, o Ministério Público... Não tem crise institucional, tem crise política. Não se pode improvisar num momento destes. Ele finge que faz uma reforma ministerial mas, na verdade, está construindo uma base de 180 deputados para evitar o impedimento. Ele não está querendo o apoio do PMDB. Ele não está querendo maioria para votar projeto de lei nenhum, ele está querendo uma minoria suficiente, de 171 ou 172 deputados, para evitar um processo de impedimento. São sinais que ele vai dando que não viram declaração, mas são perfeitamente traduzidos pelos políticos. O que o Lula está fazendo, muito mal assessorado, é um erro atrás do outro. Ele não tem esse poder de mobilização. O tema é péssimo: corrupção. Ele vai num caminho difícil, quando podia ser um gestor da transição. Valor: Como seria a transição? Maia: A transição pode existir com um processo de impedimento correndo desde que ele seja explicado. Uma discussão política no Congresso Nacional. O presidente pode perfeitamente conduzir o processo de transição. Comparando a transição entre os países sul-europeus, Espanha, Portugal, Grécia e Itália, com a América Latina, os países latino-americanos adaptaram o modelo norte-americano, onde o presidencialismo é muito rígido. Nos Estados Unidos, o presidente cai. No parlamentarismo europeu, o sistema é muito flexível. Pode ser um parlamentarismo presidencialista, pode ser um parlamentarismo de monarquia constitucional, pode ser um presidente inexistente como é o da Alemanha, pode ser um presidente forte, que usa os poderes que tem, como o da França. Pode ser um presidente que tem poderes e não usa, como o de Portugal. Só usa no caso de dissolução do parlamento. No Brasil, pode haver uma transição em que o presidente designa um primeiro ministro gerente. O próximo Congresso, eleito em outubro de 2006, designará o primeiro ministro. Ele poderia nomear como primeiro ministro Antonio Palocci, por exemplo, para dar garantias na área econômica. Valor: Esse quadro lembra a fase parlamentarista do governo João Goulart. No caso o Palocci seria Tancredo Neves e depois viria uma eleição com um regime parlamentarista? Maia: Tudo na eleição normal, não muda nada. Mas o tipo de parlamentarismo seria definido a partir de emenda constitucional. Uma proposta dessas teria que envolver todo mundo político. O presidencialismo e a República não são cláusulas pétreas da Constituição. Elas foram submetidas a plebiscito. Não pode ter um regime democrático em um país continental que não seja uma federação, isso é uma exigência. A federação brasileira está dilacerada. O governo Fernando Henrique foi naturalmente recentralizando o país e o governo Lula acentuou essa tendência de ruptura da federação. Valor: O que o sr. quer dizer? Maia: Como pode ter uma crise dessa na federação e seis governadores não se reúnam para dizer alguma coisa? Reunir o Jarbas Vasconcelos, Germano Rigotto, Geraldo Alckmin, Aécio Neves e que eles digam que a democracia brasileira não corre riscos. Eles não tem nada a dizer? Os governadores têm que participar apenas do processo pré-eleitoral? Participar da fulanização? Será que pacto político, pacto federativo se resume a dinheiro, aumentar a receita do Estado? Valor: O sr. está propondo que em 2006 tenhamos uma eleição parlamentarista?

O PSDB não quer correr risco. Seu líder está na clandestinidade. Raramente opina e quando o faz é de forma melíflua "

Maia: Não, eu estou dando um exemplo. É uma responsabilidade grande alguém individualmente querer propor alguma coisa. Valor: O sr. está levando essas idéias ao PFL? Maia: O que está se discutindo no PFL é de que maneira o partido se soma a outras forças políticas para intervir nesse processo. Intervir com idéias. A minha é de que deveria ser recosturada a Aliança Democrática entre o PFL e o PMDB. O presidente Lula não está fazendo é uma aliança com o PMDB, mas uma aliança com deputados e precisa de deputados fortes para constituir uma base que evite o impedimento. Acho que o PFL deveria se reaproximar do PMDB e discutir com o quadro que estamos vivendo, a partir da enorme experiência que os dois acumularam nessa transição. Por que PMDB e PFL e não o PSDB? É porque o PSDB é um filhote do PMDB. O PSDB ficaria de fora porque é um partido basicamente paulista, que foi gerado pelo PMDB. Acho que neste momento nós devíamos entender esse ciclo todo. Valor: Gerado pelo PMDB mas é um partido que elegeu o último presidente por dois mandatos. Maia: O PSDB sendo um partido competitivo para as eleições presidenciais, a contribuição que daria seria muito pequena. Neste momento não correria riscos, não avançaria propostas. Logo após o depoimento de Roberto Jefferson, numa reunião que não participei mas soube, os deputados do PSDB disseram a parlamentares do PFL que o presidente Fernando Henrique disse que o PT cometeu um erro em 1992, quando resolveu ser o paladino do impedimento de Collor. Segundo esses parlamentares, Fernando Henrique disse que isso tinha levado o PT a dar um abraço de afogado em Collor e ser visto com desconfiança em 1994. Agora, o PSDB não podia cometer esse erro. Não podia ser o instrumento de abertura de julgamento. O PFL é mais duro nas suas críticas. Quase acho que o líder do PSDB na Câmara dos Deputados, deputado Alberto Goldman, está na clandestinidade. Raramente ele opina, quando o faz é de forma melíflua. A orientação de FHC, que é um grande quadro, é que o PSDB não seja instrumento de esgarçamento desse processo, porque ele será o beneficiário. Se essa é a posição do PSDB, o partido não pode ser parte de um processo que tem que ser ativo, tem que fazer propostas. Valor: Quais as bases para o relançamento da aliança PFL-PMDB? Maia: Tenho um vídeo do Flávio Marcílio no velório do Tancredo Neves onde ele fala das relações de amizade e respeito. E o repórter pergunta como o ele via o presidente Tancredo Neves como líder dessa transição democrática. Ele respondeu: "Aí o sr. está enganado, o líder foi o presidente Figueiredo. Foi ele que produziu esse processo". Não foi o presidente Figueiredo, mas foi ele como instituição: Golbery, Figueiredo, Geisel. Mas Marcílio sabe que o processo foi induzido pelos militares. O Tancredo foi o político capaz de neste processo coordenar a candidatura vitoriosa, mas não é o engenheiro da transição democrática e sim da vitória. Quando você vai lá trás e vê a decisão tomada pelo José Palmeira, Bornhausen, José Agripino, Marco Maciel, tem dois grupo dentro do PDS um querendo retardar a transição e outro acelerar. Eles saem do PDS para acelerar a transição da maioria e colocar Tancredo no Colégio Eleitoral. Foram momentos muito difíceis, porque eles tinham muito o que perder, porque a derrota do Tancredo Neves seria o extermínio desse grupo. Se essas forças políticas que têm essa memória, lançaram esse processo, elas tem toda a experiência política acumulada para abrirem um novo ciclo. Têm autoridade. Tenho defendido há uns 30 dias isso no PFL, defendi junto ao senador Jorge Bornhausen, conversei em São Paulo com a direção do PFL. Só não estava o senador Antonio Carlos Magalhães, mas estavam o senador César Borges, José Agripino, Romeu Tuma e Cláudio Lembo e coloquei essa questão. Expliquei porque e houve um consenso. O PFL e o PMDB deveriam estar juntos e entender o jogo do presidente em não querer ficar cobrando do senador José Sarney, principalmente, porque ele fez parte desse grupo de origem do PFL. Esses dois partidos deveriam se juntar e começar a discutir a conjuntura e as propostas para essa transição. Dariam uma grande contribuição. Estamos falando de todos os governadores do Sul, de Brasília, de Pernambuco, Bahia. Valor: Eleitoralmente essa aliança desaguaria em que? Maia: Não se pode antecipar porque não se sabe que tipo de proposta virá. Vamos admitir uma proposta como essa de um regime mais flexível. Eu li um artigo afirmando para que não mexam no sistema eleitoral, que se mantenha como está hoje, porque 5% de cláusula de barreira sozinhos produzem um resultado muito maior do que se mexer na legislação. Se mexer vai se mexer para pior, cada um vai defender o seu mandato. Deixa como está e vamos em frente. Se pensar em presidencialismo parlamentar, tem que pensar em um nome como Marco Maciel. O que o PFL oferece através do meu nome à sociedade é um presidencialismo gerência, um governo bem administrado, bem gerenciado, bem controlado.